Este é o Relatório Final da Comissão Nacional, instituída pelo Presidente José Sarney para oferecer subsídios à formulação de uma nova política para a educação superior. Uma política que atenda ás exigências do desenvolvimento do País e aos anseios democráticos de seu povo.

Com a divulgação deste documento, inicia-se a segunda etapa, igualmente importante, de todo o trabalho - a da reflexão coletiva sobre as suas proposições.

Convido, pois, a toda a comunidade para uma ampla discussão sobre as análises e propostas contidas neste Relatório. Estou confiante de que, com determinação e discernimento, é possível operar promissoras mudanças no campo da educação superior.

Espero, agora, receber as contribuições de todos para que, desse trabalho participativo, possamos construir uma Nova Universidade.

Marco Maciel
Ministro da Educação


Carta de encaminhamento do Relatório ao Ministro da Educação

Exmo. Sr.

Senador Marco Antônio Maciel
Ministro da Educação.

Senhor Ministro,

Temos a honra de passar às mãos de Vossa Excelência o relatório final dos trabalhos da Comissão Nacional incumbida de oferecer subsídios à formulação de uma nova política para a Educação superior brasileira.

Composta, em sua maior parte, de professores universitários, a Comissão valorizou-se com a presença de educadores do 19 e 29 graus, bem como de personalidades do setor produtivo, do meio sindical e do corpo estudantil. O ensino público - tanto federal como estadual - conviveu com o ensino particular no seio da Comissão e diversas correntes de pensamento nela estiveram representadas. A multiplicidade de origem, inclusive quanto às regiões de procedência, imprimiu-lhe um sentido ecumênico como síntese de múltiplas visões da Educação brasileira que se encontraram na síntese das conclusões.

Durante os seis meses que lhe foram assinados a Comissão realizou dez reuniões plenárias e numerosas outras de subcomissões e de grupos de trabalho, tanto formal como informalmente. Foram ouvidas instituições e pessoas vinculadas ao problema educacional e recebidas várias contribuições individuais e de associações, que mereceram a devida consideração.

O documento ora encaminhado ao Governo traduz o consenso alcançado, exprimindo, a par de um juízo crítico, a formulação objetiva de propostas e recomendações conducentes ao aperfeiçoamento do sistema de ensino superior.

A primeira parte sumariza os fundamentos e diretrizes básicas da política que, a juízo da Comissão, deverá prevalecer na Educação superior nacional.

A seguir, cada tema específico mereceu tratamento destacado, com o oferecimento de recomendações concretas visando à obtenção dos resultados preconizados.

Entende a Comissão que as sugestões de uma nova política educacional devem ser levadas ao conhecimento da comunidade acadêmica e dos setores interessados da sociedade para uma ampla consulta que imprima o aval de autenticidade às medidas que venham a ser adotadas em benefício da Educação em todos os seus níveis.

Esperam os membros da Comissão haver correspondido, com o fruto de seus trabalhos, à altitude do desafio que lhes foi proposto e ao qual, tanto coletiva como individualmente, cuidaram de dedicar o máximo de sua capacidade, experiência e criatividade.

Na oportunidade, cabe acentuar a relevância do apoio recebido pela Comissão tanto de Vossa Excelência quanto dos vários órgãos do ministério, notadamente da Secretaria da Educação Superior. Para a eficiência dos trabalhos contribuiu, expressivamente, a cooperação de Geraldo Martins, incumbido de atender aos serviços de secretaria da Comissão.

Agradecendo a Vossa Excelência e ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República a distinção da escolha, cumpre-nos exprimir, a título próprio e em nome de todos os membros da Comissão, os protestos de elevado apreço e distinta consideração.

CAIO TÁCITO

Presidente da Comissão


COMPOSIÇÃO DA COMISSÃO NACIONAL DE REFORMULAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR (Decreto número 91.177, de 29 de março de 1985)    

CAIO TÁCITO - Presidente

SIMON SCHWARTZMAN - Relator

AMÍLCAR TUPIASSU

BOLÍVAR LAMOUNIER

CARLOS NELSON COUTINHO

CLEMENTINO FRAGA FILHO

DOM LOURENÇO DE ALMEIDA PRADO

EDMAR LISBOA BACHA

EDUARDO DE LAMÔNICA FREIRE

FERNANDO JORGE LESSA SARMENTO

FRANCISCO JAVIER ALFAYA

GUIOMAR NAMO DE MELLO

HAROLDO TAVARES

JAIR PEREIRA DOS SANTOS

JORGE GERDAU JOHANPETER

JOSÉ LEITE LOPES

JOSÉ ARTHUR GIANNOTTI

LUIZ EDUARDO WANDERLEY

MARLY MOYSÉS SILVA ARAÚJO

PAULO DA SILVEIRA ROSAS

ROBERTO CARDOSO DE OLIVEIRA

ROMEU RITTER DOS REIS

UBIRATAN BORGES DE MACEDO

JOSÉ EDUARDO FARIA - Secretário Executivo


POR UMA NOVA POLÍTICA PARA A EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA

Relatório da Comissão

I. A Crise do ensino superior

A crise do ensino superior é um dos grandes problemas enfrentados pela Nova República. Tancredo Neves, no discurso de posse lido pelo então Vice-Presidente José Sarney, já anuncia a intenção de criar uma comissão de alto nível, "Incumbida de estudar a situação e formular propostas que possam ser imediatamente consideradas". A Comissão foi instalada pelo Presidente da República no dia 2 de maio de 1985, com um prazo de seis meses para a apresentação de suas conclusões.

Na Exposição de Motivos com que encaminha a proposta de criação da Comissão, o Ministro Marco Maciel apresenta um panorama do quadro crítico do ensino superior brasileiro, que, como assinala, experimenta problemas "cuja magnitude e gravidade estão a exigir soluções urgentes, construídas a partir de consultas à sociedade e, em especial, à comunidade universitária." A lista de problemas é imensa:

-professores mal remunerados;
-carência de equipamentos, laboratórios e bibliotecas;
-deficiências na formação profissional dos alunos;
-descontinuidade das pesquisas;
-discriminação social no acesso às universidades;
-sistemas antidemocráticos de administração e escolha de quadros dirigentes;
-crise financeira e pedagógica do ensino privado;
-excesso de controles burocráticos nas universidades públicas;
-pouca clareza na prevalência do sistema de mérito na seleção e promoção de professores.

Estas dificuldades se tornam ainda mais críticas - prossegue a Exposição de Motivos - quando se verifica que a Universidade não está se preparando apropriadamente para os desafios das próximas décadas: o fortalecimento da pesquisa científica; a formação polivalente e de alto nível; a superação do formalismo vazio dos currículos e diplomas; a adoção de novos conceitos e concepções de ensino; o estabelecimento do pluralismo de estruturas organizacionais, conteúdos curriculares e requisitos de cursos. Sem perder sua função democratizadora, a Universidade não deve descurar da formação das elites intelectuais do País; sem perder sua especificidade e autonomia, não pode isolar-se como corporação fechada e alheia às solicitações sociais. "Precisamos" - conclui a Exposição de Motivos, citando o Presidente Tancredo Neves - "de uma Universidade que atue junto com as forças vivas da Nação e que seja reconhecida como pólo de elaboração crítica e difusão do saber".

A Comissão constituída pelo Presidente da República contou, entre seus 24 membros, com pessoas oriundas das mais variadas áreas do ensino e da pesquisa, professores, estudantes, industriais e sindicalistas. Em seis meses de trabalho, seus membros mantiveram contatos formais e informais com numerosos setores interessados nas questões do ensino superior, recebendo grande volume de subsídios, todos levados na devida consideração. As conclusões aqui apresentadas não pretendem ser, no entanto, uma média dos subsídios recolhidos, nem representar a grande variedade de opinião das pessoas, grupos e associações que hoje se preocupam com os destinos do ensino superior no Brasil. Elas são apenas as conclusões a que a Comissão chega, após estes meses de trabalho, conclusões que são agora apresentadas ao Governo, à comunidade universitária e à sociedade brasileira com propostas visando a uma nova política para a Educação superior. é este o mandato que a Comissão entende ter recebido, e que ora dá por cumprido.

O presente relatório final sintetiza, nesta primeira parte, os princípios e propostas centrais que resultaram do trabalho da Comissão, e que estão detalhados nos textos subseqüentes. Ficou claro, desde o início, que não existem fórmulas salvadoras; por isto, não faria sentido propor uma nova lei da reforma, que simplesmente substituísse a de 1968. O importante é que se desencadeie um processo de ampla discussão e mobilização em torno dos grandes problemas do ensino superior, do qual resulte uma nova política que possa ser conduzida com amplo apoio da comunidade universitária e do resto do País. é necessário explicitar os grandes temas da discussão, avaliar seus pressupostos e mostrar que existem alternativas viáveis ao atual quadro crítico do ensino superior. Este documento procura ser, antes de tudo, um catalisador desse processo.

II. Os princípios da nova política

Uma nova política para o ensino superior brasileiro requer o empenho das autoridades, com recursos e apoio, assim como o envolvimento ativo da sociedade, a começar pelos diversos setores que formam a comunidade acadêmica do País - professores, alunos, ex-alunos, funcionários, administradores da Educação, mantenedoras. Tudo isto não basta, no entanto, se não houver princípios norteadores e um diagnóstico adequado dos problemas a serem resolvidos, e da melhor forma de encaminhá-los. No entender da Comissão, uma nova política para a Educação superior deve partir dos seguintes princípios:

1) Responsabilidade do poder público

Cabe ao governo assegurar a manutenção e a expansão do ensino público em todos os níveis, inclusive o superior. A formação profissional, a pesquisa científica e tecnológica, a Educação geral, a formação de professores para o primeiro e segundo graus, os trabalhos de extensão, são atividades essenciais em qualquer sociedade moderna, e o poder público tem a responsabilidade de zelar e prover para que elas sejam desempenhadas a contento.

No Brasil, hoje, a maior parte dos estudantes de nível superior está matriculada em estabelecimentos privados, que constituem a maioria das instituições deste nível existentes no país. Como se sabe, a qualidade do ensino privado é extremamente variável, assim como é muito variável a qualidade do ensino público, federal, estadual e municipal. A responsabilidade do poder público não significa que o setor privado deva ser estatizado, mas a) que o Estado não pode contar com a iniciativa privada para financiar os setores mais significativos da pesquisa universitária e do ensino superior, devendo ao contrário, aumentar progressivamente sua contribuição; b) que cabe ao Estado garantir a liberdade do ensino em todos seus aspectos, e apoiar financeiramente as iniciativas educacionais de origem privada ou comunitária de inegável interesse público e relevância social; c) que cabe ainda ao Estado contribuir para o aprimoramento da qualidade do ensino superior em todos os seus aspectos e modalidades institucionais.

2) Adequação à realidade do País

Existe uma convicção generalizada de que o ensino superior não está ajustado à realidade brasileira. O desajuste se manifestaria, primeiro, na formação de profissionais Inadequados, em quantidade e qualidade, às demandas do mercado de trabalho; segundo, em que a pesquisa acadêmica seria abstrata e desvinculada das necessidades das regiões em que as instituições de ensino estão localizadas; terceiro, na quase inexistência de trabalhos de extensão e outros serviços prestados às comunidades locais.

Esta convicção corresponde a problemas bastante reais, mas cuja complexidade nem sempre é vista com clareza. Existe um evidente desajuste entre vagas oferecidas, pessoas formadas e com possibilidades de emprego em determinadas profissões. A solução deste problema não está, no entanto, em adequar o ensino superior a um mercado de trabalho em constante mutação, mas em formar pessoas com capacitação básica nas grandes áreas de conhecimento e capazes de se adaptar às solicitações do mercado de trabalho. A pesquisa universitária dificilmente tem efeitos diretos sobre a economia e a população das regiões em que as universidades estão localizadas. Contudo, a exigência exclusiva de "relevância" pode redundar em limitações inaceitáveis ao trabalho de pesquisa de longo prazo ou de cunho teórico, especulativo, intelectual e crítico. De fato, a maior parte da pesquisa universitária já se guia por preocupações de relevância econômica e social; o que inexiste são, principalmente, mecanismos efetivos de transferência de conhecimentos para fora da universidade. Similarmente, a concentração exclusiva em temas de "interesse local" pode levar a uma divisão desnecessária entre universidades "nacionais" e "regionais", condenando estas últimas a uma posição de inferioridade. A experiência mostra que, quanto mais universais são as instituições de ensino e pesquisa, tanto mais elas se revelam capazes de atender às demandas mais imediatas de seu meio.

3) Diversidade e Pluralidade

A lei da Reforma Universitária de 1968 supunha que todo o ensino do País deveria se organizar na forma de universidades que teriam, todas, estruturas semelhantes, com seus departamentos, sistemas de crédito e colegiados de curso, e combinariam de forma indissolúvel o ensino, a pesquisa e a extensão. Quase vinte anos depois, constata-se que a maior parte dos estudantes se encontra em instituições isoladas e privadas; que as antigas faculdades ainda subsistem; que os novos formatos organizacionais nem sempre funcionam como esperado; que a pesquisa se distribui de maneira extremamente desigual pelo País; e que a extensão é muitas vezes inexistente.

Reconhecer a diversidade e pluralidade do ensino superior não significa aceitar o ensino de má qualidade, a pesquisa inidônea e a desorganização institucional. Significa, ao contrário, aceitar e entender que as instituições de ensino superior podem ter objetivos, vocações e especializações distintas, e cada qual primar naquilo que faz; afirmar que os mesmos objetivos maiores - a formação acadêmica, a capacitação para o trabalho, o desenvolvimento da pesquisa, o trabalho de extensão - podem ser realizados em muitas formas distintas; e assegurar a cada instituição de ensino a plena liberdade para adotar os formatos organizacionais e institucionais que lhe pareçam mais adequados.

4) Autonomia e democracia interna

As atividades científicas, culturais e educacionais são, em grande medida, auto-reguláveis, pois dependem essencialmente do trabalho especializado, inovador e criativo dos que as desempenham. Autonomia universitária significa liberdade para que as universidades decidam internamente sobre as pesquisas que realizam, os currículos de seus cursos, seus sistemas administrativos e organizacionais e à gestão de seus recursos. é uma autonomia que não se detêm no cume das universidades, em suas reitorias, mas deve alcançar os departamentos, institutos, faculdades, e envolver a participação ativa de todos os segmentos que compõem a comunidade universitária na indicação de seus dirigentes e nos órgãos colegiados.

A autonomia não pode ser entendida, naturalmente, como um cheque em branco que a sociedade passa a seu sistema universitário e a seus diversos segmentos; ao contrário, ela supõe uma contrapartida bem definida em termos de desempenho. Não pode haver autonomia sem essa contrapartida de responsabilidade.

5) Democratização do acesso

No Brasil de hoje, o ensino superior só é acessível a estudantes que superam os filtros extremamente seletivos do primeiro e segundo graus. Os exames vestibulares para as universidades públicas e gratuitas aprovam preferencialmente estudantes oriundos de escolas de segundo grau privadas e caras; aos demais, restam os estabelecimentos privados, pagos e freqüentemente de menor qualidade. Como é o setor privado que forma grande parte dos professores das escolas públicas de primeiro e segundo graus, isto resulta em problemas de qualidade para o ensino público nestes níveis, o que reforça a discriminação no acesso às universidades.

O público que busca o ensino superior é também muito variado. Há evidências de que os que terminam o segundo grau e se dirigem imediatamente às universidades e escolas superiores já são hoje minoria. Grande parte dos atuais estudantes de nível superior são pessoas de mais de 25 anos de idade, já empregadas, e que buscam nos estudos uma possibilidade de aprimoramento e melhoria profissional. No entanto, o ensino superior público está organizado somente em função da primeira clientela, deixando a maioria entregue às vicissitudes do ensino privado.

A democratização do acesso ao ensino superior depende, basicamente, da melhoria e do estabelecimento de condições mais eqüitativas de acesso ao ensino de primeiro e segundo graus. Seria um grave equívoco buscar a democratização do ensino superior pela via do aumento indiscriminado de vagas, da redução ainda maior dos requisitos acadêmicos e da criação de sucedâneos de pior qualidade aos currículos mais exigentes. Medidas adequadas incluem, basicamente, a criação de modalidades alternativas de estudo para diferentes públicos, o amparo efetivo ao estudante carente e o investimento sistemático na melhor qualificação dos professores de primeiro e segundo graus.

6. Valorização do desempenho

As instituições de ensino superior reclamam do poder público vantagens e recursos específicos: salários, equipamentos, liberdade, autonomia. O que recebem ainda é pouco, diante do que seria necessário. Este apoio - o que hoje existe e o que se pleiteia para o futuro - só pode se justificar se a ele corresponderem altos padrões de desempenho. O ensino deve ser de qualidade; os profissionais que forma, competentes; a pesquisa, social e intelectualmente relevante. Os professores, estudantes e funcionários devem se dedicar plenamente às suas tarefas e os custos financeiros devem ser compatíveis com os resultados obtidos. Pelos privilégios que reclama e a que tem direito, a universidade deve ter desempenho excelente, não podendo se contentar com o medíocre ou mesmo com o razoável. A valorização do desempenho requer que os controles formais que hoje se exercem sobre as instituições de ensino superior sejam substituídos por mecanismos alternativos, que possam, efetivamente incidir sobre o conteúdo e o mérito do trabalho realizado.

7. Eliminação dos aspectos corporativos e cartoriais

O corporativisimo consiste na idéia, que se procurou implantar no Brasil desde o Estado Novo, de que a sociedade deve estar organizada em corporações profissionais fechadas, todas sob a tutela do Estado, com regras estritas de acesso e controladas por órgãos normativos superiores. Embora não tenha sido plenamente implantado, o sistema corporativo resultou, para a Educação superior, na expansão aparentemente infinita de profissões regulamentadas e respectivos conselhos profissionais, cujos membros. se originariam de faculdades idênticas, moldadas segundo currículos mínimos legalmente estabelecidos.

Este sistema, cuja intenção é garantir os direitos dos profissionais formados e zelar pelo seu bom desempenho, mostra-se hoje extremamente problemático. Primeiro: ele resulta na valorização excessiva dos aspectos formais da Educação - o cumprimento dos currículos mínimos, a outorga do diploma - , em detrimento de seus aspectos substantivos. A atividade educacional, por isto, reduz-se freqüentemente ao cumprimento de uma série de rituais e formalidades de conteúdo esvaziado - daí seu lado "cartorial" e burocrático na má acepção do termo. Segundo: ele impõe restrições à liberdade de trabalho, que podem atender a interesses de determinados grupos profissionais, mas são injustas e prejudiciais em uma perspectiva social mais ampla. Terceiro: ele limita severamente a liberdade de os estabelecimentos de ensino superior experimentarem novos currículos e formatos educacionais, na medida em que tais estabelecimentos estão obrigados a currículos legalmente fixados que, muitas vezes, de mínimos passam a plenos, pelas pressões das corporações profissionais; e também na medida em que os alunos tendem a desvalorizar os cursos que não conduzam a profissões reconhecidas. Quarto: ele não garante a qualidade técnica e cientifica daquelas poucas profissões em que a regulamentação legal possa ser de fato necessária. Quinto: ele cria uma aspiração crescentemente irrealista aos privilégios que seriam proporcionados pela posse de diplomas universitários, o que resulta em forte pressão por lugares no ensino superior e se traduz, finalmente, em índices alarmantes de desistências, mudanças de carreira e abandono de títulos profissionais adquiridos.

III. Propostas para a nova universidade

1. Reformular o Conselho Federal de Educação

O exercício pleno da responsabilidade pública pelo ensino começa por instituições política e administrativamente ajustadas a esse fim. O Conselho Federal de Educação, órgão máximo de assessoramento do governo em questões educacionais - e que seria o responsável maior pela qualidade e direção do ensino superior -, não vem cumprindo estas funções da forma desejável, por duas razões principais. Suas atuais atribuições, exercidas mediante pareceres geralmente casuísticos sobre ampla gama de aspectos do ensino superior, fazem dele uma instituição sobrecarregada, com poderes limitados de fiscalização e nenhum de acompanhamento do real desempenho das instituições de ensino do País. Sua composição, de livre nomeação do Presidente da República entre pessoas de notório saber e competência, não tem sido suficientemente representativa do ensino superior brasileiro, particularmente das universidades públicas.

A reformulação do Conselho Federal de Educação requer, conseqüentemente, que sejam alteradas tanto suas atribuições quanto sua composição. No que se refere à competência, é necessário que o Conselho elimine, ou transfira ao Ministério, por um lado, e às Universidades, por outro, a maior parte das atribuições casuísticas que hoje exerce. O Conselho deve se transformar na instituição responsável pelo acompanhamento contínuo do desempenho do ensino superior, pela criação de mecanismos efetivos e permanentes de avaliação inter-pares. Não é um trabalho que deva ser feito somente por seus membros. Dotado de legitimidade, o Conselho deve convocar para esta tarefa a própria comunidade científica, acadêmica e profissional, e estimular o Ministério da Educação, as Secretarias Estaduais e as administrações universitárias a instaurarem seus próprios mecanismos de acompanhamento e avaliação. A partir desta atividade, o Conselho deve ter voz ativa na política de financiamento público ao ensino superior, e funcionar como principal fórum para o debate das grandes questões da política educacional do País. Para realizar estas tarefas, a Comissão sugere que o Conselho, ampliado para 30 membros, passe a ser nomeado pelo Presidente da República a partir de listas tríplices indicadas pelas universidades, associações científicas de âmbito nacional e estabelecimentos isolados, e com a participação de pessoas representativas do ensino de primeiro e segundo graus. Além disso, deverão ter assento no Conselho representantes de instituições nacionais de docentes do ensino superior, de professores do primeiro e segundo graus, de estudantes de nível superior e de servidores técnico-administrativos.

2. Consolidar a autonomia e a democracia interna das universidades

Uma vez estabelecidos mecanismos legítimos e adequados de acompanhamento do desempenho acadêmico e financeiro, a autonomia e a democracia interna das universidade devem ser progressivamente ampliadas nos planos acadêmico, administrativo e financeiro.

O próprio conceito de "universidade" necessita ser alterado. A concessão de status universitário a instituições de ensino superior, hoje condicionada a um conceito tradicional de "universalidade" das áreas que cobre, deve ser substituído por uma avaliação aprofundada, a ser feita pelo Conselho Federal de Educação, de sua capacidade de autogestão acadêmica e administrativa, da existência de pesquisa e ensino de alto nível e de cursos técnicos, humanos e administrativos correspondentes. Isto permitirá a concessão de autonomia a instituições de alto nível e complexidade - como, por exemplo, na área tecnológica e médica -, sem que elas sejam forçadas à criação artificial de cursos em outras áreas do conhecimento.

O princípio da autonomia universitária deve ser compatibilizado com o fato de que, no Brasil de hoje, a maioria dos estudantes está em estabelecimentos de ensino isolados, públicos ou privados. Aos estabelecimentos isolados de menor porte e tradição não pode ser estendida a mesma autonomia atribuída às universidades. Por outro lado, o controle que o Conselho Federal de Educação e o próprio Ministério vêm exercendo sobre os cursos isolados tem se limitado a autorizações, reconhecimentos e intervenção em situações de extrema gravidade. Com a reformulação do Conselho Federal de Educação, recomenda-se que a supervisão acadêmica dos estabelecimentos isolados seja transferida para universidades próximas, que possam de fato acompanhar o desempenho daqueles estabelecimentos e outorgar validade real (e não meramente formal) aos diplomas que expedem. Recomenda-se também que se estude a possibilidade de criação de redes nacionais ou regionais de instituições isoladas da mesma área de conhecimento, que se submetam a regimes comuns de avaliação e acompanhamento acadêmico, com a participação da comunidade e de associações profissionais.

No plano acadêmico, a autonomia universitária deve ser reforçada pela liberdade efetiva de as universidades decidirem o conteúdo de seus cursos, pesquisas e atividades de extensão, com o mínimo de constrangimentos externos. Os currículos mínimos, nas carreiras em que sejam indispensáveis, devem ser realmente mínimos, deixando-se às universidades ampla margem de criação e inovação. Eventuais problemas de transferência de alunos devem ser resolvidos pela avaliação substantiva de conhecimentos, que eventualmente incluam exames, e não por supostas equivalências formais de currículos. A pesquisa deve ser decidida com liberdade, tomando em consideração necessidades nacionais e regionais percebidas pelos pesquisadores e o interesse científico e acadêmico dos temas. Os colegiados departamentais e de curso devem ter participação ativa no estabelecimento das linhas de trabalho de suas instituições, sem restringir a liberdade individual de pesquisa e de expressão do pensamento.

As universidades devem ter ainda liberdade para adotar ou não a estrutura departamental, o sistema de créditos e o ciclo básico, conforme as experiências de cada uma. A autonomia didática e pedagógica inclui também, para as universidades, a liberdade de alterar o número de vagas disponíveis nos diversos cursos, em função das demandas e prioridades existentes, e de estabelecer seus próprios mecanismos de seleção de alunos.

No plano administrativo, a eleição das autoridades máximas - reitor e vice-reitor nas universidades, e diretores nos estabelecimentos isolados - deve ser feita com a participação ativa e apropriada dos diversos setores da comunidade acadêmica, como estabelecido autonomamente nos estatutos de cada instituição. Não houve consenso na Comissão quanto aos limites da autonomia que as instituições superiores públicas devem ter na escolha de seus dirigentes máximos. Na opinião da maioria, cabe ao governo participar desse processo, pela escolha dos dirigentes a partir de listas tríplices encaminhadas pelas instituições. Segundo esse ponto de vista, o poder público legitimamente constituído deve ter um papel ativo na condução de universidades financiadas com recursos públicos, cuja autonomia não pode ser entendida como soberania. As listas tríplices surgem, assim, como uma forma adequada de combinar o exercício da autoridade pública com a autonomia que a universidade requer. Segundo os demais, no entanto, a autonomia universitária não deve sofrer, nesse particular, restrições de nenhuma espécie, cabendo ao governo tão somente ratificar as indicações feitas internamente pelas universidades. Houve consenso, no entanto, quanto à proposta de que os demais cargos acadêmicos, Incluindo os de diretores de faculdades e departamentos, devem ser preenchidos por designação interna, de acordo com os respectivos regimentos.

No plano financeiro, as dotações orçamentarias devem ser globais, sendo os valores atribuídos à cada universidade fixados em função de avaliações promovidas pelo Conselho Federal de Educação. Cabe a cada universidade decidir internamente sobre a utilização de seus recursos, segundo seus próprios planos e prioridades. A autonomia financeira não deve significar, no entanto, poder absoluto às reitorias, eliminando a capacidade decisória de departamentos, institutos, faculdades e- demais órgãos universitários capazes de obter recursos próprios, particularmente junto a agencias de fomento à pesquisa cientifica e tecnológica, inclusive as do próprio Ministério da Educação.

Um dos aspectos mais importantes da autonomia universitária é a possibilidade de criar instituições efetivamente inovadoras e revolucionarias do ponto de vista acadêmico, científico e administrativo. Grandes inovações requerem espaço para a criatividade, liderança e imaginação, que só podem frutificar quando livres de controles burocráticos e rotineiros. A experiência brasileira mostra o papel importante e pioneiro que sempre coube a algumas instituições dotadas de condições especiais de autonomia e liderança. é necessário zelar para que inovações deste tipo possam se multiplicar.

A autonomia universitária deve incluir a liberdade de cada universidade estabelecer sua própria política de pessoal, dentro dos princípios de valorização do mérito, da dedicação e da remuneração adequada. é necessário que as instituições de ensino abram espaço tanto para os professores e pesquisadores que a elas se dediquem em tempo integral, quanto para profissionais envolvidos com a atividade prática na indústria, no comércio e nas profissões liberais, e que possam trazer para o ambiente universitário sua experiência de trabalho. é também necessário que as instituições de ensino disponham de flexibilidade para a contratação de professores visitantes e extra-carreira.

A questão do estabelecimento de uma carreira única para o magistério superior foi objeto de controvérsia inclusive no interior da Comissão. A pluralidade de padrões de remuneração, implantada com a criação das fundações universitárias, permitiu que fossem instituídas diferenças de salário injustificáveis, e dependentes, principalmente, das influências políticas que cada universidade pudesse mobilizar junto ao Ministério da Educação. A introdução da isonomia salarial e da carreira única aparece, assim, como um princípio elementar de justiça e correção de distorções. No entanto, prevaleceu na Comissão a opinião dos que consideram a carreira única uma limitação ao princípio da autonomia universitária. Segundo este ponto de vista, a Universidade deve ter preservado o direito de, por exemplo, desenvolver uma política mais agressiva para competir no mercado de trabalho por certo tipo de profissionais, ou compensar suas vantagens - ou desvantagens - locacionais com salários diferenciados. Cabe ao governo, tão-somente, estabelecer os valores mínimos de remuneração dos professores, e se reservas o direito de limitar os recursos das Instituições que utilizem de maneira inadequada as verbas que recebem.

Uma política de carreiras como a aqui sugerida requer que os professores universitários dos estabelecimentos federais não sejam considerados como funcionários públicos, mas recebam um tratamento diferenciado e próprio.

Finalmente, a autonomia deve ser atributo tanto de universidades públicas quanto privadas, e exercida através de mecanismos próprios de autogestão acadêmica, administrativa e financeira, estabelecidos em consonância com as respectivas instituições mantenedoras. A existência destes mecanismos de autogestão deve ser condição indispensável para o reconhecimento de status universitário a qualquer instituição de ensino e pesquisa do país.

3 Alterar os mecanismos de financiamento

Na ausência de sistemas efetivos de avaliação, o financiamento do ensino superior tem sido feito por critérios históricos ou políticos, sem adequada consideração de prioridades e eventual má utilização dos recursos públicos. A ampliação de verbas para o ensino proporcionada pela Emenda Calmon requer que o financiamento passe a ser feito de maneira mais eficiente, sem perder de vista a manutenção da autonomia universitária, mas também sem contemporizar com a baixa eficiência no uso de recursos públicos.

Ao examinar os problemas de financiamento, observa-se que não existem hoje mecanismos que incentivem a criatividade , a ação inovadora e o bom desempenho operacional. Os custos por aluno e a relação professor/aluno variam extraordinariamente entre instituições de ensino público e entre estas e as instituições privadas, sem que estas diferenças possam ser sempre- imputadas a melhores padrões educacionais ou à existência de pesquisa de qualidade. Não existem, nos atuais procedimentos orçamentários das instituições federais, mecanismos adequados para o planejamento e analises de custo-benefício.

Recomenda-se, por isto, a ativação de uma sistemática de orçamento por centros de custo, com a identificação de funções e programas, para que todos possam visualizar as ações desenvolvidas pelas universidades e suas sub-unidades. A ampliação da autonomia na gestão financeira das Instituições de Ensino Superior deve ser condicionada a um maior comprometimento com padrões de qualidade e produtividade; e padrões de custo modulares poderiam ser estabelecidos a partir da avaliação do desempenho das instituições de melhor qualidade. O atual sistema de suplementações deve ser eliminado, com os duodécimos reajustados periodicamente em função da inflação e de excessos de arrecadação. Os hospitais de ensino, por sua importância e peso relativo nos orçamentos universitários, devem ser orçados separadamente, com participação do INAMPS.

O uso eficiente de recursos públicos supõe a utilização apropriada de equipamentos e- instalações, redução das exageradas relações professor-aluno e remanejamento das vagas, o que poderia resultar em razoável expansão do sistema público, desde que aportes adicionais de recursos de custeio e ítens específicos de capital possam também existir.

Inovações devem ser introduzidas na legislação, condicionando os benefícios fiscais hoje atribuídos às empresas privadas para gastos em Educação à participação efetiva em sua utilização de universidades credenciadas, bem como permitindo doações dedutíveis de impostos a instituições selecionadas. O patrimônio das universidades públicas pode ser reforçado com a transferência de ações de empresas estatais, com clausulas estritas de inalienabilidade, e à livre utilização de seus dividendos. Uma alíquota de 5% no pagamento de royalties e assistência técnica ao exterior deve ser estabelecida para o financiamento da pesquisa cientifica e tecnológica em instituições de excelência. O crédito educativo deve ser expandido deforma a ampliar efetivamente as possibilidades de acesso às instituições que formam as elites dirigentes do país.

Os professores de nível superior necessitam ser adequadamente remunerados pelos trabalhos que efetivamente exercem. Um piso comum deve ser estabelecido e o regime de hora-aula extinto, tanto no ensino público quanto no privado. Professores que se dediquem de fato à pesquisa ou a atividades administrativas ou de prestação de serviços que requeiram dedicação exclusiva devem ser remunerados de acordo com isto; aos demais, deve caber somente uma remuneração básica, que supõe o envolvimento dos professores com outras atividades extra-universitárias. O atual regime de 40 horas sem dedicação exclusiva deve ser revisto.

A utilização de recursos públicos para o financiamento de estabelecimentos particulares deve privilegiar somente instituições de reconhecida qualidade, e desde que suas atividades tenham indiscutível interesse social. O controle de preços do sistema privado deve se basear em cálculos realistas dos custos do ensino feitos pelo CIP e aprovados pelo novo C.F.E., com a participação de um conselho consultivo formado por representantes das partes interessadas. O sistema de bolsas de estudo para o ensino privado deve ser expandido, destinando-se as bolsas a estudantes de instituições de reconhecida qualidade.

4. Democratizar o acesso ao ensino superior

A democratização do acesso ao ensino superior depende da efetiva universalização do ensino de primeiro grau, com recursos específicos a ele vinculados, bem como da eliminação dos obstáculos existentes para o acesso ao ensino de segundo grau de qualidade. Neste sentido, é um problema que transcende em muito os limites do sistema de ensino superior. No entanto, existem medidas bastante efetivas que podem ser tomadas neste nível para que a democratização da universidade se amplie.

A primeira medida consiste em melhorar de forma substancial a formação do professor. As licenciaturas plenas devem prevalecer, na transmissão de conteúdos mais extensos e rigorosos; a formação pedagógica deve corresponder às características gerais das clientelas e à compreensão do papel da Educação de primeiro e segundo graus; os programas devem ser adaptados às necessidades e carências regionais, e cursos de capacitação e aperfeiçoamento devem ser oferecidos pelas universidades aos professores de primeiro grau formados ou leigos. A atual estrutura dos cursos de pedagogia deve ser revista, no sentido de melhor adequa-la à organização do trabalho pedagógico no primeiro e segundo graus, e dando atenção apropriada à formação de docentes para a "habilitação magistério" proporcionada em nível de segundo grau (antigo curso normal).

O problema da formação do professor de primeiro e segundo graus é da maior seriedade, particularmente em conseqüência da crise que hoje afeta o antigo ensino normal. A formação de professores para o primeiro segmento do primeiro grau (antigo primário) nos cursos de pedagogia tem sido tratada como mero subproduto das habilitações específicas de orientadores educacionais e de outros especialistas. Com isto, o aspecto mais nobre da Educação básica, que é o contato direto com a criança, passou a ser o mais desvalorizado. Por outro lado, sabe-se hoje que um grande número de professores do antigo curso primário nos grandes centros urbanos do Brasil possui cursos superiores, ainda que freqüentemente inadequados ao trabalho que desempenham. Seria descabido requerer, no quadro brasileiro atual, nível universitário para todos os professores do pré-escolar e do antigo primário; não há dúvida, no entanto, de que o envolvimento da universidade com o ensino básico deve ser profundamente repensado.

Em segundo lugar, universidades e centros de pesquisa devem expandir seus trabalhos de pesquisa educacional, assegurando a relevância dos temas e a aplicabilidade dos resultados. Experiências pedagógicas bem sucedidas devem ser avaliadas e divulgadas, e mecanismos ágeis de avaliação e correção de desvios devem ser estabelecidos, em articulação com os governos estaduais, municipais e as universidades.

Uma terceira medida consiste na expansão dos canais de acesso ao ensino superior. Deve-se- ampliar progressivamente o número de bolsas integrais para estudos em instituições públicas e privadas, obedecendo-se- ao duplo critério da competência (do aluno e da instituição) e da carência de recursos. A oferta de vagas nas instituições públicas deve ser expandida na medida das possibilidades e nas áreas de maior demanda; e cursos noturnos devem ser introduzidos onde couber, para atender estudantes que têm de trabalhar durante o dia, mas cuidando para que se preservem padrões de qualidade e competência. Diversas formas de assistência ao estudante - médica, dentária, alimentar, habitacional - devem ser também criadas e ampliadas, na medida das necessidades. Deve haver lugar, igualmente, para o apoio a atividades culturais, esportivas e artísticas de cunho extracurricular.

Finalmente, formas não-convencionais de ensino de nível superior devem ser adotadas, pela utilização de meios eletrônicos, ensino a distancia, intensivo, tutorial, etc., tanto em atividades de extensão e aperfeiçoamento quanto em cursos regulares, desde que assegurados os padrões de qualidade.

5. Fortalecer a pesquisa científica e a pós-graduação

É nas universidades brasileiras que está concentrado o maior e mais qualificado contingente de pesquisadores em ciência e tecnologia do País, e é delas que provém grande- parte da melhor pesquisa que o Brasil produz. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de- Nível Superior do Ministério da Educação (CAPES) desenvolveu e mantém um sistema permanente de avaliação dos programas de pesquisa e pós-graduação que goza de merecida reputação na comunidade acadêmica e cientifica do País, tendo demonstrado ser um instrumento de grande importância para seu contínuo aperfeiçoamento.

No entanto, a pesquisa universitária brasileira padece ainda de sérios problemas. Os núcleos de pesquisa e pós-graduação são freqüentemente financiados projeto a projeto, com recursos externos ao Ministério da Educação, e, por isto, são muito instáveis. Os professores pesquisadores não recebem estímulos financeiros e reconhecimento diferenciados e adequados a seu desempenho. A distribuição da pesquisa cientifica no país é altamente concentrada, tanto do ponto de vista da produção quanto dos recursos. Existem grandes dificuldades para a transmissão do conhecimento científico e tecnológico gerado nas universidades à sociedade e ao sistema produtivo. O relacionamento entre a pesquisa, a pós-graduação e os cursos de graduação é freqüentemente problemático.

A principal recomendação é o fortalecimento e a expansão da CAPES como instituição central do Ministério da Educação para a pesquisa e a pós-graduação. O atual sistema de avaliação por pares de programas e solicitações de apoio deve ser consolidado mediante- a constituição de um conselho de alto nível, formado por pesquisadores universitários que possam dar legitimidade e continuidade a essa experiência. A CAPES deve dispor de recursos mais amplos para proporcionar apoio institucional à pesquisa universitária, pelo exame de solicitações individualizadas e independentemente dos orçamentos de cada universidade e de eventuais subvenções a projetos, oriundas de fontes externas ao Ministério da Educação. Este apoio deve cobrir custos de laboratório, biblioteca, contratação de pessoal técnico-especializado etc.

Um sistema de bolsas de pesquisa semelhante ao hoje mantido pelo CNPq deve também ser instituído pela CAPES, com o objetivo de dar aos pesquisadores universitários incentivo diferencial. Este sistema deve obedecer a critérios estritos de qualidade e desempenho, e ser controlado pelos pesquisadores mais qualificados das universidades brasileiras. Um sistema de semestres sabáticos para pesquisadores deve também ser introduzido, visando à circulação de pesquisadores entre instituições e abrindo possibilidades de atualização e aperfeiçoamento no exterior. Os direitos de propriedade intelectual dos professores pesquisadores devem ser assegurados.

Os problemas de eqüidade, concentração e regionalização da pesquisa devem ser equacionados mediante atenção especial ao surgimento de grupos emergentes; identificação de vocações especializadas e regionais, e incentivo a programas de cooperação entre grupos de distinto nível de amadurecimento. A formação de comitês assessores de avaliação deve levar em conta, sempre que possível, aspectos regionais e de diferenças de orientação acadêmica. Nada disto deve significar, nó entanto, o abandono de padrões nacionais de excelência, bem como sua elevação progressiva a níveis internacionais.

A busca de pontes entre a pesquisa universitária e as necessidades econômicas e sociais do país não pode ser transformada em cerceamento à pesquisa básica que as universidades realizam, que requer apoio crescente do setor público. Isto posto, mecanismos jurídicos devem ser estabelecidos para permitir acordos de colaboração entre instituições universitárias e outros setores do Estado, da economia e da sociedade, e particularmente com os institutos do CNPq; e a flexibilidade administrativa e financeira dos institutos universitários de pesquisa deve ser mantida.

O envolvimento de professores pesquisadores com os cursos de graduação deve ser sempre estimulado. Além do ensino regular, os pesquisadores devem participar de programas especiais de aperfeiçoamento e reciclagem dos professores de graduação, e da introdução à pesquisa cientifica de alunos que se iniciam nas universidades. Além disto, cursos de pós-graduação voltados para a formação profissional e para o magistério devem ser criados, como alternativas de valor equivalente aos mestrados e doutorados de pesquisa hoje predominantes.

6. Ajustar o ensino de graduação às necessidades presentes e futuras do País

O crescimento da Educação superior tem respondido a uma demanda por Educação que, em princípio, cumpre à sociedade atender. No entanto, parte desta demanda se explica pela aspiração cada vez mais irrealista aos privilégios das profissões liberais; por outra parte, ela corresponde à busca genuína de maiores conhecimentos, competência e- oportunidades profissionais. Como o mercado de trabalho resulta de uma interação complexa entre grupos profissionais, empregadores e consumidores de seus serviços, não é possível planificar o crescimento do ensino superior em função de supostas "necessidades" do mercado de trabalho. No entanto, é possível acompanhar caso a caso a situação profissional das diversas carreiras de nível superior, buscando reorientar a disponibilidade de vagas em cada uma delas. Também é possível, com maiores informações à disposição do público e a redução dos aspectos corporativos da Educação superior, reduzir a demanda excessiva que hoje resulta em níveis inaceitáveis de desistências e reprovações.

Cabe às universidades buscar os conteúdos de disciplinas e a abertura de carreiras que sejam mais adequadas às necessidades do País, e que atendam aos interesses de seus alunos. Não parece haver dúvida de que os cursos que dão mais ênfase aos conteúdos de formação básica - nas ciências físicas, biológicas, sociais e nas humanidades - são os que resulta em pessoas mais bem formadas e polivalentes, e, por isto, mais capacitadas para se localizarem em um mercado de trabalho em constante transformação. Em contraste, devem ser evitados cursos demasiadamente vinculados a profissões muito particulares e de demanda ocasional. A formação básica pode ser proporcionada tanto em cursos que resulta em diplomas de profissões regulamentadas quanto em cursos genéricos ou de capacitação para a pós graduação. Seria importante que estes cursos genéricos se expandissem mais, e que uma parte significativa da capacitação profissional hoje dada no nível de graduação fosse proporcionada ao nível de pós-graduação.

Cabe também ao governo, independentemente das iniciativas das universidades, desenvolver aquelas áreas de formação que forem consideradas especialmente Importantes e necessárias para o País. é o caso da formação de técnicos de nível superior em Institutos Superiores de Tecnologia, cuja criação deveria ser estimulada pelo governo federal após consulta a especialistas dos diversos setores interessados. De nível pós-secundário, com duração típica de três anos, dispostos adequadamente ao longo do território nacional, estes institutos, se bem concebidos, poderiam suprir necessidades prementes da indústria e das instituições de pesquisa cientifica e tecnológica, bem como criar novas oportunidades de trabalho para importante contingente de formados pelas escolas do 2 grau, como alternativa preferida aos cursos universitários convencionais.

Como já foi visto, o sistema de ensino hoje dominante nas universidades públicas discrimina contra o estudante que trabalha. Atender ao público diferenciado que busca o ensino superior supõe desenvolver instituições especializadas e diversificadas. O ensino noturno, a universidade aberta, a utilização de tecnologias educacionais sofisticadas (como a televisão e os computadores), cursos de reciclagem e atualização profissional são modalidades que requerem grandes investimentos de tempo e competência na preparação e testagem de materiais pedagógicos e no acompanhamento individualizado de alunos, sob pena de se transformarem em álibis para o ensino de segunda classe. Instituições de ensino orientadas para este público investirão provavelmente muito mais em pesquisa pedagógica do que em outros tipos de pesquisa mais características de universidades tradicionais.

O treinamento profissional e a extensão universitária estão entre os aspectos mais negligenciados no ensino superior brasileiro. No entanto, eles podem se constituir em mecanismos de grande importância para o estabelecimento de vínculos efetivos entre o ensino superior e a sociedade. A atividade de extensão pode ser utilizada como instrumento para alimentar os cursos, currículos e programas com conhecimentos oriundos do dia-a-dia da população com a qual o estudante deverá trabalhar, tendo portanto grande valor pedagógico, além de proporcionar serviços efetivos. Os estágios curriculares, se devidamente supervisionados, são formas válidas de colocar os estudantes em contato com a realidade profissional e de relacionar a teoria com a prática.

Finalmente, os equipamentos universitários podem ser mais bem utilizados do que até agora, em benefício do melhor relacionamento das universidades com suas comunidades. Isto se aplica às bibliotecas e aos chamados "organismos complementares" das universidades - museus, editora, gráfica, teatro - que permitem programas de interesse comunitário; aos laboratórios e institutos de pesquisa, que podem estabelecer convênios de assistência e cooperação com empresas e indústrias privadas e estatais, no desenvolvimento de pesquisas e no treinamento formal e informal de pessoal especializado, e no próprio campus universitário, que deve deixar de ser um ente fechado em si mesmo, mediante canais que estimulem sua intercomunicação constante com a sociedade que o circunda.

Brasília, 21 de novembro de 1985


RECOMENDAÇÕES  

1. AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA

A autonomia universitária foi proclamada na lei do ensino superior de 1931 e reafirmada nas reformas empreendidas em 1961 e 1968. O principio ascendeu mesmo, em alguns Estados, ao  plano constitucional, como é exemplo a Constituição do Estado do Rio de Janeiro e a do Estado de São Paulo.

Todavia, a competência legalmente atribuída a órgãos da Administração Federal em matéria de educação e, mais ainda, a prática regulamentar, contribuíram para uma disciplina excessiva e uma indevida padronização dos serviços acadêmicos e administrativos das universidades, privando-as da liberdade decisória em matéria didático-pedagógica, financeira, disciplinar e operacional.

A reconquista da autonomia universitária em termos reais - e não meramente nominais - é um desejo generalizado da comunidade acadêmica. Sem ela, a universidade não pode ser, como deve, o locus criativo de ensino, pesquisa, extensão, reflexão e critica. A universidade brasileira necessita dispor de liberdade para formular seu projeto didático, seu plano cientifico, sua programação ornamentaria e financeira e seus procedimentos de administração.

Diante da complexidade econômica, cultural e política do País, impor um modelo único de universidade é, mais do que comprometer sua liberdade, perverter sua função e sua responsabilidade perante a sociedade. Daí o imperativo de que cada universidade possa fazer sua própria experiência. A reivindicação da autonomia não isenta o Estado de seu dever de educar e de prover meios satisfatórios à prestação do ensino em todos os níveis, resguardada a destinação dos recursos públicos mediante adequado controle democrático. A autonomia tampouco deve ser entendida como uma dádiva que a sociedade outorga ao sistema universitário e a seus diversos segmentos.

A liberdade de planejar e gerir serviços conduz à responsabilidade pelos resultados alcançados, exigindo-se uma contrapartida definida em termos de desempenho eficiente. Em face do exposto, a Comissão recomenda:

(I) as universidades deverão ter a liberdade de determinar seus cursos de- graduação e pós-graduação e os correspondentes currículos, seus planos de pesquisa e atividades de extensão. As instituições isoladas, ou integradas, deverão estruturar seus cursos com a intermediação de universidades para esse fim selecionadas.

(ii) Caberá ao Poder Público responder pela manutenção e desenvolvimento das IES públicas, incluindo, em seus ornamentos, sob a forma de dotações globais, recursos destinados a cada uma delas e assegurando-lhes a oportuna transferência. A fixação dos recursos deve levar em consideração as necessidades da instituição e o resultado da avaliação do desempenho de suas atividades.

(iii) Cada IES deverá ter o direito de distribuir internamente os recursos recebidos, segundo planos e prioridades que estabelecer, sem a limitação de percentuais obrigatórios de despesa. A concessão de outros recursos para atividades de pesquisa, pós-graduação e extensão se submeterá a mecanismos externos de avaliação.

(iv) As IES públicas federais devem ser excluídas do processo de supervisão previsto no artigo 26 e seu parágrafo único e do sistema de atividades auxiliares, estabelecido nos artigos 30 e 31 do decreto-lei n 200, de 26 de fevereiro de 1967, que importam limitação à sua autonomia.

(v) A prática da autonomia deve envolver a participação efetiva de todos os segmentos da comunidade acadêmica na gestão universitária, segundo os procedimentos fixados em seus estatutos e regimentos gerais.

(vi) As IES devem estabelecer, em seus Estatutos, a forma de provimento dos cargos superiores de direção (Reitor e Vice-Reitor nas universidades; Diretor e Vice--Diretor nas isoladas). Entende a maioria da Comissão que, nas instituições públicas, deve ser aplicado o sistema de listas tríplices, de modo a permitir a participação do Governo na escolha de- dirigentes de entidades que integram o serviço público.

2. GESTÃO DEMOCRÁTICA E CONTROLE SOCIAL DA UNIVERSIDADE

A proposta de democratização das instituições de ensino superior articula-se estreitamente com a busca de um contínuo aperfeiçoamento na realização das finalidades universitárias específicas, que se expressam na elevação dos níveis de qualidade, eficiência e responsabilidade. A democratização será plenamente alcançada na medida em que a comunidade acadêmica, por meio dos seus três segmentos (professores, estudantes e- servidores técnico-administrativos), tiver oportunidade de escolher seus dirigentes e representantes nos órgãos decisórios; de participar ativamente nos colegiados e nas atividades universitárias; de obter informações fidedignas; e de exercer a avaliação e o planejamento de suas atividades.

a) Democratização interna das IES

O poder universitário está tradicionalmente concentrado nos órgãos decisórios superiores. Já que as relações verticais predominantes na sociedade brasileira penetraram também nas estruturas universitárias, tanto o reitor como os próprios dirigentes das diferentes universidades polarizam uma grande soma de poder. Além disso, as escolhas do Reitor, dos Pró-Reitores ou equivalentes e dos chefes de departamento e diretores de faculdades e centros são muitas vezes orientadas por critérios não acadêmicos ou personalistas.

Embora sejam antigas nos meios acadêmicos do País, as reivindicações de democratização da Universidade ganharam intensidade nós últimos tempos, em decorrência sobretudo da tomada de consciência e da mobilização das associações de professores, estudantes e funcionários. Nesse particular, a Comissão apresenta as seguintes recomendações:

(i) As universidades determinarão em seus Estatutos os procedimentos para a indicação dos dirigentes na área acadêmica e dos representantes nos colegiados. Tais procedimentos devem garantir a participação das várias categorias que compõem a comunidade acadêmica (professores, alunos, servidores técnico-administrativos). nas proporções definidas por cada universidade. Sugere-se ainda o exame da possibilidade de ampliar essa participação aos ex-alunos, conforme prática aceita e de ampla tradição em vários países da América Latina.

(ii) Com exceção dos cargos de Reitor e Vice-Reitor, Diretor e Vice-Diretor de IES isoladas, todos os demais cargos acadêmicos deverão ser designados por meio de atos internos da instituição, segundo seus estatutos e regimentos. Os cargos de Pró-Reitor, Sub-Reitor ou equivalentes deve ser de indicação privativa do Reitor.

(iii) A escolha dos representantes de cada segmento nos colegiados será feita em eleição direta por seus respectivos pares, de acordo com os procedimentos que cada IES determinar.

(iv) Devem ser estimuladas, nas IES, a descentralização das competências decisórias e a subordinação das atividades administrativas a serviço efetivo da vida acadêmica.

(v) Deve ser democratizado o acesso às informações , a fim de permitir uma constante interligação das direções com os diversos setores e a tomada de decisões com pleno conhecimento de causa.

b) Competência no ensino e na pesquisa

A política educacional em vigor acirrou alguns problemas estruturais da Universidade brasileira. O despreparo de professores, a falta de integração entre os vários níveis de ensino e a inadequação dos conteúdos do 1 e do 2 graus levaram a uma acentuada queda do nível do ensino em geral. Além disso, a inexistência de políticas adequadas nas áreas educacional, cultural e científica favoreceu a dependência externa nesses campos, com a conseqüente inadequação das teorias, leis e modelos à realidade concreta do País. Na qualificação dos docentes, as condições negativas existentes propiciaram um desnível entre às distintas regiões do País e entre as IES das capitais e as do interior, geraram contratações sem concurso e promoveram a obtenção de títulos mediante critérios corporativistas.

São poucas as universidade que têm conseguido unir o ensino e a pesquisa e, em escala ainda menor, a sua integração com a extensão. Na pesquisa, predominaram os projetos de unidades mais preparadas e capazes de sensibilizar às agências financiadoras, concentrando-se em determinadas regiões mais aparelhadas e, em certos casos, em institutos de pesquisa situados fora das universidades. Em face disso, os três segmentos universitários vêm pleiteando a melhoria dos padrões de qualidade nas pesquisas enquanto garantia da realização dos objetivos acadêmicos; a necessidade de avaliação do desempenho funcional e acadêmico; a valorização da titulação; pesquisas mais institucionalizadas; e uma justa distribuição dos recursos pelas distintas regiões e pelas diversas IES.

Sobre a matéria, a Comissão apresenta as seguintes sugestões:

(i) O Ministério da Educação, através de suas instâncias competentes, deve garantir os meios necessários à melhoria da qualidade do ensino e da pesquisa nas instituições de ensino superior.

(ii) É necessário estabelecer critérios objetivos e mecanismos apropriados para a avaliação e planejamento de todas as atividades universitárias, de modo a reforçar nelas a convivência e o mérito acadêmicos. Essa avaliação deve ser feita com a participação de personalidades do mundo acadêmico estranhas à instituição avaliada.

(iii) Respeitada a liberdade de pesquisa, devem-se estabelecer prioridades de interesse social, científico e acadêmico. Recomenda-se- ainda que, nos programas de pesquisa de órgãos do Ministério da Educação e de agências de pesquisa de outros Ministérios, Secretarias e Fundações, os recursos sejam distribuídos de modo a estimular grupos emergentes, bem como o potencial de cada região e de cada instituição em sua região específica É mister propiciar condições para que cada IES e a sociedade em geral tenham condições de participar na definição dessas linhas de pesquisa e na seleção das prioridades.

c) Extensão universitária

A extensão universitária no País assumiu formas diversificadas, tornando-se assim necessária uma melhor definição de sua natureza. Em termos gerais, a extensão tem englobado atividades que envolvem estágios curriculares, trabalhos de consultoria e assessoria, ações de assistência e atendimento social a setores carentes, iniciativas de cunho cultural, cursos de diferente teor, treinamentos de capacitação, participação em projetos governamentais e privados, visitas de- estudantes a regiões carentes e a campi avançados, etc.

No plano do ensino, têm sido desenvolvidos cursos e atividades similares para distintos segmentos sociais, dentro ou fora dos campi, cujos conteúdos são adaptados às variadas realidades e nos quais se busca a inovação das metodologias e técnicas de aprendizagem e comunicação.

Na pesquisa, vêm sendo propostas investigações que ampliem o conhecimento das questões sociais e forneçam sugestões concretas de intervenção social. Tem sido enfatizada a necessidade de uma socialização crescente dos resultados.

Diante disso, a Comissão recomenda:

(i) Considerar a extensão como uma dimensão essencial às finalidades das IES, integrada ao ensino e à pesquisa. Efetuar estudos sistemáticos para especificar sua natureza e seu significado para o conhecimento da realidade. Estimular a atuação das IES nas diferentes comunidades e na sociedade em geral, sem perda da sua especificidade.

(ii) Encorajar a Participação das IES nos planos e programas de desenvolvimento nacional, regional e local. Sugerir ao MEC e às Secretarias da Educação entendimentos com outros órgãos governamentais, visando à participação das IES em conselhos e colegiados de organismos de desenvolvimento regional e estadual, tais como SUDENE, SUDECO, SUDAM, SUFRAMA e SUDESUL.

(iii) Utilizar bibliotecas, laboratórios, museus, editoras, gráficas, teatros e outros serviços complementares das IES de modo a fazê-los funcionar também como meios de interligação com a comunidade.

(iv) Incentivar o caráter multidisciplinar dos programas e projetos de prestação de serviços às comunidades.

(v) Estimular convênios e projetos com empresas estatais e privadas a fim de melhor conhecer o mercado de trabalho profissional, de elaborar subsídios para uma política industrial voltada para os interesses nacionais e das maiorias e de produzir inovações tecnológicas, sem prejuízo da autonomia universitária.

(vi) Rever às concepções de cidade universitária como campus fechado, abrindo canais que facilitem sua comunicação com a sociedade circundante.

(vii) Assegurar, nas atividades de extensão universitária, os seguintes objetivos: a difusão dos conhecimentos obtidos: a continuidade dos serviços oferecidos à população; a contínua ação recíproca entre a extensão, por um lado, e, por outro, o ensino e a pesquisa.

c) Função social do ensino superior

As instituições universitárias, na maioria dos casos, estão mais voltadas para a sua dinâmica interna do que para a mudança social. A responsabilidade social do ensino superior tem múltiplas dimensões. A sociedade, na medida em que sustenta a Universidade, tem o dever de lhe exigir prestação de contas do ensino e da pesquisa que desenvolve, assim como dos recursos que aplica. Embora nos últimos anos tenha crescido o número de assalariados que freqüenta cursos noturnos, a tendência predominante ainda não se alterou: são poucos os que dispõem das condições sócio-econômicas necessárias para o ingresso no ensino superior. A sociedade, de algum modo, deve ser retribuída pela concessão desse privilégio. De resto, as IES concentram uma massa crítica de recursos humanos e materiais que deve ser socializada e difundida. Num país com tantas desigualdades sociais e regionais, cabe à Universidade um papel importante no esforço para superar essa situação.

Por isso, a Comissão considera necessário:

(i) Integrar a formação profissional com uma formação geral, capaz de ampliar os conhecimentos dos alunos e neles m fundir um efetivo compromisso social.

(ii) Estruturar os cursos, currículos e programas de modo a torná-los permeáveis às questões postas pela realidade social; promover pesquisa e atividades de extensão que produzam e difundam os conhecimentos em função das necessidades da maioria da população.

(iii) Expandir e adequar os estágios curriculares como forma de por os estudantes em contato com as realidades social e profissional e de relacionar a teoria com a prática.

e) Controle social

A sociedade deve exercer um controle efetivo sobre o tipo de educação veiculado nas IES e sobre o modo pelo qual são aplicados os recursos alocados nessas instituições. Contudo, o controle social apresenta dificuldades. A primeira delas refere-se ao risco de que tal controle possa ferir a autonomia universitária. Porém, na medida em que a autonomia não significa descompromisso do Estado e da sociedade para com a educação, é aconselhável uma participação exógena - sob formas adequadas - no controle das atividades de ensino superior.

Uma segunda dificuldade consiste em estabelecer qual representação da sociedade dispõe de maior legitimidade para exercer o controle social.

Tradicionalmente, esse controle tem sido realizado pelo Estado, através da aprovação dos orçamentos, dos projetos e do exame posterior do emprego das verbas. Coloca-se, de modo mais concreto, a questão de estabelecer qual é a instância estatal mais adequada para atuar diretamente no interior das IES. É importante que organismos da sociedade civil participem também do processo de controle social. Verifica-se atualmente, nos conselhos universitários de todas as instituições, a presença de representantes das classes empresariais. Assim, é perfeitamente legítimo e democrático ampliar essa participação da sociedade civil nos conselhos das IES a outros segmentos representativos.

Decerto, o controle social é exercido, de forma ampla, pelas avaliações que a comunidade científica e acadêmica faz das atividades de cada IES, bem como pela imagem e reconhecimento que elas obtém junto à opinião pública. Contudo, parece-nos importante examinar a possibilidade de formas mais diretas de acompanhamento.

Por isso, a Comissão sugere:

- Estabelecer mecanismos apropriados para que os diferentes setores da sociedade civil possam exercer um efetivo controle social das finalidades das IES, sem com isso afetar a sua autonomia universitária.

f) Revisão dos estatutos e regimentos gerais

Algumas IES já vêm desenvolvendo experiências de elaboração e aprovação de estatutos e regimentos gerais com a participação dos organismos estatutários ou por meio da constituição de colégios especiais. Trata-se de encontrar os meios que assegurem, quando da implementação das presentes recomendações, o equilíbrio entre os diversos processos de democratização e a conservação do vínculo entre mérito acadêmico e compromisso social .

Por isso, a Comissão sugere:

- Que a reformulação dos estatutos e regimentos das IES seja aprovada por colégio especial, integrado pelo conselho universitário e demais conselhos superiores e por representantes, eleitos para esse fim, de professores, alunos e servidores técnico-administrativos.

3. UNIVERSIDADES E INSTITUIÇÕES ISOLADAS DE ENSINO SUPERIOR

O sistema de ensino superior brasileiro tende a ser pensado, normalmente, em termos universitários: é nas universidades que se supõe a existência conjunta do ensino, da pesquisa e da extensão; são as universidades que recebem autonomia; e os títulos superiores dados pelas instituições de ensino do País são, normalmente, considerados como "universitários." No entanto, a realidade é que cerca de 70% dos estudantes superiores do país estudam em estabelecimentos isolados, sejam eles públicos ou privados; e as próprias universidades tiveram, em sua origem, faculdades superiores isoladas, que se mantiveram com relativa independência até a Reforma Universitária de 1968.

Esta discrepância entre o ideal universitário e a realidade do ensino em estabelecimentos isolados permite dois encaminhamentos. Por um lado, um esforço para levar os estabelecimentos isolados a se unirem em universidades; por outro, um reconhecimento da situação diferenciada que existe, e medidas apropriadas para lidar com ela. Este documento se encaminha no segundo sentido.

a) Os elementos constitutivos das universidades

Uma universidade, tal como entendida no Brasil, reuniria pelo menos os seguintes elementos: (I) ela deveria incluir uma ampla gama de conhecimentos das áreas técnicas e de saúde às humanidades. Este conceito exclui, portanto, universidades dedicadas a áreas específicas de conhecimento, como engenharia, saúde ou ciências sociais; (ii) ela deveria possuir recursos humanos, materiais e técnicos adequados pára o ensino e a pesquisa de alto nível; (iii) estes dois elementos servem de base para o terceiro, que é o da autonomia didática, pedagógica, financeira e administrativa.

Na prática, o "status" universitário tem permitido às instituições de ensino superior autonomia na criação de cursos de graduação e pós-graduação, no registro de diplomas e no credenciamento de seus professores. As universidades federais também recebem do governo recursos para uma série de encargos e atividades que normalmente não estão disponíveis para estabelecimentos isolados.

b) Os estabelecimentos isolados

Os estabelecimentos isolados constituem uma categoria abrangente que, na realidade, engloba instituições de tipo completamente distinto. Entre eles, devem ser destacados:

(I) estabelecimentos federais especializados, com faculdades de medicina e engenharia que não pertencem a universidades;

(ii) estabelecimentos isolados particulares;

(iii) estabelecimentos particulares agrupados em fede rações e associações de diversos tipos, ou vinculados à instituições mantenedoras comuns.

Os estabelecimentos isolados incluem, portanto, tanto instituições de alto nível quanto de qualidade duvidosa; tanto mantidas pelo governo federal quanto por mantenedoras privadas. Seu tratamento legal, no entanto, tem sido similar. Elas não gozam de autonomia didática, e funcionam, supostamente, sob a tutela direta do governo. É provável que, para as instituições de melhor nível, esta tutela seja desnecessária e prejudicial; para outras, ela pode ser insuficiente.

c) Propostas

As propostas aqui indicadas partem do reconhecimento da situação atualmente existente. Parte, igualmente, da idéia de que não tem sentido, na realidade, pretender o enquadramento de toda a educação superior do país no modelo universitário clássico.

Por um lado, existem em todo o mundo - e o Brasil não seria exceção - instituições de ensino superior voltadas à formação profissional especializada, e sem pretensão ou intenção de desenvolver atividades de pesquisa. Por outro lado, existem instituições de alto nível que têm todas as condições para a autonomia didática, científica e administrativa, mas que, por sua vocação, não se interessam por atuar em determinadas áreas de conhecimento, e por isto não recebem o título de universidade. Não há dúvida, no entanto, que o requisito da "universalidade de conhecimento", que fazia parte da definição clássica das universidades tradicionais, já no se aplica da mesma forma nos dias de hoje, quando, por um lado, as diversas áreas de conhecimento quase não se comunicam de fato nas modernas "multiversidades"; e quando, por outro, especializações são inevitáveis, e as divisões clássicas entre humanidades, ciências exatas e ciências biológicas já são precárias.

Diante desta situação, a Comissão apresenta as seguintes propostas:

(i) Caberá ao Conselho Federal de Educação renovado o reconhecimento do "status universitário" de instituições de ensino superior no Brasil, para efeitos de obtenção da autonomia didática, administrativa e financeira.

(iii) A prerrogativa das universidades supervisionarem o funcionamento de estabelecimentos isolados também deveria ser assumida gradualmente, por autorização do C.F.E. , mediante a criação de mecanismos específicos para este fim.

(iv) As Universidades particulares também deveriam contar com autonomia didática e administrativa em relação às instituições mantenedoras, semelhante à autonomia das universidades federais e estaduais em relação aos respectivos governos.

(v) O reconhecimento do "status" universitário deve basear-se, essencialmente, na capacidade de autogestão acadêmica e administrativa dos estabelecimentos de ensino, o que implica na existência de pesquisa de alto nível e correspondentes recursos técnicos, humanos e administrativos. O requisito formal da abrangência deve ser abandonado, terminando assim a equivalência equivocada entre universidade e "universalidade"; o "status" universitário pode ser concedido tanto a universidades clássicas como, por exemplo, a Institutos de Tecnologia ou de Ciências Médicas de alto nível e grande complexidade.

(vi) Instituições isoladas que não tenham condições ou vocação para se constituir em universidades deveriam obter um "mandato universitário" de universidades geograficamente próximas, sejam elas públicas ou privadas. Isto significa que estas instituições seriam "acreditadas" (reconhecidas) por estas universidades, e funcionariam sob sua supervisão acadêmica. Esta supervisão deveria se exercer de diversas formas:

- por convênios de cooperação técnica e didática entre às universidades e os estabelecimentos isolados;

- pela aprovação dos currículos, instalações e professores das faculdades isoladas pela universidade;

- pelo registro dos diplomas dos estabelecimentos isolados pelas universidades.

A idéia básica é que os diplomas expedidos pelos estabelecimentos isolados sejam validados pelas universidades, não somente do ponto de vista formal (como já ocorre hoje com o registro de diplomas nas universidades federais), mas quanto a sua qualidade, de maneira tal que a Escola X, por exemplo. possa anunciar que funciona sob a supervisão e com o endosso da Universidade Z. Esta supervisão deveria ser feita pelos respectivos departamentos ou faculdades, e ser objeto de convênios que despertassem, nas universidades, interesse pela tarefa.

(vii) outra alternativa, não excludente em relação à anterior, seria a criação de redes nacionais ou regionais de instituições isoladas, que funcionassem sob regime de supervisão comum. A idéia principal, aqui, seria que a integração dos diversos estabelecimentos de ensino se desse pela área de conhecimento, e não pela proximidade geográfica de estabelecimentos distintos. Estas redes nacionais ou regionais deveriam ter seus órgãos normativos próprios, formados com participação das universidades e dos Ministérios e Secretárias da Educação, além de associações, Conselhos profissionais e outros setores interessados naquela área específica de conhecimento. A estes órgãos normativos caberia a supervisão e o acreditamento dos estabelecimentos isolados a eles subordinados.

(viii) Lugar especial deve ser ocupado por Institutos Superiores de Tecnologia, cuja criação a Comissão sugere que seja examinada pelas autoridades governamentais a partir de uma avaliação adequada da experiência limitada que o País já possui neste campo. É ilustrativa, no caso, a experiência da França, que desde quase vinte anos tem uma rica prática neste sentido. Lá, os cursos são concentrados em dois anos ou - quatro semestres - , abertos aos titulares de certificados de conclusão de nível médio, e correspondem a cerca de 2.000 horas de cursos e trabalhos, com estágios obrigatórios no último semestre. A sugestão para o Brasil é que estes institutos tenham a duração de três anos, e se dediquem à formação de especialistas em tecnologia clássica e avançada em todas as áreas de conhecimento (tecnologias físicas, de biologia aplicada, de energia, de informática, de comunicação e documentação, químicas, e elétrica e eletrônica), bem como às mais ajustadas às regiões em que os institutos se localizem. Estes institutos podem ser criados junto a universidades, mas também de forma isolada, e sob coordenação e supervisão de organismo federal especificamente capacitado para isto, constituído com a participação dos Ministérios da Educação, Ciência e Tecnologia e Indústria e Comércio.

(ix) As duas formas de acreditação e supervisão acadêmica sugeridas acima (ítens 6 e 7) não implicam ingerência nos aspectos administrativos e financeiros das instituições isoladas que delas participem. No entanto, é claro que a retirada desta acreditação deverá trazer conseqüências, que irão desde a perda de validade dos títulos até a inabilitação para o recebimento de eventuais subsídios públicos, incluindo eventualmente a interdição governamental .

Com estas medidas, a autonomia universitária seria revigorada, o controle de qualidade dos estabelecimentos isolados passaria a se dar de forma efetiva e descentralizada, e todo o sistema de ensino superior do País se beneficiaria.

4. ENSINO PÚBLICO E ENSINO PARTICULAR

A questão do ensino público versus ensino privado, que no passado se confundia com a polêmica entre liberalismo e estatismo, necessita hoje ser colocada em outro patamar de reflexão. Nossa história mostra, desde seus primórdios, a presença ativa do ensino particular, com destaque para o ensino religioso. Ainda que tenham existido e persistam avaliações divergentes sobre seu papel, o fato é que as Constituições anteriores sempre garantiram, de uma forma ou outra, a convivência da educação pública com a privada.

Na atual Constituição, o ensino privado está mais uma vez assegurado, sendo garantida a liberdade de ensino, condicionada a sua fiscalização pela autoridade pública. Ela também atribui à competência legislativa federal a prerrogativa de estabelecer as "diretrizes e bases da educação nacional". Dados levantados pelo Ministério da Educação para 1983 registram a existência de 615 instituições de ensino superior privadas, com 60% do total de matrículas, contra 253 instituições públicas atendendo os 40% restantes.

O crescimento do setor privado nos últimos anos suscita interrogações sobre o equilíbrio do conjunto. Há setores que criticam a tendência privatizante, que teria sido estimulada pela política educacional do governo federal; há os que defendem o ensino público e gratuito em todos os níveis; e há, ainda, os que defendem o ensino privado como legitimo, exercendo função essencial no sistema educacional brasileiro. Esta questão necessita ser examinada à luz da enorme variedade de situações e regiões geográficas em que surgiram e se desenvolveram as instituições de ensino privadas, o que impede que ela seja tratada a partir da idéia de um modelo único para o ensino superior em todo o País.

a) Semelhanças e diferenças entre os dois sistemas de ensino

Existe uma série de características que afetam de maneira similar tanto o ensino público quanto o privado. Entre elas podemos citar (i) a pouca integração entre o ensino, pesquisa e extensão; (ii) o verticalismo nas relações do poder; (iii) o distanciamento das universidades em relação à realidade nacional, regional e local; (iv) ociosidade no uso de recursos; (v) baixa produtividade no desempenho de atividades acadêmicas de uma forma geral. Existem, é claro, exceções localizadas em algumas instituições, ou unidades dentro delas, em ambos os setores, e diversas regiões do País. Em alguns casos, instituições privadas desenvolvem programas de pesquisa, produção acadêmica e formação profissional de alto nível, aproximando-se assim das melhores instituições públicas; ao mesmo tempo, a deterioração real dos salários dos professores das universidades públicas e a falta de recursos materiais e físicos têm aproximado muitas instituições federais das dificuldades experimentadas pelas instituições privadas.

Por outra parte, existem importantes diferenças de desempenho entre os dois setores, reveladas por indicadores estatísticos de vários tipos. O ensino público se destaca pela produção de pesquisas e pela melhor infra-estrutura de apoio para os professores, alunos e funcionários, e por exibir números mui to maiores de alunos por professores e funcionários. O ensino privado exibe custos inferiores na relação professor/aluno e funcionário/aluno e nos custos por aluno.

Algumas das principais diferenças entre o ensino público e privado podem ser observadas no quadro a seguir:
 

 
Ensino Público 
 Ensino Privado 
Total de alunos
 39,2% 
 60,8% 
Total de professores
 57,9% 
42,1% 
áreas de conhecimento (número de alunos): 
   
Ciências Biológicas e Saúde 
56,7% 
43,3% 
Ciências Exatas e Tecnológicas 
 42,7% 
 57,3% 
Ciências Agrárias 
86,3% 
 13,7% 
Ciências Humanas e Sociais 
25,4% 
74,6% 
Letras 
 34,1% 
68,2% 
Artes 
 49,4% 
 50,6% 
cursos de licenciatura 
30,7% 
69,7% 

 Fonte: Raul Tramontin e Ronald Braga, "O Ensino Superior Particular no Brasil; Traços de um Perfil". Em Cândido Mendes e Cláudio Moura Castro, (org.), Qualidade, Expansão e Financiamento do Ensino Superior Privado. ABM/ Educam, 1984 (dados de 1980).

Os dados mostram que o ensino particular é o grande responsável pela formação de professores para o ensino de primeiro e segundo graus (cursos de licenciatura) particularmente nas áreas de ciências sociais e humanas e em letras. É de se supor também que um número significativo dos cursos em ciências biológicas e exatas no setor privado seja de formação de professores de nível de 2 grau e não de médicos ou engenheiros. As licenciaturas em ciências humanas e letras não exigem, em geral, equipamentos e materiais pedagógicos dispendiosos, e permitem um grande número de alunos por professor. No entanto, existem instituições particulares com programas de qualidade em pesquisa, produção acadêmica e formação profissional de alto nível .

b) Recursos públicos para escolas particulares

A deterioração progressiva da situação econômico-financeira do setor privado, agravada pela migração de seus alunos à instituições públicas, pelo controle governamental de seus preços, pela ausência de incentivos fiscais à educação paga (exceto as deduções do imposto de renda) e pela eliminação de bolsas de estudo do salário-educação, tem colocado na ordem do dia a questão do subsídio público ao ensino superior privado. Algumas universidades privadas, entre as quais o subconjunto das universidades particulares confessionais, tendo em conta seu porte e as atividades que desenvolvem nas áreas de pesquisa, ensino e pós-graduação e serviços na área social, procuram definir-se como "comunitárias" e reivindicar para si um tratamento especial por parte do governo. Estas universidades enfrentam uma situação sem saída enquanto permanecerem as atuais condições de conflito entre, por um lado, as reivindicações de professores e funcionários por melhores salários e condições de trabalho e, por outro, demandas dos alunos por menores custos ou congelamento de taxas e mensalidades. Para tentar contornar essa situação, universidades católicas propuseram a criação de um sistema especial que lhes permitisse receber verbas orçamentárias federais, evitando assim a imprevisibilidade gerada pelas oscilações e atrasos nos poucos subsídios que lhe são propiciados.

Enquanto o setor privado enfrenta estes problemas, no setor público critica-se duramente a tendência privatizante da política educacional dos últimos anos, o descaso do governo para com a rede pública de ensino, a queda acentuada dos recursos recebidos, favorecendo a saída de professores para as empresas e para a rede privada, gerando o desestímulo e levando à perda de qualidade do ensino. Nesta perspectiva, o subsídio ao ensino privado é visto como prejudicando ainda mais um ensino público já depauperado.

Diante desse quadro e da necessidade de serem estabelecidas diretrizes que possam ser rapidamente implementadas, a Comissão faz as seguintes recomendações gerais:

(i) Que a nova Constituição assegure a responsabilidade do Estado pela educação em todos os seus níveis;

(ii) Que a nova Constituição mantenha a liberdade de ensino e o pluralismo de pensamento, possibilitando a iniciativa particular nos diferentes ramos de ensino;

(iii) Que a nova Constituição assegure a manutenção e a expansão quantitativa e qualitativa do ensino público em todos os níveis do ensino, visando à sua democratização;

(iv) Que sejam garantidos e tornem-se disponíveis recursos adequados à educação nos montantes atribuídos pela Emenda Calmon à União, Estados e Municípios, considerando-se esta garantia como preceito constitucional;

(v) Que os recursos públicos destinados às instituições de ensino superior sejam geridos de forma democrática, com participação da comunidade universitária e garantindo-se sua utilização no interesse público.

Tendo em vista a existência de instituições particulares de porte e padrões de qualidade reconhecidos, e que vêm sendo subsidiadas pelo Estado de forma aleatória, a Comissão faz as seguintes recomendações específicas:

(i) Que seja criada, por lei, a possibilidade de que instituições particulares de ensino superior reconhecidas pelo seu padrão de qualidade, sejam consideradas como entidades de utilidade pública educacional, para efeito de obtenção de recursos públicos; A legislação deverá estabelecer:

- os requisitos mínimos exigidos para seu reconheci mento como entidade desta natureza;

- a forma pela qual este reconhecimento será feito. Em princípio, esta função deverá estar sob a responsabilidade do Conselho Federal de Educação, reformulado no sentido proposto pela Comissão;

- os mecanismos de acompanhamento que assegurem a permanência dos requisitos de qualidades exigidos.

(ii) Que as instituições privadas que recebam apoio público na forma indicada acima tenham suas atividades sujeitas a controle social efetivo;

(iii) Que o crédito educativo seja ampliado e o sistema de bolsas de estudo expandido, segundo critérios a serem estabelecidos pelos Conselhos Federal e Estaduais de Educação.

c) Instituições mantenedoras

O papel desempenhado pelas instituições mantenedoras de estabelecimentos de ensino privado tem sido questionado, quanto a sua interferência acadêmica e administrativa nas instituições, assim como quanto a seu relacionamento com as autoridades e setores do Ministério da Educação, Secretarias e agências financiadoras. As críticas mais incisivas se dirigem ao cerceamento que exercem sobre a autonomia acadêmica, assim como aos eventuais usos de artifícios legais na gestão de recursos, com orçamentos que permanecem normalmente desconhecidos pela comunidade acadêmica interessada. No caso de instituições confessionais, coloca-se a questão de eventual limitação da liberdade acadêmica, com o objetivo de preservar a orientação doutrinária ou filosófica da mantenedora. Esta questão tem levado muitas destas mantenedoras a não aceitarem a criação de associações de professores e funcionários, frustrando desta forma o processo de democratização interna de suas instituições. Sem prejuízo da necessidade de um exame mais profundo desta questão, a Comissão apresenta as seguintes sugestões:

(i) as mantenedoras devem respeitar a autonomia universitária e aceitar e estimular a democratização das IES sob sua responsabilidade;

(ii) as mantenedoras em que prevalece a direção centralizada em pessoas físicas devem rever seus estatutos de forma a assegurar a participação de representantes dos vários setores da instituição mantida;

(iii) o custeio do ensino privado deve ser atendido com contribuição dos alunos e das comunidades envolvidas, e com recursos próprios das instituições mantenedoras.

5. REFORMULAÇÃO DO C.F.E.

O Conselho Federal de Educação, tal como os colegiados que o antecederam desde 1911, é um órgão de assessoramento do governo, de caráter técnico, integrado na estrutura do Ministério da Educação. Sua atual competência é múltipla. Participa do controle da expansão do sistema federal de ensino superior, mediante pareceres sobre autorização é reconhecimento de cursos de instituições privadas, reconhecimento de cursos públicos e de universidades, e credenciamento de cursos de mestrado é doutorado. Exerce, igualmente, o controle de legalidade no sistema federal, por intermédio de recursos de decisões finais das IES e propostas de intervenção em casos de grave irregularidade, após inquérito administrativo, cabendo ao Ministro da Educação designar o interventor. Goza, ainda, de poder normativo em matérias específicas indicadas em lei.

O provimento dos cargos de conselheiro - que hoje é de livre escolha do Presidente da República - deve recair em pessoas de "notável saber e experiência" em matéria de educação, atendendo a critério de distribuição representativa das diversas regiões do País, os diversos graus de ensino e o magistério oficial e particular.

No entanto, a experiência acumulada na prática da atual competência é composição do CFE, no juízo de expressiva maio ria dos que participam da atividade educativa, tem revelado que ele deixou de ser representativo dos movimentos é dos ideais ré clamados pela comunidade acadêmica.

A discricionaridade na escolha de seus membros, apesar do pressuposto de notável saber e experiência em educação, e da observância de critérios de distribuição regional ou por níveis de ensino, retirou-lhe a plena legitimidade como expressão dos diversos componentes do universo do ensino superior. Além do mais, expõe o CFE a nomeações decorrentes das mais variadas pressões políticas e de critérios às vezes duvidosos.

Assim, o CFE vê hoje abalada sua credibilidade perante a comunidade acadêmica, enquanto órgão responsável pelo desempenho qualitativo do sistema de ensino em todos os graus. Embora sua competência legal tenha sido ampliada progressivamente nos últimos dezessete anos, disso não decorre que o CFE tenha contribuído decisivamente para a melhoria do sistema brasileiro de educação. Tanto a legislação ordinária e constitucional, como sua prática, foram incapazes de torná-lo imune a interesses corporativistas, levando-o a configurar os saberes de forma a que viessem a servir à regulamentação das profissões e a clivagens do mercado de trabalho. Nisso, convém salientar, também às universidades detêm parcela de responsabilidade.

São essas as razões pelas quais se impõe criar mecanismos novos e eficazes que possam acender um sopro autêntico de renovação. Um CFE reformulado e dinâmico poderá converter-se em viga mestra no processo de revitalização, reorganização e resgate da legitimidade do sistema nacional de educação, abrindo caminho, por um lado, para uma efetiva autonomia do ensino superior e, por outro, zelando pela melhoria de seus padrões de qualidade.

No entanto, uma reforma dessa amplitude somente será produtiva quando obtiver apoio e colaboração no cumprimento de seus novos objetivos. E estes, por sua vez, somente poderão ser alcançados de modo pleno se estiverem relacionados a demandas e anseios vigentes no País. Tais anseios e demandas são basicamente inspirados por três fontes:

- os movimentos dos docentes, estudantes e funcionários, os quais ultrapassam seus interesses específicos para trazerem idéias ao debate sobre o ensino superior;

- a rede universitária de ensino, conservando a tradição e produzindo novos conhecimentos;

- a administração governamental, procurando equacionar os problemas da educação como um todo e como parte do processo de desenvolvimento nacional; tal administração se relaciona com os grupos pensantes tanto para recrutar seus membros quanto para aurir, neles, sua legitimidade.

Face a essas considerações, a Comissão apresenta a seguinte proposta de reestruturação do CFE:

(I) No tocante à competência, deve o CFE ser liberado de atribuições rotineiras, cabendo-lhe fixar diretrizes a serem executadas, em casos concretos, por órgão adequadamente habilitado na administração superior do MEC.

O CFE deverá exercer, basicamente, atividades de assessoramento ao Governo Federal no planejamento nacional e na política de desenvolvimento da educação, inclusive em matéria orçamentária e de financiamento. Sua presença deve ser a de um fórum privilegiado de estudo e diagnóstico da realidade educacional e de orientação dos programas setoriais de governo que devem atender, em sua plenitude, às demandas da sociedade.

Para que possa desempenhar esses papéis, o CFE terá de estabelecer mecanismos de avaliação permanente do sistema brasileiro de educação, com apoio de comissões ad hoc de especialistas por ele designados - mecanismos esses que somente terão legitimidade se forem inter-pares. Apenas assim é que o CFE, isento de influências indébitas, poderá servir de canal de comunicação e de informação entre o governo e a comunidade acadêmica para a proposição de políticas educacionais de médio é longo prazo.

(ii) No tocante à composição, os imperativos de representatividade de todo o sistema de ensino brasileiro exigem maior participação da comunidade na escolha dos membros do CFE. Com esse propósito, sugere-se que o colegiado seja elevado a trinta membros, de notório saber na área da educação, escolhidos de tal forma que se estabeleça um equilíbrio de representantes das diversas regiões do País, por um lado, e dos ensinos de 1, 2 e terceiro graus, por outro.

A escolha desses membros, a serem nomeados pelo Presidente da República, obedecerá aos seguintes critérios:

10 professores, representantes das universidades, escolhidos a partir de lista tríplice elaborada por um colégio eleitoral composto por elas;

b) 8 personalidades de reconhecido valor acadêmico e científico, indicadas a partir de listas tríplices elaboradas pelas sociedades científicas de âmbito nacional, especificadas para esse fim pelo Governo Federal;

c) 4 representantes das escolas superiores isoladas, escolhidos a partir de listas tríplices formuladas por um sistema de consultas;

d) 4 representantes do primeiro e segundo graus, indicados pelo Ministro da Educação;

e) 4 representantes indicados, respectivamente, pelas entidades nacionais de docentes do ensino superior, de docentes de primeiro e segundo graus, dos estudantes universitários e dos servidores técnico-administrativos.

O mandato dos conselheiros será de quatro anos, permitida uma recondução, salvo o dos representantes especificados na alínea "e", que será de dois anos.

(iii) Respeitadas às diferenças regionais e as especificidades dos ensinos de primeiro e segundo graus, os Conselhos Estaduais de Educação terão de se adaptar aos princípios que inspiram a proposta de reforma do CFE.

6. A AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

a) A necessidade da avaliação: a ausência de padrões

Um dos problemas mais graves do ensino superior brasileiro nos dias de hoje é que lhe faltam parâmetros. O ensino é bom? Tem melhorado ou piorado? É melhor nas instituições públicas ou nas privadas? Em São Paulo, Pernambuco, Minas Gerais ou Rio Grande do Sul? Nas áreas técnicas, humanas ou biológicas? Mais ainda, é melhor ou pior de que ponto de vista? Da preparação dos alunos para o mercado de trabalho? Da formação de profissionais polivalentes? Da formação humanística e crítica? E qual as relações que existem entre estas dimensões? Será que um ensino mais profissionalizante é necessariamente menos polivalente ou crítico do que o de tipo geral? E finalmente: de que depende à qualidade, seja qual for a sua definição: da formação pedagógica dos professores? Da pesquisa que a instituição realiza? Da formação prévia e origem social dos alunos? Da existência de equipamentos, sala de aulas, bibliotecas, computadores? Dos currículos mínimos? Da bibliografia utilizada?

Quase todos os que se interessam pelo ensino superior têm opiniões sobre estes assuntos: estas opiniões, no entanto, variam, e não há como distinguir o que é verdadeiro do que é simples resultado de preconceitos ou generalizações apressadas.

A ausência de parâmetros afeta o ensino superior sob muitos pontos de vista. Para o governo, ela não permite que se tenha uma política racional de alocação de recursos públicos, que fortaleça as melhores instituições e induza as demais ao aperfeiçoamento. Para professores e administradores educacionais, ela impede que saibam exatamente como melhorar suas instituições, quais os falsos caminhos, quais as soluções mais promissoras. Para o candidato à universidade e sua família, a escolha de uma escola superior e de uma profissão é como uma loteria: os alunos decidem suas carreiras baseados em fragmentos de informação, o que explica, em parte, a grande frustração e um certo ceticismo que acabam permeando o sistema universitário do país.

Existe hoje, no Brasil, uma crescente consciência sobre a necessidade de desenvolver sistemas de avaliação do ensino superior. Esta necessidade é sentida pela administração federal, para a distribuição racional de seus recursos; pelas universidades públicas, que necessitam conhecer a si próprias, e confrontar com dados objetivos as críticas que freqüentemente recebem; pelas IES privadas, que necessitam evidenciar a qualidade de seu desempenho e sua eficiência no uso de recursos; pelos estudantes e suas famílias, que não podem mais contar com resultados positivos de seus investimentos em educação superior, se mal direcionados.

b) Avaliar o que?

Não é por acaso que os parâmetros de avaliação sejam tão problemáticos As instituições de ensino superior são plurifuncionais, ou seja, buscam objetivos freqüentemente conflitivos ou pelo menos não totalmente coincidentes, e convivem normalmente com a ambigüidade. Ensino geral, ensino especializado, formação de elites, mobilidade social, pesquisa científica, transmissão de valores culturais, ambiente de convivência entre gerações, trabalhos de extensão comunitária, compensação das deficiências do ensino secundário - esta é somente uma lista parcial das funções que as IES, em seu conjunto, tratam de desempenhar ao mesmo tempo. Isto significa que elas não podem ser submetidas aos mesmos padrões de avaliação típicos de instituições unidimensionais - como as empresas, voltadas para o lucro, ou projetos de engenharia, voltados para a realização de uma obra específica com o máximo de qualidade e o mínimo de tempo e custos.

No entanto, a experiência internacional mostra que, ainda que a avaliação não seja simples, os diversos países têm noções bastante claras sobre o desempenho de suas instituições de ensino sob diversos aspectos, e não funcionam tão às cegas quanto o Brasil. Uma lista parcial de formas de avaliação inclui as seguintes modalidades:

b.l ) Avaliação dos cursos

(i) Avaliação por especialistas segundo áreas de conhecimento. Por este mecanismo, os diversos cursos em determinadas áreas são avaliados por uma comissão de especialistas, que se utilizam de informações de vários tipos para chegar a uma opinião. Na maioria dos casos, esta avaliação é feita de forma reputacional, ou seja, os especialistas explicitam a reputação que os diferentes cursos gozam em seu meio. O Brasil tem tido algumas experiências interessantes de avaliação desse tipo, por exemplo, na área de engenharia, e a Secretaria de Educação Superior iniciou, recentemente, uma experiência em escala nacional.

(ii) Avaliação dos recursos físicos, financeiros e pedagógicos das IES. Esta abordagem permite aferições quantitativas bastante complexas, cujo impacto sobre a qualidade do ensino, no entanto, nem sempre é muito claro, inclusive porque os dados normalmente se referem às instituições de ensino como um todo, que podem conter em seu interior cursos de qualidade muito distinta.

(iii) Indicadores de eficiência de diversos tipos: alunos por professor, taxas de desistência e repetência, custos financeiros por aluno e professor, etc. Os problemas com estes dados são semelhantes aos do item anterior.

b.2) Avaliação dos alunos

(i) Avaliação da demanda. Consiste, basicamente, em avaliar os cursos pela demanda de alunos, assim como pela qualidade ou formação anterior que estes alunos possuem. A suposição é que os cursos com mais candidatos, e candidatos mais qualificados, são superiores aos menos demandados, ou demandados por pessoal menos qualificado. Esta suposição só é realmente válida se o "mercado" dispuser de melhores informações sobre o "produto" que as IES oferecem, e se houver mobilidade para que os estudantes possam buscar, nas várias regiões do País, as instituições que preferem. Este tipo de indicador é bastante utilizado nos Estados Unidos, onde a qualificação dos candidatos é medida por testes padronizados nacionalmente (o Scholastic Aptitude Test). Ele permite, inclusive, verificar as tendências da demanda no tempo, e a própria variação da qualificação global dos candidatos. No Brasil, o que existe de semelhante são os estudos feitos esporadicamente com dados dos concursos vestibulares integrados das grandes capitais.

(ii) Avaliação comparativa dos formados. Por este procedimento, todos os alunos formados em determinada área de conhecimento (ou uma amostra deles) são submetidos a testes padronizados, que permitem aferir o quanto sabem. Este é, possivelmente, o melhor indicador de desempenho dos cursos. Sua dificuldade principal consiste em institucionalizar a aplicação dos testes, que em alguns países assume a forma de "exames de Estado" ou de exames realizados por conselhos e outros tipos de associação profissional.

(iii) Avaliação das oportunidades de trabalho. Nesta análise, amostras de formados são pesquisadas em um esforço para determinar em que medida sua formação superior influencia ou não suas oportunidades de carreira. Quando combinados com dados curriculares e de origem sócio-econômica, este tipo de pesquisa permite avaliações bastante finas sobre o peso relativo do desempenho educacional na determinação das carreiras. O INEP tem apoiado, já há alguns anos, a realização de estudos deste tipo.

b.3) Avaliação dos professores

(i) Avaliação da pesquisa e da pós-graduação. Este é, sem dúvida, o tipo de avaliação mais desenvolvido em todo o mundo, e onde o Brasil já possuí excelente experiência, levada a cabo pela CAPES. O problema, no entanto, é que a qualidade dos professores dos programas de pós-graduação não é necessariamente um bom preditor da qualidade do ensino de graduação, dada a separação que freqüentemente existe no Brasil entre estes dois níveis.

(ii) Avaliação reputacional dos professores. Consiste em verificar a reputação dos professores entre seus colegas, por uma parte, e entre os alunos por outra. Avaliações de professores por alunos são muito comuns, mas seu sentido real é bastante problemático, já que estão sujeitas a fatores que não expressam, necessariamente, resultados pedagógicos a longo prazo. Além disto, estas avaliações dificilmente permitem comparações interinstitucionais, a não ser como indicadores bastante imprecisos de simpatia e satisfação.

b.4) Avaliação didático-pedagógica do ensino

Esse tipo de avaliação envolve a difícil correlação entre o domínio do conteúdo das matérias ministradas e as habilidades didático-pedagógica do professor. Compreende vários aspectos, como a relação do professor com o aluno em sala de aula, a preparação de aulas e provas, etc. A avaliação didático-pedagógica é essencialmente qualitativa, dando pouca margem a comparações e generalizações.

b.5) Avaliação de servidores técnicos e administrativos

Consiste em verificar o desempenho funcional, tendo em vista a subordinação das atividades administrativas às atividades acadêmicas. É necessário distinguir, aqui, entre os servidores técnicos especializados, que trabalham no apoio às atividades de pesquisa, laboratórios, bibliotecas, etc., e o pessoal administrativo propriamente dito. A avaliação dos técnicos especializados tem implicações diretas para a qualidade da pesquisa e da capacidade das instituições proporcionarem ensino experimental e laboratorial; a avaliação dos técnicos administrativos tem implicações para o funcionamento organizacional das instituições.

b.6) Avaliação das carreiras

O enfoque, aqui, passa da comparação entre cursos na mesma área de conhecimento para a comparação entre carreiras - sua reputação. demanda, custos e, sobretudo, os resultados que proporciona a seus formados. Os dados, em princípio não são distintos dos anteriormente referidos.

c) A política da avaliação: quem avalia?

Pelas suas implicações, pelo público e interesses que envolve, o processo de avaliação tem um importante componente político. Para que tal processo tenha efeito, é necessário não só que o trabalho seja tecnicamente bem feito, mas que seja considerado legítimo por parte significativa do sistema de ensino superior e da opinião pública relevante. Algumas respostas alternativas à questão de "quem avalia?" são as seguintes:

c.l ) Auto-avaliação. Por este processo, são as próprias instituições de ensino superior que se avaliam. As vantagens deste procedimento são os níveis de participação e aprendizagem gerados no processo, e a grande legitimidade dos resultados entre os participantes. Por outro lado, esta abordagem tende a perder de vista um aspecto central de qualquer avaliação, ou seja, o estabelecimento de padrões externos de comparação.

c.2) A avaliação governamental. As vantagens são a disponibilidade de recursos e a autoridade de que os resultados são revestidos, que é função da própria autoridade, formal e informal, de que goza a administração. A experiência demonstra, no entanto, que as informações de que dispõem as administrações dificilmente permitem conclusões satisfatórias sobre a qualidade dos cursos. Isto se deve, em parte, à qualidade nem sempre adequada dos dados; mais fundamentalmente, no entanto, informações de tipo "objetivo" normalmente obtidas por repartições governamentais são inadequadas para o tipo de resultados que se deseja. Por isto, os melhores sistemas governamentais de avaliação são os que combinam estes dados com aqueles proporcionados pela própria comunidade.

c.3) Avaliação pela comunidade. Aqui, a avaliação é feita por pessoas ligadas a profissão ou disciplina acadêmica dos cursos. Em muitos países, este tipo de avaliação é feito regularmente pelas associações profissionais e científicas, ou por órgãos governamentais e instituições de pesquisa que se valem de comissões especializadas. É um dos tipos mais satisfatórios de avaliação, ainda que sujeito a conhecidos "efeitos de halo" (quando a qualidade de alguns cursos, ou da Universidade como um todo, é generalizada para os demais cursos) e de prestígio (quando reputações, boas ou más, permanecem no tempo apesar das transformações da realidade).

c.4) Avaliações independentes. São avaliações feitas por instituições que não dependem nem do governo, nem da comunidade profissional, nem das universidades. A vantagem potencial é a isenção, decorrente do prestígio científico e técnico da instituição que realiza o trabalho. A desvantagem é a dificuldade eventual dessas instituições obterem as informações e o envolvi mento da comunidade profissional e científica no processo avaliativo.

d) Conclusão: o início de um processo

Esta análise buscou mostrar a necessidade e a complexidade técnica e política dos processos avaliativos do ensino superior. Nenhuma das metodologias acima indicada é auto-suficiente, e nenhum dos agentes mencionados pode, sozinho, se encarregar de todo o processo. É necessário, para que o ensino superior brasileiro se desenvolva e melhore seu desempenho, que a idéia de avaliação ganhe corpo entre todas as partes envolvidas e que comece a ser posta em prática sob as mais variadas formas. Será normal, neste processo, que surjam resultados distintos, que em muitos casos refletirão, simplesmente, a pluralidade de valores e perspectivas que coexistem na educação superior do País.

Por isto, a Comissão entende que deve caberá ao Conselho Federal de Educação, uma vez renovado nos termos por ela propostos, a missão de tomar a iniciativa e dar legitimidade e respeitabilidade aos processos de avaliação que venham a ser desenvolvidos. Isto não significa que o conselho deva fazer, ele mesmo, as avaliações, nem que deva desencadear ao mesmo tempo todas as alternativas aqui indicadas. Experiências ora em andamento no Ministério da Educação devem ser estimuladas e avaliadas; programas de estímulo à auto-avaliação pelas universidades devem ser estimulados; e outras iniciativas podem surgir.

O essencial é fazer com que estes trabalhos sejam desenvolvidos de diversas formas - pelo próprio Conselho, pelo Ministério da Educação, pelas universidades, por instituições e equipes independentes, e que os resultados obtidos sejam utilizados em benefício da educação superior brasileira.

7. FINANCIAMENTO DO ENSINO SUPERIOR

O ensino superior brasileiro, público e privado, caracteriza-se por uma grande heterogeneidade, que a crise econômica só fez acentuar. São múltiplos os papéis efetivamente desempenhados pelas instituições de ensino superior federais, estaduais, municipais e particulares. É preciso aprender a conviver com esta diversidade de formas e funções, extraindo-se dela o melhor proveito, sem querer forçar uniformidades institucionais. Embora a autonomia universitária seja imprescindível, ela não deve servir de motivo para a omissão do governo federal na análise da eficiência dos recursos aplicados, nem para a adoção de uma política passiva de provimento dos recursos necessários à manutenção das IES em seus baixos níveis atuais de produtividade. Na expectativa da plena aplicação da Emenda Calmon, a Comissão procurou definir os problemas de financiamento do ensino que merecem atenção prioritária, discutiu as alternativas apresentadas e formulou recomendações, sem perder de vista os objetivos maiores de democratização do acesso às instituições que preparam as elites dirigentes do País.

a) Falta de autonomia e flexibilidade administrativa do ensino superior público. Nossas instituições públicas de ensino superior, inclusive os hospitais de ensino, têm padecido do mesmo mal sofrido pelas demais organizações de serviço público: seu corpo administrativo tem sido estimulado a pautar sua conduta por normas e rotinas impostas de fora para dentro. Tudo o que lhes tem sido cobrado diz respeito ao cumprimento de formalidades, e nada ou quase nada é cobrado quanto à obtenção de resultados, dentro de políticas ou objetivos mais amplos. Como conseqüência, não há incentivo nem à criatividade e à ação inovadora, nem ao bom desempenho operacional. Se, por exemplo, uma universidade aumenta sua captação de recursos próprios, parcela correspondente de recursos do Tesouro lhe é subtraída a título de economia, inutilizando seus esforços por recursos adicionais. As instituições particulares e municipais dedicadas à educação superior exibem níveis de custos por aluno e relações professor em exercício/alunos matriculados bem inferiores aos das instituições públicas federais e estaduais. Decerto não é possível avaliar a qualidade do ensino por tais parâmetros. Vários outros fatores devem ser considerados. Entre eles, a infra-estrutura de serviços para professores, alunos e funcionários, que existe nas instituições públicas federais e estaduais, mas freqüentemente inexiste nas escolas particulares isoladas..

A Comissão observou, ainda, uma grande disparidade de custo por aluno entre as instituições federais de ensino superior, bem como a necessidade da adoção de critérios mais objetivos para as dotações orçamentárias. As atuais formas de alocação de recursos, por meio de critérios incrementalistas e de uma política de fato consumado, fomentam as distorções acumuladas ao longo dos anos, premiando às administrações menos eficientes. Por causa da visão limitada das antigas Inspetorias Gerais de Finanças e das atuais CISETS, os orçamentos das instituições de ensino federais deixaram de ser um instrumento útil para o planejamento e a análise de custo-benefício, tornando- se meros mecanismos de controle contábil. Por tudo isso, a Comissão apresenta as seguintes propostas:

(i) Ativação de uma sistemática de orçamento por centros de custos, com identificação de funções e programas, para permitir, em nível decisório central, a visualização das ações desenvolvidas nas unidades e escolas superiores, e para possibilitar às próprias administrações das instituições uma percepção adequada das atividades que desenvolvem.

(ii) Concessão de autonomia financeira, condicionada a um maior comprometimento com padrões de qualidade e produtividade Um dos caminhos para o redimensionamento das verbas do governo para o ensino seria o estabelecimento de módulos padrões de custo. A partir das práticas de instituições públicas ou privadas de excelência, seriam estabelecidos custos máximos admissíveis nas diversas funções e programas. Unidades e instituições que superassem esses custos deveriam adequar-se aos mesmos num prazo não inferior a dois exercícios financeiros, a fim de poderem continuar a utilizar o dinheiro do contribuinte em suas atividades. Atingidos os padrões de custo, as unidades e instituições teriam toda a liberdade de utilizar como bem entendessem o dinheiro economizado. A excelência, portanto, deve ser um pré-requisito para a autonomia.

(iii) Grande parte das instituições federais de ensino superior dispõe de uma infra-estrutura docente e administrativa capaz de absorver e sustentar uma maior oferta de vagas, com redução das exageradas relações professor/aluno hoje existentes. A partir de uma decisão política, uma razoável expansão poderia ser implantada em certas áreas, desde que ocorra um aporte maior de recursos para outros custeios e ítens específicos de capital, com melhor aproveitamento do pessoal docente existente.

(iv) Expansão do crédito educativo, de forma a democratizar o acesso às instituições responsáveis pela formação das elites dirigentes do País.

(v) Transferencia de ações das empresas estatais rentáveis para universidades públicas selecionadas, a fim de dar maior liberdade orçamentária aos centros de excelência. Devem-se criar regras limitando severamente a venda dessas ações pelas Universidades, permitindo-se, entretanto, a livre utilização dos dividendos recebidos.

(vi) Revisão da legislação que permite às empresas privadas deduzir, do lucro tributável, o dobro dos seus gastos com programas de treinamento de seus empregados. Este benefício fiscal, condicionado à participação de universidade credenciada como executora e fiscalizadora, deveria ser estendido a convênios universidade/empresa para a realização de pesquisas. Dever-se-ia, também, permitir às empresas doar um percentual do imposto à pagar a instituições de ensino superior selecionadas.

b) Inexistência de incentivos à pesquisa e à prestação de serviços

Durante a década de 70, houve um vigoroso aumento na proporção de professores em tempo integral nas universidades federais, com o objetivo de concretizar o modelo da universidade de pesquisa, inviável com professores de tempo parcial. No entanto, devido a um desvirtuamento da proposta, passou-se a remunerar um tempo que o professor passaria na universidade, além do necessário para preparar e ministrar aulas, sem que assumisse atividades de pesquisa.

Estima-se que somente um quarto da carga horária contratada dos professores de tempo integral e dedicação exclusiva é destinado às atividades de ensino. O restante do tempo seria para preparação de aulas, orientação dos alunos, atividades de pesquisa, extensão e prestação de serviço.

Muitas vezes, porém, dada a quase inexistência de atividades docentes de extensão e em face da escassa produção de pesquisa, constata-se um excesso de horas docentes contratadas mas não utilizadas na prestação de serviços na instituição (com exceção de algumas áreas, como as de saúde, tecnologia e agronomia, nas quais é freqüente a prestação de serviços sem qualquer remuneração adicional). Esta situação parece resultar da projeção errônea para o universo do ensino público brasileiro da associação ensino- pesquisa necessariamente existente em universidades de excelência. Mais de 60% dos professores das universidades federais não têm mestrado, enquanto metade dos mestres e doutores jamais publica alguma coisa. Pesquisadores não se improvisam nem se criam por decreto. Portanto, não faz sentido remunerar como pesquisadores professores que sequer receberam formação para tal.

Por isso, a Comissão apresenta as seguintes propostas:

(i) As instituições de ensino superior devem remunerar adequadamente como professores / pesquisadores e professores - prestadores de serviços os docentes que comprovadamente exerçam essas atividades. Esta remuneração consistirá num salário-base, adicionado de complementações correspondentes às atividades de pesquisa e de prestação de serviços. Aos professores que não exerçam atividades de pesquisa e de prestação de serviços, será atribuído exclusivamente o salário base.

(ii) Garantia da existência de verba para a manutenção das complementações salariais dos pesquisadores de fato, dos professores prestadores-de-serviços e do pessoal técnico-administrativo de apoio altamente qualificado. Ademais, os recursos que possibilitem a pesquisa e a prestação de serviços devem ser também garantidos.

(iii) Criação, por emenda constitucional, de um imposto sobre a remessa de royalties e assistência técnica, com uma alíquota de 5% com arrecadação vinculada ao financiamento de pesquisa cientifica e tecnológica em instituições de excelência.

c) Inadequação das suplementações aos orçamentos

As suplementações anuais aos orçamentos das universidades visando a compensar os efeitos da inflação costumam ser aleatórias e, muitas vezes, até mesmo maiores do que o orçamento inicial. Já o financiamento dos hospitais públicos de ensino provém, essencialmente, de duas origens: os Ministérios da Educação e da Previdência e Assistência Social. O financiamento do MPAS para os hospitais de ensinos é feito mediante convênio para a prestação de serviços a previdenciários. A composição do orçamento do INAMPS, contudo, tem revelado a prioridade concedida à assistência médica privada. Como os recursos do MEC e MPAS são insuficientes, os hospitais de ensino, na sua totalidade, têm vividos em crise crônica, com surtos agudos. As verbas não crescem nem mesmo em proporção às taxas de inflação, inferiores à elevação dos custos hospitalares. Essa situação tem levado à queda dos padrões de qualidade, com sérios reflexos nas atividades assistenciais e educacionais e, até mesmo, à desativação total ou parcial de muitos hospitais por prolongados períodos.

Diante disso, a Comissão sugere:

(i) Manutenção de orçamentos atualizados, sem dependência de suplementações. Os duodécimos para custeios e capital deveriam ser corrigidos periodicamente, levando em conta a inflação correspondente e os eventuais excessos de arrecadação.

(ii) Prioridade para os hospitais de ensinos pertencentes à rede pública na composição do orçamento do INAMPS. O reajustamento das tarifas de retribuição de serviços dos hospitais de ensino, arbitrado pelos MPAS, já está sendo, em 1985, equiparado ao da rede hospitalar privada (ao contrários do que vinha sucedendo nos últimos anos). Mas é preciso ir além e, mesmo que parcialmente, repor as perdas dos hospitais da rede pública.

d) Recomendações para o apoios ao ensino privado de qualidade

A utilização dos recursos públicos em escolas particulares, a título de auxílios e subsídios, deverá privilegiar apenas as instituições de ensino de reconhecida qualidade e que se submetem a um controle social efetivo de suas atividades. No atual momento nacional, de controle generalizado de preços, a determinação das anuidades cobradas pelas instituições de ensinos superior privadas deverá ser de competência do CFE com o apoios técnico do CIP, a partir de um cálculo realista dos custos do ensino. O departamento do CIP encarregado destes cálculos terá de constituir conselhos consultivos compostos de representantes das diversas partes interessadas.

Recomenda-se a expansão do sistema de bolsas destinadas a estudantes de escolas particulares de reconhecida qualidade, segundos critérios estabelecidos pelos Conselhos Federal e Estaduais de Educação.

8. ARTICULAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR COM OS GRAUS ANTERIORES

A reforma do ensino superior não pode ser tratada isoladamente, pois depende da ampliação das oportunidades de acesso e da melhoria de qualidade dos graus que o antecedem. Manter a fragmentação entre os três graus é reforçar e repetir equívocos do passado. A democratização das IES requer, entre outras condições, que a base do sistema educacional - sobretudo nos que diz respeito à escolaridade obrigatória - seja efetivamente acessível a todos. Apesar do crescimento quantitativos do ensinos fundamental nos anos recentes, são conhecidos os dados implacáveis do número de analfabetos e semi-analfabetos ainda existentes no País. Além disso, os fenômenos da repetência e da evasão no primeiro grau continuam desalentadores.

A própria melhoria qualitativa do terceiro grau, embora dependa de medidas restritas ao seu âmbito, só poderá ser plenamente atingida quando os egressos do primeiro e segundo graus tiverem garantida a aquisição dos conhecimentos e habilidades que são pré-requisitos para o bom desempenho acadêmico no ensino superior. Todavia, a escola básica brasileira, além de seletiva e excludente, não está conseguindo assegurar ainda, nem mesmo aos que nela permanecem, o mínimo indispensável aos exercício da cidadania.

O ensino fundamental, crescendo quantitativamente, perdeu muito da sua especificidade, já que a incorporação de amplas camadas até então excluídas, concomitante à distribuição desigual de renda, forçou a escola a assumir funções de alimentação e assistência social, em detrimento de seu papel de instituição transmissora de conhecimentos. A perda de qualidade da formação dos professores, a fragmentação do currículo, o aumento de vagas à custa dos desdobramentos de períodos, a deterioração da rede física e o aviltamento tanto do salário quantos das condições de trabalho do magistério estão entre os vários fatores a destacar como responsáveis pela desastrosa situação do ensinos de primeiro e segundo graus nos País

Mesmo à minoria capaz de ultrapassar a barreira do ensino fundamental não se assegura o prosseguimento de estudos no 2 grau. Este cresceu em proporções ainda menores do que o números de egressos da escola básica, além de haver perdido sua característica de formação geral e propedêutica, sem que se tenha conseguido implementar com sucessos a proposta profissionalizante.

Torna-se urgente, portanto, a definição de uma política educacional em condições de considerar o conjunto dos problemas do ensino nos País e de aplicar medidas efetivas para universalizar o ensino obrigatório, seja superando os déficits quantitativos ainda existentes, seja promovendo uma melhoria da qualidade, que assegure a permanência por 8 anos na escola. Ao mesmo tempo, é preciso ampliar o acesso ao 2 grau e rever seu papel na estrutura do sistema de ensino do País. Sobretudo no que diz respeito à escolaridade obrigatória, são necessárias diretrizes nacionais destinadas a preservar as peculiaridades culturais regionais e, ao mesmos tempo, garantir a todos um mínimo comum de conhecimentos e habilidades necessários à formação da cidadania brasileira.

A ampliação da rede física de molde a assegurar uma jornada escolar de duração satisfatória; a regularização da trajetória escolar no 1 grau; a revisão dos conteúdos curriculares e programáticos; a melhoria do material didático; a valorização do magistérios de primeiro e segundo graus; essas medidas se incluem, com destaque, entre as muitas ações inadiáveis para o cumprimento das metas de quantidade e qualidade nos graus de ensino que antecedem o superior.

Cabe ainda lembrar que a eficácia de todas essas medidas está na estreita dependência de sua adequação às necessidades e características das camadas de mais baixa renda, na medida em que a elas pertencem os alunos atingidos pelo fracasso escolar, indicador da má qualidade do ensino tanto de primeiro quanto de segundo graus.

Ainda que não seja responsabilidade da Comissão de Reforma do Ensino Superior expressar recomendações específicas concernentes aos problemas apontados no primeiro e segundo graus e as necessárias medidas para solucioná-los, a Comissão decidiu não se omitir em relação a esses problemas. Tanto mais que parte da responsabilidade na busca e encontro das soluções cabe ao ensino superior, encarregado da formação do magistério de primeiro e segundo graus e-/ou dos professores dos futuros professores das séries iniciais da escolaridade obrigatória.

Dois fatores respondem em boa parte pela má qualidade do ensino de primeiro e segundo graus.

Por um lado, o precário domínio do conteúdo, tanto no que diz respeito à extensão quantos ao rigor, e o descompasso entre a formação específica e pedagógica dos profissionais que as IES habilitam para dar aulas nos primeiro e segundo graus; por outro, a desvalorização e o desinteresse pela profissão de professor, resultantes das más condições de trabalhos e salário, mas quase sempre reforçados pelo desprestígio e má qualidade dos cursos de formação do magistério nas IES.

Nos últimos anos, estudos e debates sobre os cursos de pedagogia e demais licenciaturas vêm sendo realizados nos País. Algumas conclusões apontam, por exemplo, para a necessidade de rever a estrutura e a duração desses cursos, visando a assegurar maior domínio dos conteúdos. Outras convergem para a divisão de trabalho na escola de primeiro e segundo graus, que há algum tempo vem sendo revista, e outras ainda se dirigem para à questão da Habilitação Magistério de 2 grau, antigo Curso Normal, como instância imprescindível para à preparação de docentes para as séries iniciais da escolaridade obrigatória (e, portanto, de capital importância na reformulação do ensinos superior).

A comunidade acadêmica, não só a da área da Educação, mas também a que compõe o currículo do primeiro e segundo graus (História, Geografia, Ciências Física e Biológica, Português e Matemática), já vem manifestando há tempos, e de diversas maneiras, preocupação com a formação do magistério. Tal preocupação diz respeito à necessidade de assegurar domínio mais extenso e rigoroso do conteúdo, bem como capacidade de dar a esse conteúdo tratamento adequado às clientelas diferenciadas do primeiro e segundo graus e compromisso com a tarefa de transmissão do conhecimento organizado à maioria da população.

Finalmente, não se pode deixar de mencionar a importância da tomada de medidas de curto prazo nos sentido de democratizar o acesso ao ensino superior, independentemente dos resultados de mais longo prazo, que decorrerão da adoção de uma política educacional para o conjunto do sistema de ensino.

Diante disso, a Comissão apresenta as seguintes sugestões:

a) Ensino de primeiro e segundo graus

(i) Universalizar o ensino básico pela garantia de acesso - quantidade - e permanência - qualidade - de todos os brasileiros, assegurando efetivamente a concretização do princípio constitucional de obrigatoriedade e gratuidade escolares de 8 anos.

(ii) Garantir recursos necessários à expansão e melhoria do ensino de 1 . e 2 graus:

- cumprindo os dispositivos da Constituição quanto aos percentuais de receita de impostos a serem aplicados no ensino;

- promovendo uma distribuição mais equânime dos tributos, para que os Estados e Municípios possam arcar com as despesas desse serviço público fundamental;

- revendo os critérios de controle de arrecadação, distribuição e aplicação do Salários Educação, de modo a dar prioridade ao ensino público;

- compatibilizando despesas de investimento com as de custeio, pois estas últimas são fundamentais para a manutenção da boa qualidade.

(iii) Promover, efetivamente, a valorização profissional do magistério de primeiro e segundo graus, adotando medidas que se encaminhem - em prazos compatíveis com as diversidades regionais - para o estabelecimentos de:

- planos de carreira nos quais sejam previstos critérios para ingresso e promoção isentos de clientelismos e de influências político-partidárias;

- estatuto capaz de assegurar jornada e regime de trabalho compatíveis com a necessidade de preparação da atividade de regência de classe e de aperfeiçoamentos profissional;

- pisos salariais dignos.

(iv) Ampliar e estimular espaços e canais de participação dos setores interessados da sociedade civil nas decisões relativas ao funcionamento e organização do sistema de ensino e das unidades escolares de primeiro e segundo graus.

(v) Traçar diretrizes nacionais para o ensino básico, capazes de garantir a formação comum sem prejuízo das diversidades regionais, e de estabelecer com clareza as tarefas específicas da escolaridade obrigatória, de modo a articular as ações relativas ao ensino propriamente dito com às ações assistenciais, garantindo-se recursos e tempos necessários a que estas últimas se realizem sem danos para o trabalho pedagógico e docente.

(vi) Ampliar as oportunidades de acesso ao 2 grau e redefinir sua identidade, de modo a assegurar a formação geral. As opções pelos cursos de formação profissional devem sempre corresponder às necessidades reais do mercado de trabalho.
 
b) Formação do professor

(i) Valorizar a formação do professor nas IES, as quais - a depender de sua estrutura própria - deverá garantir:

- no que diz respeito ao conteúdo, uma aquisição mais extensa e rigorosa, em nível de licenciatura plena;

- no que diz respeito à formação pedagógica, a aquisição de conhecimentos que permitam um tratamento metodológico do conteúdo adequado às características da clientela do primeiro e segundo graus, bem como a compreensão do papel da educação de primeiro e segundo graus;

- a adequação de seus programas às carências regionais de professores para o 1 grau, oferecendo- cursos de capacitação e aperfeiçoamento pós 2 grau e para professores leigos;

- oferta sistemática de cursos de reciclagem e aperfeiçoamento aos professores de primeiro e segundo graus em exercício.

(ii) Rever a atual estrutura dos cursos de Pedagogia, visando adequá-los à organização do trabalho pedagógico no sistema de ensino e na escola de primeiro e segundo graus, bem como à necessidade de formação de docentes para a Habilitação Magistério em nível de 2 grau (antigo Curso Normal).

(iii) Investir em programas sistemáticos de avaliação nacional do ensino de primeiro e segundo graus, levantando as experiências bem sucedidas que possam ser divulgadas e implantando mecanismos ágeis de correção de desvios, em articulação com os Governos Estaduais, Municipais e as Universidades.

(iv) Expandir os investimentos nas pesquisas educacionais, nas universidades e centros de pesquisa, assegurando a relevância dos temas e a excelência e aplicabilidade dos resultados.

(v) Investir na produção de material didático de boa qualidade e estimular a utilização de tecnologias adequadas à melhoria qualitativa do ensino de primeiro e segundo graus.
 
c) Acesso ao ensino superior

(i) Expandir a oferta de vagas nas IES públicas e implantar, quando e onde couber, cursos noturnos, levando-se em conta a necessidade de combinar a expansão quantitativa com a criação das condições para produzir qualidade e competência.

(ii) Melhorar a qualidade da formação geral do 2 grau público, a fim de dar a seus egressos melhores condições de competitividade no vestibular.
 
9. ENSINO DE GRADUAÇÃO

A Comissão reconheceu a importância do ensino de graduação, quer em seu caráter terminal, como processo de formação de recursos humanos, quer em termos acadêmicos, como etapa prévia ao nível de pós-graduação estrita ou plena.

Reputou necessário destacar, quanto à estrutura e funcionamento, a relevância dos seguintes temas:

a) Administração dos cursos

A administração dos cursos universitários, organizados no regime de Faculdade ou Escola, era matéria relativamente simples.

A reforma de 1968, prevendo a Universidade com base no sistema departamental, adotou a coordenação didática colegiada como único modelo de integração do trabalho de diferentes departamentos envolvidos na administração de um curso.

As universidades têm procurado atender à exigência legal, sem prejuízo da indispensável funcionalidade. Não há notícia, porém, de que o modelo tenha alcançado êxito significativo.

O desafio tem sido o de encontrar a fórmula apta de ação das coordenações didáticas, segundo o modelo legal de órgãos de deliberação coletiva (em virtual, mas permanente conflito de competência com os departamentos), nos quais as unidades responsáveis pela administração do curso possam manter representatividade idônea.

Em termos formais, o problema da administração dos cursos somente encontrará solução com a plena retomada da autonomia universitária, cabendo a cada instituição a liberdade de estruturação de seus cursos.

Com essa finalidade a Comissão recomenda:

(i) Que as IES, na execução de seus cursos, fortaleçam permanentemente os mecanismos integradores da ação pluridepartamental, com base na tradição de trabalho, na experiência, nas peculiaridades e no próprio estilo da instituição.

(ii) Que as universidades promovam a auto-avaliação e auto-revisão de seus programas, quanto ao sistema de administração de seus cursos;

(iii) Que as IES tenham e liberdade de adotar, em seus cursos, o sistema seriado ou o sistema de crédito.

b) Ciclo básico

Paradoxalmente, em nome da integração, a universidade emanada da reforma de 1968, terminou bastante segmentada.

Pretendeu-se prestigiar os estudos fundamentais, seja pela reunião do ensino e da pesquisa básicos em um sistema de unidades comuns a toda a universidade, seja pela instituição do chamado Primeiro Ciclo de Estudos, precedendo à etapa de formação profissional.

Na prática, porém, a artificialidade na separação dos ciclos inviabilizou a pretendida adequação do conteúdo de conhecimentos básicos às reais expectativas a conveniências de aprendizagem da parte profissional.

É altamente discutível o modelo de ciclo centralizado de estudos fundamentais, que não se harmoniza com a continuidade da execução curricular e a formação profissional dos alunos.

conseqüentemente, recomenda-se:

(i) Reavaliar o ciclo básico, buscando corrigir suas disfunções, de modo a permitir às IES, dentro de sua capacidade inventiva a de sua especificidade, a definição do próprio modelo organizacional, de acordo com o princípio da autonomia universitária.

(ii) Valorizar a formação básica dos alunos por meio das seguintes ações:

a) melhorar a preparação científica a pedagógica da equipe docente de disciplinas básicas;

b) adoção mais ampla da experimentação a da demonstração nas disciplinas que as exigirem, com a instalação e manutenção de laboratórios para tais objetivos;

c) redução de número de alunos por turmas;

d) ampliação e adequação do sistema de monitorias para as disciplinas práticas, entendendo-se este programa como suporte ao esforço de aprendizagem do estudante;

e) tratamento pedagógico da repetência escolar, admitindo-se, inclusive. a adoção de regime didático especial para o aluno repetente.

c) Estrutura departamental

A criação de departamentos como forma estrutural das universidades foi uma conseqüência da expansão dos conhecimentos e do advento da especialização. Sob a inspiração dos modelos originais germânico e norte-americano, os departamentos por toda a parte se multiplicaram.

Na universidade brasileira, a estrutura departamental, embora preexistente em alguns estatutos e regimentos, foi efetivamente adotada com o Decreto-lei n 252, de 28 de fevereiro de 1967, que declara: "O departamento será a menor fração da estrutura universitária para todos os efeitos de organização administrativa, didático-cientifica e de administração de pessoal" ( parágrafo 1 do apt. 2). A Lei n 5.540, de 28 de novembro de 1968, repete o texto, acrescentando: "e compreenderá disciplinas afins" (parágrafo 3 do art. 12). A mesma lei determina: "Fica extinta a cátedra ou cadeira na organização do ensino superior do país" (art. 33, 3. ).

Atualmente, há departamentos ligados a escolas. ou a centros, e departamentos inter-escolares, servindo a várias carreiras profissionais. Essa estrutura, na verdade, é mais ou menos inoperante. na maioria dos casos: muitos departamentos simplesmente não funcionam, quase não se reúnem, ou não decidem senão sobre assuntos meramente administrativos; não têm orçamento próprio. nem dispõem de infra-estrutura de apoio.

São inegáveis algumas vantagens da estrutura departamental, que substituiu o regime de cátedras, modificando o sistema de poder dentro da universidade e procurando torná-la mais democrática. Entre outras, citam-se: a aproximação de áreas afins de conhecimento, organizadas em disciplinas; a flexibilidade que se afirma no direito de criar, transformar ou substituir disciplinas; a reunião de recursos humanos e materiais, potencializando as possibilidades para o ensino e a pesquisa.

Entretanto, com o tempo, acentuaram-se muitos inconvenientes dessa estrutura: a tendência dos departamentos a se tornarem auto-suficientes e fechados em si mesmos; a transformação de alguns em verdadeiras super-cátedras; a falta de coordenação entre os vários departamentos, prejudicando a integração do ensino; a multiplicação excessiva de disciplinas, fragmentando o conhecimento e concorrendo para criar uma verdadeira "patologia do saber".

A multiplicação excessiva do número de departamentos dentro de uma faculdade, ou universidade, concorre para aumentar tais inconvenientes. Cresce o risco da perda da interdisciplinaridade, porque os novos departamentos surgem de disciplinas, ou divisões, que se tornam independentes. A conversão de especialidades e sub-especialidades em departamentos faz perder a base comum, conduz à fragmentação no ensino e no treinamento, à menor colaboração na pesquisa.

Recomenda-se assim:

(i) Fortalecer a estrutura departamental, sem prejuízo de outras experiências alternativas de organização estrutural das IES, de acordo com o princípio da autonomia universitária.

(ii) Atribuir aos departamentos maior poder de decisão na área de sua atuação definida em regimento, sem prejuízo da subordinação aos órgãos colegiados superiores, nos assuntos de interesse geral da instituição a nos casos de interposição de recursos.

(iii) Assegurar infra-estrutura administrativa aos departamentos e apoio financeiro aos seus programas.

(iv) Organizar os departamentos de grande porte em câmaras para assuntos de graduação, pós-graduação, pesquisa e extensão, a fim de criar condições para o desenvolvimento de seus programas.

(v) Conferir aos departamentos, além das atribuições de administração do ensino, o papel de um fórum de debates sobre temas de interesse acadêmico.
 
10. O ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO E A PESQUISA CIENTÍFICA

O ensino de pós-graduação e a pesquisa científica e tecnológica hoje desenvolvidos nas universidades brasileiras são de grande importância para o País como um todo, e para seu sistema de educação superior em particular. É na universidade que está concentrado o maior e mais qualificado contingente de pesquisadores científicos do País, e é dela que resulta grande par te da melhor pesquisa que o Brasil produz. Os programas de pós-graduação formam professores, pesquisadores e profissionais altamente qualificados, em condições de contribuir significativamente para a qualidade do ensino, da pesquisa e do trabalho especializado em todos os ramos de atividade.

A Comissão reconhece a importância do trabalho desenvolvido pela CAPES no sentido de criar e manter um sistema permanente de avaliação contínua dos programas de pós-graduação, através da utilização intensiva do sistema de revisão por pares, o qual já conquistou grande legitimidade na comunidade científica e universitária. Entre as atividades da CAPES, merecem particular relevo a condução do programa de bolsas de estudo no País e no exterior; o Programa Integrado de Capacitação de Docentes (PICD); o programa de apoio institucional aos cursos de pós-graduação; e o Programa Especial de Treinamento - PET, que visa a proporcionar bolsas de estudo para alunos de graduação, sob a supervisão de pesquisadores qualificados. A pesquisa universitária tem contado com significativo apoio do CNPq e da Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP, que a Comissão considera apropriado e indispensável.

Existe, no entanto, uma série de questões problemáticas que necessitam atendimento urgente. A Comissão identifica como prioritários os seguintes pontos, sobre os quais formula as recomendações que se seguem:

a) Pouca institucionalização da pesquisa universitária e da pós-graduação

Grande parte das pesquisas realizadas nas universidades brasileiras é mantida com recursos externos ao Ministério da Educação. O apoio externo não se limita ao financiamento de projetos de duração limitada, como seria natural, mas inclui freqüentemente a própria manutenção de parte significativa dos pesquisadores e professores dos cursos de Pós-graduação, pessoal administrativo, instalações, equipamento, materiais de pesquisa, etc. Como estes recursos externos são provisórios e sujeitos a renegociações periódicas, sua predominância cria grande instabilidade para os programas de pesquisa e pós-graduação. A instabilidade se reflete ainda nas bolsas de estudo oferecidas aos alunos de Pós-graduação, sujeitas a atrasos, depreciação de valor, e incapazes, na realidade, de proporcionar aos estudantes condições para dedicação integral a seus estudos.

Por isto a Comissão faz as seguintes recomendações:

(i) Fortalecimento e expansão das atividades da CAPES. É necessário assegurar que não se perca a rica experiência da CAPES e que seu papel de apoio à pós-graduação e pesquisa universitária se expanda. A Comissão considera que um instrumento importante para isto seria a transformação do atual Conselho Diretor em um órgão que, pela qualidade de seus membros, seja fortemente representativo da comunidade científica universitária brasileira, e conte ainda com a participação de representantes dos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia. Um Conselho Deliberativo assim reformulado aumentaria a legitimidade da CAPES e do próprio Ministério da Educação junto à comunidade científica do país, e permitiria que suas funções fossem ampliadas. Além do mais, este Conselho teria condições de dar forma e continuidade a atividades como as abaixo relacionadas, indispensáveis ao reforço do papel do Ministério da Educação no desenvolvimento científico e tecnológica do País. Alternativamente, poder-se-ia dar maior institucionalização e visibilidade à comissão formada pelos presidentes dos comitês assessores da CAPES, que já vem de fato atuando na linha sugerida acima.

(ii) Assim fortalecida, a CAPES deveria receber recursos substanciais para o apoio institucional a programas de pós-graduação e atividades de pesquisa nas universidades brasileiras, incluindo a instalação e manutenção de laboratórios, bibliotecas especializadas, infra-estrutura técnica e administrativa e programas de intercâmbio nacional e internacional. Estes recursos deveriam ser proporcionados através do exame de solicitações encaminhadas pelos departamentos e institutos universitários públicos ou privados, e mantidos de forma estável. Deveriam também cobrir as atividades de pesquisa de longo prazo, que não podem depender de dotações externas eventuais. Projetos específicos de pesquisa continuariam a ser financiados pelas agências especializadas e setoriais.

(iii) Revisão do sistema de bolsas de estudos de pós- graduação no país, tratando de dar aos estudantes remuneração adequada para a dedicação efetiva ao tempo integral, apoio no período de realização dos trabalhos de tese e cobertura social correspondente à dedicação profissional aos estudos, incluindo pelo menos os benefícios da previdência social. Para os estudantes que tenham que se deslocar com sua família para outra região, as bolsas deveriam prever os custos de mudança e instalação.

b) Inexistência de sistema de mérito que incentive a pesquisa

O Ministério da Educação não possui nenhum sistema salarial de incentivo ao professor que se dedica à pesquisa científica e tecnológica. Os sistemas de tempo integral e dedicação exclusiva, que tinham este objetivo, terminaram sendo absorvidos como parte do salário de um grande número de professores para os quais a atividade de pesquisa é inexistente, secundária ou incidental. O sistema de promoções de professores nos quadros funcionais das universidades se rege por critérios que não se baseiam necessariamente no desempenho acadêmico e científico dos professores.

Por isto, a Comissão apresenta às seguintes sugestões:

(i) Manter e aperfeiçoar o sistema de avaliação por pares, tratando de assegurar:

- a seleção dos membros de comitês assessores e outros grupos consultivos, mediante princípios estritos de competência e probidade, procurando além disto atender à critérios de representatividade das diversas especialidades, regiões e tipos de instituição que participam de cada área de conhecimento.

- a divulgação do máximo de informações quanto aos mecanismos de indicação e aos nomes que compõem estas comissões. Cada programa, projeto ou pesquisador avaliado deve ter o direito de conhecer a comissão responsável, e qual o resultado desta avaliação. Tanto quanto possível, os critérios e às razões utilizadas devem ser explicitados.

- o aperfeiçoamento contínuo dos sistemas de indicadores, de maneira a proporcionar o máximo de fundamentação objetiva aos processos avaliativos.

- o direito de recurso quanto a avaliações consideradas inadequadas.

- a unificação nacional dos padrões de avaliação da pós-graduação e da pesquisa e sua elevação progressiva, a fim de garantir, cada vez mais, a excelência sem a qual este tipo de trabalho não se justifica.

(ii) Dar especial atenção às atividades de pesquisa realizadas por grupos emergentes e fora dos grandes centros universitários, mediante mecanismos tais como:

- seleção criteriosa dos grupos emergentes, por mecanismos de avaliação por pares;

- identificação de vocações e especializações regionais;

- criação de formas (incluindo os semestres sabáticos) que permitam a professores pesquisadores de centros estabelecidos passar períodos significativos em centros emergentes, e vice- versa;

- estímulo e recursos para projetos de pesquisa colaborativos entre professores e pesquisadores de nível distinto de amadurecimento.

d) Ligações entre a pesquisa e a realidade econômica e social do País

Apesar do grande interesse e motivação reiteradamente manifestados pelos pesquisadores universitários em colocar os produtos de seu trabalho a serviço da sociedade e da economia do País, existem poucos mecanismos adequados para fazer com que os conhecimentos desenvolvidos nas universidades tenham efetivamente utilização mais ampla. Na realidade, o sistema de dedicação exclusiva dificulta a participação de professores pesquisadores em trabalhos ligados à atividade produtiva ou ao serviço público. A conseqüência é que estas atividades terminam por ser executadas através de subterfúgios semi-legais, e sem a participação dos que deveriam ser o esteio do sistema, ou seja, os mais competentes e os mais éticos.

Por isto, a Comissão apresenta as seguintes sugestões:

(i) Criação de mecanismos jurídicos que permitam o estabelecimento de instituições intermediárias e acordos de colaboração permanentes entre instituições universitárias e o Estado, o setor produtivo e outras instituições socialmente relevantes tendo em vista à efetiva transferência de conhecimentos.

(ii) Estabelecimento de formas permanentes de colaboração entre as universidades brasileiras e os Ministérios da Indústria e Comércio e da Ciência e Tecnologia, e, mais particularmente, com os institutos do CNPq.

(iii) Estas formas de cooperação com a sociedade não devem, de nenhuma forma, ser entendidas como eximindo o governo, e o Ministério da Educação em particular, da responsabilidade pela manutenção do ensino de pós-graduação e da pesquisa básica que se realiza nas instituições universitárias brasileiras.

e) Dificuldades no relacionamento entre pesquisa, pós-graduação e graduação

O relacionamento da pesquisa e da pós-graduação com os cursos de graduação das universidades é freqüentemente problemático. Em muitos casos, a combinação entre as dificuldades de funcionamento dos cursos de graduação e as facilidades de obtenção de recursos externos para os programas de pós-graduação leva a que estes últimos se isolem do restante da universidade, contribuindo desta forma para aumentar ainda mais seus problemas.

A ênfase dada nos últimos anos à pesquisa em todo o sistema de educação superior, e o sistema de incentivos a ela associado, teve como conseqüência não esperada a proliferação de programas de pós-graduação e pesquisa de qualidade duvidosa, ao mesmo tempo em que eram desvalorizadas as atividades mais estritamente pedagógicas e de formação profissional. A ênfase quase exclusiva posta nos aspectos científicos dos programas de pós-graduação acarreta, em muitos casos, desvirtuamento das tarefas de formação em disciplinas voltadas primordialmente para atividades profissionais e aplicadas. Este problema afeta, por exemplo, a área da medicina, com a perda de prestígio da residência médica, bem como a outras áreas predominantemente profissionais (engenharia, ciências sociais aplicadas, direito, etc.).

Por isto, a Comissão sugere que os vínculos entre os programas de pós-graduação e pesquisa e os cursos de graduação sejam reforçados. O envolvimento de professores de pós-graduação e pesquisadores no ensino de graduação é sempre positivo e deve ser incentivado, ainda que não possa ser imposto de forma burocrática. Mecanismos para aprofundar estes vínculos podem ser sugeridos, entre os quais:

(i) Expansão gradativa do Programa Especial de Treinamento (PET), a partir de uma avaliação cuidadosa, pela CAPES, da experiência acumulada nos últimos anos. Este programa, de apoio a estudantes de graduação com potencial para a pesquisa, não deve ser confundido com outros sistemas de estágios e bolsas de estudo de graduação que o Ministério da Educação possa ter.

(ii) Implantação, pelas universidades, de mecanismos de auto-avaliação de suas atividades de pesquisa e ensino, aumentando desta forma o envolvimento dos pesquisadores com suas instituições.

(iii) Criação de programas intensivos de atualização para professores de graduação. a cargo de professores pesquisadores de todo o País.

(iv) Incentivo, fortalecimento e valorização dos programas de pós-graduação de cunho profissional e de formação para o magistério, buscando-se desenvolver modelos igualmente

prestigiados, mas alternativos aos mestrados e doutorados de pesquisa hoje predominantes.
 
11. CORPO DOCENTE

O padrão de excelência de uma instituição de ensino superior repousa substancialmente na qualidade de seu corpo docente e em sua continuada dedicação aos misteres do ensino e da pesquisa, bem como às atividades de extensão.

Pará tanto, impõe-se garantir aos professores a segurança de uma carreira acadêmica estável e de uma remuneração condigna, à par de condições de constante aperfeiçoamento profissional e cultural, que fortaleça o princípio da competência e a atualização científica.

Devem, ainda, as instituições, em seu planejamento financeiro, destinar recursos específicos para o aprimoramento científico e pedagógico dos seus professores.

Por último, cumpre estimular os processos de avaliação do trabalho docente, mediante parâmetros fundados tanto nas atividades de magistério quanto na produção científica e cultural dos professores.

Visando a consecução desses objetivos, a Comissão recomenda as seguintes medidas de apoio ao corpo docente:

a) Situação funcional e regime de trabalho

(i) As instituições de ensino superior, tanto públicas como privadas, devem estabelecer e manter planos de carreira do magistério, escalonados em categorias, com atribuições e responsabilidades definidas, especificando-se a qualificação necessária tanto para o ingresso como para a ascensão aos níveis superiores, que não poderá ter como requisito exclusivo ou predominante o tempo de serviço. Excepcionalmente, poderão ser admitidos professores que não integrem a carreira para atendimento de necessidades especiais ou transitórias do ensino ou da pesquisa.

(ii) O ingresso na carreira - que pode se dar em qualquer nível - e o acesso ao posto máximo devem ser obrigatoriamente precedidos de habilitação em concurso público de provas e títulos. Nos critérios de ascensão funcional, devem ser valorizados, além da titulação pós-graduada, a produção científica, a participação nas atividades de ensino, pesquisa e extensão, e a experiência na administração acadêmica.

(iii) O pessoal docente das instituições de ensino superior federais deve se submeter a um regime jurídico próprio, que não se confunda com o do funcionalismo público em geral.

(iv) Tendo-se em vista a aspiração manifestada em setores da comunidade acadêmica, é aconselhável que o Ministério da Educação promova consultas e estudos que avaliem a conveniência de uma política de unificação dos planos de carreira e dos níveis salariais nas instituições de ensino superior federais, ressalvada a autonomia universitária e a liberdade de cada instituição para prover às suas peculiaridades.

(v) É importante, porém, que a legislação estabeleça um piso salarial a ser obedecido, tanto pelas IES públicas como pelas particulares, em seus planos de classificação e salários dos professores. nos quais serão especificadas as diferenciações por categorias e os incentivos funcionais que entendam conveniente adotar.

(vi) O regime de dedicação exclusiva deve ser preferencialmente adotado para os integrantes da carreira, sendo também admissível o tempo parcial, igualmente aplicável a outras formas de contrato, conforme as peculiaridades de cada instituição. O sistema de pagamento por hora-aula deve ser vedado.

b) Titulação, aperfeiçoamento e avaliação do desempenho

(i) As IES devem criar condições para o aperfeiçoamento constante de seus quadros docentes, através da qualificação em cursos de pós-graduação e da capacitação em instituições no País e no exterior. O MEC deve fortalecer, por intermédio de suas agências, programas específicos de aprimoramento para docentes, tais como o PICD e o PADES.

(ii) Deve ser instituído o sistema de semestres sabáticos, segundo programas estabelecidos pelos colegiados superiores competentes e mediante aprovação, pelos departamentos, de planos de trabalho que tenham como finalidade o aprimoramento individual ou o intercâmbio científico e cultural.

(iii) Devem ser institucionalizados métodos de avaliação do desempenho dos membros do corpo docente em suas atividades de ensino, de pesquisa e de extensão, de forma a contribuir para a elevação qualitativa do trabalho acadêmico, levando-se em conta igualmente a produção científica, tecnológica, cultural ou artística dos professores.
 
12. CORPO DISCENTE

Há hoje no Brasil cerca de um milhão e meio de estudantes de nível superior. Entre eles, registram-se acentuadas diferenças no que se refere à origem social e à condição econômica.

A Comissão considera dever do Estado criar condições de apoio aos estudantes, com o objetivo de aprimorar o aproveitamento nos estudos. Programas como o do crédito educativo, para alunos da rede privada, e de ajuda de custo a estudantes do sistema público, visam a esse objetivo. Nas IES públicas, a eles se acrescem serviços de apoio, como as residências estudantis e os restaurantes a preços subsidiados.

Tais iniciativas não impedem, porem, que a assistência aos estudantes ofereça lacunas e insuficiências a serem supridas.

I. Necessidade de um órgão de apoio ao estudante de nível superior

Recomenda-se a existência, na estrutura do Ministério da Educação, de um órgão especial de coordenação das atividades de apoio aos estudantes. A extinção do Departamento de Assuntos Estudantis (DAE) e a suspensão do Programa de Bolsas do MEC dificultam uma política coerente no setor.

A Fundação de Apoio ao Estudante (FAE) atende, em parte, à finalidade exposta, mas suas atribuições abrangem apenas as faixas do pré-escolar, do 1 e do 2 graus.

Diante do exposto, a Comissão sugere:

(i) A extensão dos serviços da FAE também aos estudantes de nível superior - sem sacrifício da expansão dos serviços aos estudantes dos demais níveis - com a necessária ampliação dos recursos a ela destinados;

(ii) Fortalecimento do programa de venda de material e livros didáticos, a preços subsidiados, ampliando-se o número de produtos oferecidos e criando-se postos de venda no interior dos campi universitários.

(iii) Participação de representantes estudantis, tanto de ensino superior como de 2 grau, no Conselho Deliberativo da FAE.
 

II. Concessão de bolsas de estudos

As bolsas de estudo devem ter como objetivo o treinamento profissional do aluno em atividades pertinentes à área de sua formação, não devendo importar simples ajuda financeira.

Assim sendo, a Comissão recomenda:

(i) Instituição, com essa finalidade, de um programa nacional de bolsas, de valor adequado às necessidades reais do estudante carente, mediante atribuição de recursos especiais no orçamento do MEC.

(ii) Implantação de um programa especial de auxílio financeiro a estudantes que desejarem dedicar-se a atividades relacionadas com seus cursos. Ë semelhança das bolsas de iniciação científica do CNPq, a concessão das bolsas dependeria de aprovação, por organismo próprio da respectiva IES, de projeto ou plano de trabalho apresentado pelo aluno ou grupo de alunos. O desenvolvimento do trabalho e a avaliação de seu resultado ficarão sujeitos a verificação de docentes.

(iii) Criação, nas IES, de "banco de estágios" que habilitem os alunos a obter vagas nas empresas ou instituições públicas e privadas. As universidades devem usar sua influência, junto a tais empresas ou instituições, no sentido de assegurar uma cota mínima de estagiários.

III. Restaurantes e residências universitárias

Os restaurantes - utilizados por estudantes, funcionários e professores - prestam importante serviço à comunidade universitária. O mesmo pode ser dito das residências estudantis mantidas por IES públicas, especialmente úteis em universidades que acolhem alunos provenientes de fora. Para determinada faixa de alunos carentes, tais serviços assistenciais constituem condição imprescindível para a freqüência e o rendimento escolar.

São reconhecidas, porém, à precariedade de alguns desses serviços, tanto pela ausência de satisfatória manutenção e ampliação quanto pela insuficiência de recursos financeiros a eles atribuídos.

Em face disso, a Comissão recomenda:

(i) A alocação de recursos suficientes para o custeio de um plano nacional de recuperação e conservação de prédios de refeitórios e residências estudantis e criação desses serviços em IES públicas que ainda não os possuam.

(ii) Manutenção de um sistema de preços subsidiados e diferenciados em refeitórios, de acordo com o nível de carência dos universitários.
 
IV. Promoção do esporte, da arte e da cultura

O esporte universitário deve ter como meta o estímulo à integração, ao lazer e ao aprimoramento da condição física, e não a simples competição ou a busca de recordes. Embora a Educação Física constitua parte obrigatória dos currículos, não são freqüentes os parques e instalações esportivas que satisfaçam plenamente às suas finalidades.

conseqüentemente, a Comissão sugere:

(i) A efetiva existência, nas IES, de instalações - próprias ou objeto de convênio - que permitam a prática regular de várias modalidades esportivas.

(ii) A recuperação dos atuais parques esportivos, que se revelarem deficientes ou mal conservados.

(iii) A destinação de parcela dos recursos arrecadados pela Loteria Esportiva para o fomento do esporte universitário.

Inexiste também uma política de incentivo às atividades artísticas e culturais dos estudantes. Os eventos culturais, nas IES, são esporádicos e as potencialidades artísticas da juventude, que não participa dos cursos de arte, não são estimuladas.

Daí a Comissão recomendar:

(i) A criação de um programa nacional de incentivo às atividades culturais e artísticas dos estudantes das diversas IES. O programa deve ser de responsabilidade dos Ministérios da Educação e da Cultura, com a participação de representantes estudantis em sua coordenação.

(ii) A realização anual de um evento nacional expressivo da produção artístico-cultural dos estudantes de cada Estado, que, embora assemelhados aos Jogos Universitários Brasileiros, não tenha caráter competitivo. Sua organização deverá ser patrocinada pelos Ministérios da Educação e da Cultura, com a responsabilidade da entidade nacional representativa dos estudantes.

V. Entidades estudantis e participação discente nos colegiados nas IES

Com o reconhecimento, em lei, da União Nacional de Estudantes, de Uniões Estudantis, dos Diretórios Centrais e dos Centros Acadêmicos, foi satisfeita uma aspiração máxima dos estudantes universitários.

É mister, no entanto, que as entidades estudantis possam dispor de meios materiais, que lhes permitam o exercício adequado de suas obrigações.

Por esse motivo, a Comissão:

(i) Recomenda a inclusão, no orçamento da FAE ou do órgão incumbido, no MEC, de atender a assuntos estudantis de nível superior, de um item destinado a apoiar financeiramente encontros nacionais de estudantes, tais como o ECEM (medicina), o ENED (direito), o SNEE (engenharia) e o ENEA (arquitetura).

(ii) Sugere que as IES contribuam para a manutenção das sedes das respectivas entidades estudantis e apoiem materialmente suas realizações.

A atual legislação já prevê a participação estudantil em diversos órgãos colegiados. Entendeu a Comissão que a forma e a proporção a ser atribuída a essa representação devem ser estabelecidas pelas IES, no exercício de sua autonomia, sem especificações prévias..

Em conseqüência, a Comissão propõe a revogação do 2 do artigo 5 da Portaria Ministerial n 1.104, de 31 de outubro de 1979, que estabelece em 1/5 do total dos membros dos colegiados o número máximo de representantes estudantis.
 
13. PESSOAL TÉCNICO-ADMINISTRATIVO

A Comissão reconhece a importância de valorização do pessoal técnico-administrativo como condição de eficiência dos servidores das universidades.

O funcionamento produtivo dos laboratórios e bibliotecas, assim como de atividades complementares a que a universidade se dedique (museus, teatros, editoras e outras), reclama pessoal especializado e apto ao desempenho competente de suas funções.

De outra parte, a autonomia da Universidade pressupõe a disponibilidade de recursos humanos capazes de propiciar uma gestão eficiente de suas atividades-meio (orçamento, pessoal, material, serviços gerais), segundo os programas e objetivos a que se propõe.

A administração universitária, por sua natureza especial, exige aptidões e conhecimentos que não se confundem com os requisitos comuns da burocracia, pelo que o pessoal técnico-administrativo das universidades deve merecer tratamento legal que se compatibilize com suas peculiaridades

Por esse motivo, a Comissão considera recomendáveis as seguintes providencias com respeito ao pessoal administrativo no setor público das instituições de ensino superior:

(i) Instituição de um Estatuto próprio que estabeleça princípios e normas que, independentemente da natureza autárquica ou fundacional da instituição, faça cessar a atual discriminação entre pessoal estatutário e trabalhista.

(ii) Criação, nas universidades, como órgão de assessoramento à Reitoria, para estudos e planejamento no setor, de comissões permanentes de pessoal técnico-administrativo, com a participação de representantes dessa categoria funcional.

(iii) Implantação de sistemas de desenvolvimento de recursos humanos que atendam às necessidades dos serviços técnico-administrativos, tanto no que se refere às condições de ingresso e de progressão na carreira quanto ao estímulo para o aprimoramento pessoal e funcional desses servidores (bolsas, auxílios ou licenças para aperfeiçoamento profissional, períodos sabáticos, etc.).

(iv) Adoção de programa semelhante ao PICD, que possibilite aos servidores técnicos realizar cursos de mestrado e doutorado, em particular na área de Administração Universitária.

(v) Oferecimento de cursos de especialização e de aperfeiçoamento visando à reciclagem do pessoal técnico e administrativo de nível superior, médio e auxiliar.

(vi) Realização de cursos supletivos de primeiro e segundo graus que completem a escolaridade básica dos servidores.

(vii) Criação de sistemas de intercâmbio universitário mediante programas de estágios ou a adoção do regime de técnicos-visitantes.

(viii) Estímulo à permanência e integração dos servidores administrativos, sugerindo-se, entre outras medidas, o aumento progressivo de duração dos períodos de férias, por década de tempo de serviço.


DECLARAÇÕES DE VOTO

Voto em separado de Dom Lourenço de Almeida Prado, OSB  

Não posso subscrever o documento conclusivo de nossa Comissão, sem declarar que o faço com algumas restrições, em matéria de suma significação.

Antes, porém, de singularizar alguns pontos de divergências, quero exprimir o meu aplauso à síntese realizada pelo redator da exposição introdutória que, de maneira séria e honesta, conseguiu, compendiando tudo o que foi dito, debatido e aprovado pelo grupo, dar unidade e corpo ao nosso trabalho. Tratando-se de uma elaboração em grupo, cada um de nós gostaria, certamente, de ter uma formulação mais afinada com o seu pensamento próprio. De minha parte, como fiz sentir desde a reunião inicial, gostaria que tivéssemos partido de uma visão global do ensino superior, com a definição de suas tarefas e objetivos, seguida de uma indicação dos diversos tipos de instituições, que o integram, para examinar, depois disso, os diversos problemas e aspectos particulares. O aplauso à Introdução fundamenta-se no reconhecimento de que ela conseguiu recolher tudo que examinamos, dando-lhe ordem e corpo.

Passando às divergências, elas se tornam mais vivas em relação a algumas recomendações específicas, cuja filosofia subjacente, como exprimi em trabalho apresentado à Subcomissão especifica - "Democratização do Ensino e Conexão do primeiro e segundo graus com o terceiro. " - não acompanho. Essas discordâncias se concretizam:

1. No uso meio equívoco do verbo democratizar e seus derivados, confundindo votar com participar, condicionando a liberdade democrática a uma interferência igualitarista de todos os segmentos na formação do governo e órgãos do governo, o que redunda num grau de comunitarismo ou assembleísmo, cuja conseqüência é, a meu ver, instabilizar a autoridade, sem lucro para a vida livre da pessoa humana, objetivo fundamental de uma sociedade democrática.

2. Essa tendência manifesta-se mais fortemente quando se sugerem "procedimentos que deverão garantir a participação das várias categorias que compõem a comunidade universitária" para a escolha dos dirigentes tanto nas universidades públicas quanto nas privadas. Ora a significação peculiar da livre iniciativa em Educação está em ser a oferta de uma proposta educacional por parte de um grupo que não é, como o Estado, sujeito da obrigação de dar escola. Essa oferta pode ser aceita ou recusada pelos possíveis candidatos, mas não pode ser desviada do objetivo fixado ao instituir-se.

3. A matéria retorna no capítulo sobre "Ensino Público e Ensino Privado", quando se pretende uma "autonomia" da escola em relação à mantenedora, fazendo-se menção explícita das escolas confessionais, cuja "filosofia" (entre aspas no texto) poderia criar dificuldades. A Comunidade acadêmica teria o direito de inverter ou subverter essa filosofia: ter-se-ia uma universidade católica fundada e mantida pela comunidade católica, conduzida a ensinar marxismo ou coisa semelhante. é a própria negação da iniciativa livre.

4. Nesse contexto, no que concerne à aplicação do dinheiro público na iniciativa privada é, a nosso ver, estatizante a idéia de que essa aplicação é apenas uma concessão tolerável e, ainda mais, geradora da dependência. A colocação identifica Estado e Sociedade Civil. O Estado é uma parte desta, parte encarregada do governo. O dinheiro não é do Estado, mas do público. O emprego do dinheiro em Educação - bolsa ou apoio à escola privada - é a entrega do dinheiro ao seu dono, é um serviço devido pelo Estado administrador a quem lhe pertence. O dinheiro público empregado numa escola que o público deseja, pública ou particular, não é favorecimento paternalista. O Estado deve a escola e a variedade escolar.

5. Discordo também da feição que se quer dar ao Conselho Federal de Educação, que nos termos propostos passa a ser um órgão quase exclusivo do ensino superior. Discordo, também, do caminho eleitoral fixado para a escolha de seus membros. Além de não conseguir ser representativo, parece-me quase inviável. Meu voto é por um Conselho Federal como órgão universal de Educação.

Concluindo, reconheço que minhas restrições ou, até oposições a sugestões do documento não puderam ser formuladas em votos mais precisos, porque o tipo do documento (Relatório) não facilita esse tipo de pronunciamento. Creio ter sido claro quanto possível, sem exagerar demais o uso do espaço.

Voto em separado de Eduardo de Lamônica Freire, Fernando Jorge Lessa Sarmento, Jair Pereira dos Santos, Amílcar Alves Tupiassu, Francisco Javier Alfaya, Carlos Nelson Coutinho, Marly Moisés Silva Araújo, Clementino Fraga Filho

Política e Organização do corpo docente e técnico-administrativo

É indiscutível que a questão de valorização do servidor universitário - quer docente, quer técnico-administrativo - é importante condição para assegurar a melhoria da qualidade dos programas de ensino, pesquisa e extensão desenvolvidos pelas IES, tanto públicas como privadas.

A inexistência de um tratamento eqüitativo para todas as IES federais, autárquicas e fundacionais, no que se refere às carreiras docente e técnico-administrativa, além de injusta, provoca instabilidade nas relações de trabalho, refletindo-se na baixa produtividade desses servidores e em freqüentes crises que sempre deságuam em reivindicações de equivalência. Esta situação agrava-se, sobretudo, no âmbito das IES fundacionais; há pouca identidade entre elas no que se relaciona a esta questão e as diferenças observadas ocorreram de maneira aleatória e sem critério .

Na questão do Plano de Carreira, insere-se a delicada situação dos salários desses servidores universitários. Além da desigualdade existente entre os salários dos servidores autárquicos e fundacionais, há uma discriminatória diferenciação dos salários pagos por estas últimas entre si.

O estabelecimento da isonomia salarial para os cargos existentes nas IES federais, a partir de pisos a serem estabelecidos em cada classe da carreira, longe de ferir o principio da autonomia universitária (que só será alcançado pelo exercício de responsabilidade social e da competência da instituição) reforça um dos pilares do direito trabalhista definido na legislação, o qual assegura que, por meio de uma mesma fonte pagadora, deve atribuir-se salário equivalente para o mesmo trabalho.

O prestigiamento do mérito pode ser reforçado não só pela sua contemplação no bojo do Plano de Cargos e Salários, no que se refira a critérios de promoção, como pela concessão de incentivos salariais diferenciadores para aqueles servidores que contribuam, efetivamente, para o desenvolvimento científico, tecnológico, artístico e cultural das IES.

No que se refere à dignidade profissional dos docentes de IES estaduais, municipais e privadas, é inconcebível que uma grande parte destes professores sejam tratados à margem do quadro funcional permanente dessas instituições, percebendo retribuições por hora-aula ministrada.

Recomendações:

a) No que se refere ao Quadro Docente

- Todas as IES deverão possuir um plano nacional de carreira, compreendendo classes iniciais e terminais comuns às IES públicas e particulares. Será facultado às IES estaduais, municipais e particulares, respeitadas as classes comuns, incluir subclasses ou outras classes intermediárias nos seus planos de carreira. Todas as IES federais deverão possuir um plano único, válido para todo o país.

- O ingresso do docente, tanto na carreira inicial quanto na terminal, nas IES públicas e nas particulares, será feito apenas por concurso público de provas e títulos, cujo regulamento será definido pelas instituições.

- As IES, tanto públicas quanto particulares, deverão ter autonomia para estabelecer os critérios de ascensão de uma para outra classe. Na determinação dos critérios de ascensão funcional, as IES deverão considerar, além da titulação dos docentes, também a sua produção intelectual, suas atividades didáticas, de pesquisa, de extensão e coordenação e administração de ensino. O tempo de serviço não deverá ser incluído entre esses critérios.

- O corpo docente das IES será constituído pelos professores integrantes da carreira de magistério e, complementarmente e por tempo limitado, por professores não integrantes da carreira de magistério, substitutos, conferencistas, consultores ou visitantes. Nas IES federais, os professores integrantes da carreira de magistério deverão ser contratados de acordo com o regime de 20 horas semanais de trabalho ou o de dedicação exclusiva. Quanto ao regime de 40 horas deverá ser revisto, consideradas as peculiaridades de cada instituição e das diversas áreas de conhecimento que as compõem. Os professores não integrantes da carreira de magistério poderão ser contratados por 12 ou 20 horas semanais ou dedicação exclusiva.

- Serão considerados no estabelecimento dos salários dos docentes: (a) a classe; (b) o tempo de serviço; e (c) o regime de trabalho. Para a classe inicial, deverá ser fixado um piso nacional, obrigatório para todas as IES, públicas ou particulares. As IES federais terão um patamar único nacional para cada classe, por regime de trabalho, a que se acrescentará percentual único por tempo de serviço e incentivos de produção científica, tecnológica, artística e cultural, cujos critérios de concessão serão definidos através de parâmetros a serem estabelecidos pelos Conselhos de Ensino e Pesquisa, ou assemelhados, de cada IES.

b) No que se refere ao Quadro técnico-administrativo.

- Instituir um plano único de cargos e salários para todas as Universidades federais, de modo a garantir um piso salarial digno, a isonomia salarial, e a oferecer maiores possibilidades de movimentação de pessoal;

- Recomendar às IES que busquem, através de seus estatutos e regimentos, prestigiar o pessoal com formação especializada, particularmente nas áreas de planejamento Universitário, Administração Acadêmica, Relações com Estudantes, Administração de Pesquisa e Administração de Atividades de Extensão, buscando o preenchimento de Cargos e Funções na área administrativa e de Planejamento da Administração Superior da Universidade, preferencialmente com servidores qualificados.

- Estimular as IES a criarem, no corpo dos regulamentos da política do pessoal técnico-administrativo, instrumentos de avaliação que busquem premiar e incrementar a qualidade do desempenho funcional e a responsabilidade do compromisso assumido com a instituição.

- Desvincular do Ministério da Administração a política de pessoal das universidades, vinculando-a ao MEC.

Voto em separado de Paulo Rosas.

Subsídios para uma nova política de carreira do pessoal docente das IES

A) Considerações sobre o Programa

1. As universidades devem ter autonomia para organizar e dirigir seus cursos, decidir e dar cumprimento a seus programas de pesquisa e de extensão, decidir quanto à utilização dos recursos orçamentários disponíveis e à captação de recursos de outras fontes que a comunidade acadêmica considerar de interesse para a instituição. Em suma, administrar-se a si mesmas, sem a tutela dos que as não conhecem nem vivem seus problemas no dia-a-dia.

No momento presente é igualmente necessário que se instaure e se estabilize o processo de democratização interna nas IES, de modo que os três segmentos da comunidade (professores, estudantes e servidores técnico-administrativos) participem concretamente, não apenas da escolha de seus dirigentes mas, por meio de colegiados próprios e legítimos, das decisões coletivas que devem servir de base para a prática dos executivos. Que todos tenham acesso à informação. E que a democratização interna seja acompanhada do exercício pelas IES de sua função social; do reconhecimento de lhes caber parte da responsabilidade pela qualidade do ensino de priimeiro e segundo graus e, portanto, pelo nível dos alunos que as alcançam; da aceitação de ser legítimo que a sociedade possa avaliar e controlar seus resultados, a partir do conhecimento público de suas práticas.

Contudo, a autonomia e a democratização devem ser exercidas em referência a um certo número de "normas mínimas ordenadoras", objeto de legislação específica, que assegure a unidade de estrutura do ensino superior, a nível nacional. Não será substituindo uma estrutura rígida e autoritária por uma nova estrutura, "tão rígida e autoritária quanto a precedente", apenas de modelo diferente, que se estará em bom caminho para proporcionar ao ensino superior brasileiro os meios de superação de suas atuais insuficiências. Mas é preciso estar atento para que a idéia de autonomia não oculte, no fundo, um novo estilo de liberalismo. Um "Laissez faire, laissez passer" enganador, que somente favoreceria aos que já detém força e poder, estiolando em seu nascedouro a criatividade dos que não contam com os mesmos recursos.

Longe de representar igualdade de oportunidade, um liberalismo tal agravaria as diferenças, acentuaria as distâncias, comprometeria o projeto de uma nova política para o ensino superior brasileiro, liberando o Governo de qualquer responsabilidade ou mesmo co-responsabilidade pelo êxito ou fracasso do processo.

Sem afetar a autonomia que legitimamente deve ser praticada no interior das IES, nem o processo de democratização interna, sem o qual a autonomia é uma ilusão, mas recusando a falsa autonomia do liberalismo, defendemos que a definição de uma política de carreira e valorização do pessoal docente terá necessariamente de se apoiar em um conjunto de normas nacionais, mínimas para não comprometer a especificidade de cada experiência mas suficientes para reduzir a desigualdade de oportunidade de crescimento pessoal de cada docente, independentemente da localização no mapa da instituição a que se vincule.

Por conseguinte, que legislação específica estabeleça normas ordenadoras de uma carreira única para o pessoal docente das IES, em particular dos que integram as entidades federais. Daí nossa divergência da maioria dos membros da Comissão instituída pelo Excelentíssimo Senhor Presidente da República, para propor subsídios para uma nova política do ensino superior brasileiro. E a decisão de apresentarmos, como o fazemos por meio desta proposta, um voto em separado sobre a matéria.

2. Em todos os países desenvolvidos, há centros de formação universitária e de pesquisa cientifica que se salientam e se impõem nacional ou internacionalmente, pela qualidade de sua produção intelectual ou de sua ação pedagógica. São "centros de excelência" em áreas específicas do saber ou da criação artística, em suas diversas modalidades.

3. No caso brasileiro e no momento atual, não há porque inibir o florescimento desses centros, onde quer que se constituam e seja qual for a área que focalizem, sem prejuízo das prioridades nacionais. Muito ao contrário. é legitimo que os grupos que já comprovaram seu potencial acadêmico, tanto no que tange à qualidade do ensino, quanto da pesquisa, da criatividade, da extensão, recebam apoio necessário a seu crescimento constante .

Não obstante, seria um equívoco julgar que o deplorável estado em que se encontra o ensino superior brasileiro poderia ser superado com a concentração dos recursos disponíveis, humanos, materiais e financeiros, em beneficio exclusivamente daqueles centros e o conseqüente sacrifício dos que se encontram fora do círculo de exceção. Que o favorecimento dos que já comprovaram ter mérito não represente obstáculo ao surgimento e à afirmação dos que, por qualquer motivo, ainda não puderam comprovar o mérito que possuem. Que se assegure a todos os centros, independentemente da região em que acaso estejam localizados, e da área do conhecimento que tratem, igualdade de condições quanto ao acesso aos meios que possibilitem sua emergência e desenvolvimento .

Isto já foi de certo modo admitido pela Comissão. Mas entendemos que a igualdade de oportunidades deve ir mais longe do que a concessão de auxílios suplementares a casos individuais ou a grupos. Deve partir de um plano de carreira com referências nacionais uniformes e, no caso das IES federais, de um plano único de carreira e de uma política salarial também única, isonômica para categorias docentes equivalentes em todo o país.

4. é certamente um erro atribuir-se aos percalços da carreira e do salário do pessoal docente - e também do pessoal técnico-administrativo - a causa única das deficiências das IES.

Mas é pelo menos ingênuo subestimar os efeitos psicológicos, a desestimulação decorrente da ausência de uma política de pessoal que valorize efetivamente o trabalho acadêmico.

A questão é complexa. Ha nuanças que distinguem o contrato que vincula o professor às IES públicas (federais, estaduais, municipais) e às IES particulares. E é preciso estabelecer as devidas distinções e interrelações entre a carreira e o salário.

Sem descermos a pormenores que extrapolariam a finalidade desta Comissão, apresentaremos a seguir duas séries de recomendações. A primeira concerne à constituição do corpo docente das IES, princípios normatizadores da carreira, ingresso e ascensão funcional. A segunda, à política salarial. Nos dois casos, sempre distinguindo o que deve ser aplicado em comum a todas as IES e o que deve caber especificamente às instituições federais, estaduais, municipais e particulares.

B) Recomendações

Bl) Quanto à política de carreira docente

a) O corpo docente das IES deve ser constituído pelos professores integrantes da carreira de magistério e, complementarmente e por tempo limitado, por professores visitantes, não integrantes da carreira de magistério. Nas IES federais, os professores integrantes da carreira de magistério deverão ser contratados de acordo com o regime de 20 horas semanais de trabalho ou de dedicação exclusiva. Os professores não integrantes da carreira de magistério poderão ser contratados por 12 ou 20 horas semanais de trabalho ou de dedicação exclusiva. Os docentes vinculados às IES estaduais, municipais ou particulares poderão ser contratados de acordo cor diferentes regimes, vedando-se, contudo, a contratação por hora-aula.

b) Que todas as IES se submetam a um plano nacional de carreira, compreendendo classes inicial e terminal comuns às IES públicas e particulares. As IES federais, tanto fundacionais quanto autárquicas, deverão submeter-se a um plano único, com classes e nomenclaturas uniformes, válido para todo o país.

c) No estabelecimento da carreira docente, tanto nas IES federais, quanto nas estaduais, municipais e particulares, respeitadas as peculiaridades de cada uma, serão claramente definidas as atribuições comuns a todas as classes e as específicas de cada uma em particular, em especial no que concerne à pesquisa. Entretanto, nenhum docente integrante da carreira de magistério, independentemente da classe que ocupe, deverá ter cerceado seu direito de participar concretamente da administração acadêmica, seja como representante de sua categoria, se para tanto for eleito por seus pares, seja no exercício de cargo executivo, de acordo com o que determinar o Estatuto da entidade que integre.

d) O ingresso na carreira docente, tanto nas IES públicas quanto nas particulares, será feito apenas por concurso público. Admite-se que esse ingresso poderá se dar em qualquer classe da carreira, de acordo com as exigências de titulação e qualificação do candidato. As IES terão autonomia para decidirem quanto à forma de realização dos concursos.

e) Tanto as IES públicas quanto as particulares deverão ter autonomia para estabelecerem os critérios de ascensão de uma para outra classe. Na determinação dos critérios de ascensão funcional, que as IES considerem não apenas a titulação dos docentes, mas primordialmente sua produção intelectual, suas atividades didáticas, de pesquisa, de extensão e de administração acadêmica, todas elas concretamente valorizadas. Em nenhum caso, entretanto, o tempo de serviço poderá ser incluído entre esses critérios.

B2) Quanto à política salarial

a) No estabelecimento dos salários dos docentes, que sejam considerados: a) a classe; b) o tempo ele serviço; c) o regime de trabalho. Para as classes inicial e terminal deverá ser fixado um piso nacional, obrigatório como valor salarial mínimo para todas as IES, públicas ou particulares.

b) No que se refere especificamente às IES federais:

- Deverá ser instituída a isonomia salarial. Todas as IES federais, tanto fundacionais quanto autárquicas, terão um patamar salarial único nacional para cada classe, por regime de trabalho, a que se acrescentará percentual também único por tempo de serviço.

- Legislação própria deverá definir com clareza os casos em que os docentes contratados em regime de dedicação exclusiva poderão perceber proventos de outras fontes, tais como: (a) direitos autorais; (b) direitos de reprodução industrial por descobertas ou inventos; (c) gratificações, jetons ou cachês pela realização de conferências, bem como pela participação de atividades artísticas, desde que promovidas por organizações diferentes daquela a que se encontrem vinculados; d) gratificações pelo exercício de cargos de direção acadêmica; (e) gratificações ou jetons pela participação de conselhos ou colegiados externos à entidade que integrem; (f) ou ainda pela participação de programas desenvolvidos em colaboração ou convênio entre a entidade e outras organizações, conforme recomendações d 1, 2, 3, já aprovadas pela Comissão quanto à pesquisa e à pós-graduação.

- O MEC deverá estabelecer mecanismos próprios ou em cooperação com a Receita Federal, com a finalidade de garantir o cumprimento das restrições impostas pela dedicação exclusiva.

- O MEC deverá estabelecer mecanismos que permitam aos atuais ocupantes de cargos docentes contratados conforme os regimes de 20 horas, tempo integral (40 horas) e dedicação exclusiva, sem prejuízo das direitos contratuais adquiridos, optarem por um dos regimes aqui propostos: 20 horas semanais de trabalho ou dedicação exclusiva. Serão igualmente estabelecidos pelo MEC mecanismos que garantam compatibilização entre os direitos adquiridos pelos docentes que acumulem cargos na própria universidade ou fora dela e os regime s de trabalho que lhes serão oferecidos.

- A isonomia salarial proposta para os docentes deverá igualmente beneficiar os servidores técnico-administrativos vinculados às IES federais, tanto autárquicas quanto fundacionais.

- Na definição da política salarial dos docentes das IES federais, tanto quanto dos servidores técnico-administrativos, deverá ser assegurada sua aposentadoria integral.
 

Voto em separado de Romeu Ritter dos Reis.

1) universidades e IES Isoladas

Infundada e leonina é a sugestão de submeter as IES isoladas a um "mandato universitário", o que elidiria de todo a autonomia tio insistentemente apregoada e defendida no seio da Comissão .

É patente a inadequação das conclusões e propostas subsumidas no item relativo a "universidades e instituições isoladas de Ensino" .

O documento, neste aspecto, desconhece as determinantes que condicionaram, até mesmo no âmbito do ensino público, a existência de estabelecimentos de ensino superior isolados, antes mesmo do surgimento da universidade brasileira, que imerge apenas no século XX. Peculiaridade brasileira, eis que a colonização hispânica transplanta a Universidade para as suas nascentes coloniais, a partir do século XVI, em Lima e Córdoba, no século XVII.

O problema das IES isoladas não se aparta, em seus aspectos positivos e negativos, das agruras por que passam as universidades brasileiras. é inegável que a tradição de ensino no Brasil não vincula mais ao clássico beletrismo bacharelesco o expressivo contingente de IES isoladas.

Pais continental, historicamente de débil tradição universitária, avaro na destinação de recursos orçamentários em relação à faina educacional, imerso em contradições regionais que deságuam na agressiva concentração e disparidades econômicas (apenas dois Estados da Federação detêm 84% do produto interno bruto), dizemos, não se pode pensar na elisão do ensino isolado, pois é ele o fruto dos entraves materiais que assolam a Educação brasileira, o que leva, corno refere o documento, a que aqueles represente 70% dos estabelecimentos superiores no país.

Tanto ao nível público, quanto no privado, é materialmente impossível redirecionar o ensino superior no País abstraindo as IES isoladas. São a resposta à debilidade da iniciativa oficialista, como também a contratação de que por impossibilidades materiais a rede privada não pode erigir centros universitários .

Por outro lado, há que se compreender que o fenômeno indica uma resposta realista às exigências do expansionismo industrializante e o seu corolário, ou seja, a exigência de um profissionalismo científico. é neste aspecto que vão se expandindo as diferenças qualitativas no ensino superior e, particularmente, em suas IES isoladas. Correspondem, de resto, ao grande desenvolvimento e contrastes da sociedade com suas limitações .

Certamente, hoje já não se detecta a realidade que em 1958 o Prof. Roberto Moreira delineava em responsável estudo sobre a Educação superior brasileira. Dos 977 cursos superiores, suas matriculas destinavam, aos cursos de direito, filosofia e letras, 47%, engenharia, 17%, economia e contabilidade, 7%. é inegável que tais aspectos, hoje, sofreram visível mutação.

As IES isoladas são, de certa forma, resposta às exigências de modernização e setorialização de potencialidades econômicas emergentes. Resposta ocorrente na Europa e na América, onde os centros universitários são mais adequadamente estruturados .

No plano da Educação superior, seu diagnóstico de desempenho não difere, qualitativamente, dos centros universitários clássicos em nosso país.

Vincular medidas corretivas em relação às IES isoladas, deslocando o pólo de controle do Poder Público para o âmbito das universidades, é, no mínimo, além de perspectiva burocratizante esdrúxula, negar toda uma busca de autonomia crescente para o ensino superior. Isto para não aludir ás inevitáveis repercussões legais e institucionais.

Ora, sabido é que as instituições particulares do ensino superior isolado se vinculam a instituições mantenedoras dos mais variados credos e confissões religiosas, com filosofias educacionais e orientações extremamente diversificadas. Como compatibilizar o controle destas IES, por universidades desvinculadas das filosofias e visões educacionais peculiares e específicas de tais organizações? Absurda tal pretensão.

'Tratando-se de organizar as IES isoladas, como eludir aspectos concorrentes que, como conseqüência inarredável, oporiam fiscalizados e fiscalizadores?

Com efeito, as eventuais correções e funções de controle, nestes casos, não podem, à evidência, ser retiradas do Estado, porque condição mesma de imparcialidade e laicismo previsível, o que, enfim, merece acolhida constitucional.

Neste particular aspecto, o documento peca por contundente irrealismo de sua proposta, para não se aludir, ainda, à inafastável inconstitucionalidade subjacente.

Importa ser mantido o sistema em voga, aprimorando-o, ou seja, deixando a supervisão das IES isoladas a cargos das DEMECs.

2) Mecanismos de Financiamento

Preocupa-se todo governo sério e consciente com uma gestão financeira produtiva e eficaz dos seus órgãos.

Muito mais se espera, nesse campo, dos estabelecimentos públicos. de ensino, pois as falhas e ineficiências se refletirão sobre as novas gerações., a quem caberá assumir a direção dos. negócios. do estado e das empresas particulares.

O trabalho - "Uma Contribuição da Escola Particular Mineira", distribuído à Comissão, de competente e conhecido educador, contém uma sugestão valiosíssima, que deve ser posta em evidência.

"Será que não haverá mesmo um excesso de ociosidade principalmente nos. quadros. docentes. dessas universidades, autárquicas. ou fundacionais? Não seria difícil listar uma relação surpreendente de professores. de "dedicação exclusiva" exercendo outras. atividades., não dando aulas, não fazendo pesquisa (ou fazendo "pesquisas" sobre matérias mais que descobertas. . . ), gastando o tempo no exercício de posições em discutíveis conselhos, comissões ou grupos de trabalho, etc. etc. Hoje, em tais situações, são surpreendidos até os numerosíssimos "auxiliares. de ensino", contratados para dar as aulas. que os "adjuntos" ou os "titulares" não dão e que eles também acabam conseguindo não ministrar!

"O quadro descrito, aparentemente fantasioso, mereceria uma averiguação muito séria. E de preferência empreendido por auditorias externas. Do contrário, o sentido "corporativista" acabaria por esconder a realidade . E que não se viesse com alegação da malsinada "autonomia universitária", em nome da qual os cofres da União têm pago tão vultuosas e questionáveis despesas. Afinal, quem paga tem o direito de saber em que está sendo gasto o que sai do seu bolso pagador. E as surpresas, seguramente, não deixariam esses grupos auditores externos sem ter o que apresentar E, note-se, não se está falando aqui senão de problemas de má administração, que torna mais caros os custos. Na empresa privada, seja ela escola ou outra qualquer, ha geralmente, bem melhor gerenciamento, e maior racionalidade. Seria licito esperar-se que, pelo menos nas universidades., a aplicação do dinheiro público fosse considerada com mais próprios critérios, de modo a fazer com que cada cruzeiro aplicado correspondesse a um serviço efetivamente prestado ou à remuneração de atividades rigorosamente produtivas, ainda que em termos intelectuais. Com medidas. bastante seguras, nessa questão, até seria bem possível que o resultado da racionalização resultasse em possibilidade de melhor remuneração, tantas vezes. reclamada."

Está aí uma forma eficaz de implementar a eficiência das IES públicas, de sorte que o dinheiro dos contribuintes, que é sagrado, não seja gasto perdulariamente e sem objetividade.

Uma comissão externa de auditores., eleitos. pela comunidade dos. contribuintes, teria a seu cargo a verificação e a análise dos gastos e da produtividade, se é que, de fato, pretendemos. um Brasil e uma universidade melhores.

Fica sugerida, portanto, a escolha de uma comissão de auditores., eleita pela comunidade dos. contribuintes, entre elementos estranhos ao quadro da universidade, para analisar a gestão financeira, sobre ela se manifestando.

3) Professores. e Alunos das IES Particulares. subsidiados velo Ministério da Educação

Inquestionável é a larga e decisiva contribuição das IES particulares ao ensino superior no Brasil.

Delas existem muito boas. e, possivelmente, outras que refletem a pobreza do meio. Todavia, vêm fazendo muito para atender à insopitável demanda pelo terceiro grau, fenômeno, hoje, mundial, e notadamente das Américas.

Ninguém em boa e sã consciência pode negar que, com isso, horizontes. e perspectivas mais. amplas se abrem às atuais e às futuras gerações.

Como a escola privada enfrenta, à semelhança da pública, situação difícil, necessário se faz que o governo preste auxilio a professores e estudantes daquela.

Aos. primeiros, complementando-lhes o salário até 2/3 do vencimento respectivo à referência correspondente ao mestre da rede pública, mantida com os impostos da coletividade, aos segundos, proporcionando-lhes bolsas, nos casos de comprovada carência e nunca por favorecimento .

Essa concessão se fará uma vez que as DEMECs regionais averigüem o bom e eficiente desempenho da IES postulante, e, de igual, se cobra anuidade ou semestralidade rigorosamente no quantitativo fixado pela CEnE do CFE .

A supervisão exercida pela. DEMECs se aperfeiçoa sempre e pode colher as informações necessárias ao êxito dessa urgente iniciativa.

Perceba-se bem claro que não é a IES que vai ser subvencionada, mas sim o docente e o aluno.

Um grande passo se terá dado no aperfeiçoamento da Educação superior privada.

Desaparecerão as angustiantes diferenças entre a remuneração do magistério particular e a do estatal.

Isso o governo pode e deve fazer.

Com a contenção das anuidades e as majorações salariais acima dos índices permitidos ás IES, chegarão estas à insolvabilidade e, por fim, ao fechamento.

Estará criado, decorrentemente, um problema social de efeitos imprevisíveis.

A quem deseje fazer um curso superior e tenha o desenvolvimento mental para tanto, não se deve cercear e nem impedir. O que importa é que seja da melhor qualificação, constatando-se isso através de mecanismos e critérios técnicos e objetivos, e, nunca, políticos.

A viabilização de um ensino superior particular de boa qualidade acha-se, assim, delineada.

É só tomar as medidas propostas, com a inteligência e a brevidade que a situação exige. 


III - ANEXO MEDIDAS DE EMERGÊNCIA

A Comissão, no início de seus trabalhos, decidiu encaminhar ao senhor Ministro da Educação, conforme relatório parcial de 12 de junho de 1985, sugestões que, embora versando problemas de natureza conjuntural, assumiam caráter agudo, reclamando medidas de urgência para a revitalização da universidade pública federal .

A desvalorização do professor e do servidor técnico-administrativo das IES no que se defere a salários; a crescente perda de recursos orçamentários para os programas de manutenção e investimentos; a restrita parcela de recursos conferida às atividades de pesquisa, pós-graduação e extensão; a proibição, nos últimos quatro anos, da expansão do quadro de pessoal das IES federais confirmam o contexto negativo dessa realidade.

Mais crítica se torna essa situação com a política centralizadora, exercida tanto pelo MEC como por seus órgãos de apoio, constrangendo o livre exercício da autonomia, que é inerente ás instituições universitárias, e cerceando a saudável prática de criatividade a que se proponham.

As seguintes medidas de emergência foram então indicadas:

a) Quanto ao regime orçamentário e financeiro:

(I) concessão e liberação imediatas de crédito suplementar pleiteado pelas IES, permitindo-lhes manter condignamente seus compromissos e cumprir suas vocações. Efetiva aplicação da Emenda João Calmon quanto aos compromissos do MEC com a manutenção e desenvolvimento do ensino, ainda no exercício de 1985, independentemente de recursos provenientes de outras fontes. Para efeito desta aplicação, seria indispensável considerar o orçamento em execução e o excesso de arrecadação que venha a existir.

(ii) Na expectativa da implementação das medidas acima, seria necessário:

- atendimento ás solicitações inseridas no "estudo sobre a situação financeira das IES federais", entregue pelo Conselho de Reitores ao Ministro da Educação em 30 de abril de 1985, objetivando recuperar, em valores de 1981, as dotações em Outros Custeios e Capital (OCC);

- consideração, pelo MEC, do documento "Verbas para Outros Custeios e Capital para as Universidades Federais em 1985", produzido pela ANDES, em março de 1985 (este documento, examinando a depreciação dos recursos destinados à educação superior, em passado recente, sugere fatores de correção compatíveis com a desvalorização da moeda).

(iii) adoção do princípio de dotação global, aplicando-o de imediato na elaboração da proposta orçamentária para 1986. A definição dos recursos globais - assim alocados - deveria ser precedida por ampla consulta no âmbito das IES, canalizada por meio da Secretaria de Educação Superior.

(iv) Exclusão das IES federais do regime instituído pelo Decreto n 86.795 de 28 de dezembro de 1981, liberando-as para reaplicar livremente o saldo de pessoal apurado em exercícios anteriores e permitindo-lhes a contratação de pessoal docente e técnico-administrativo necessário ao seu desenvolvimento.

(v) restauração do sistema de delegação de competência para que as IES federais possam reconhecer suas dívidas classificadas como "exercícios anteriores" .

b) Quanto ao pessoal docente e técnico-administrativo:

(i) Equiparação dos salários entre docentes e servidores técnico-administrativos das IES autárquicas e fundacionais, concedendo-se aumentos diferenciados, de modo a corrigir os desníveis entre instituições mantidas pelo Governo Federal que desenvolvem tarefas idênticas. Para tanto, foram sugeridas, dentre as medidas possíveis, as seguintes:

- concessão, a partir de 19 de julho, de aumento diferenciado significativo para os professores e servidores autárquicos;

- estabelecimento de datas-base unificadas, em 19 de setembro e 19 de março, para a concessão de reajustes ou aumentos salariais, tanto nas IES autárquicas quanto nas fundacionais, aplicando-se esse critério a partir de 19 de setembro de 1985, com a correção na base de 100% do INPC e concessão de um diferencial para as IES fundacionais.

(ii) Acréscimos de um expressivo percentual sobre a "Gratificação de Apoio à Atividade de Ensino" à remuneração dos servidores técnico-administrativos das IES.

(iii) Restabelecimento de um sistema de incentivos diferenciadores .

(iv) Sugestão no sentido de que o MEC procure, em entendimento com o Ministério da administração, a valorização do pessoal técnico-administrativo das IES federais, objetivando as seguintes medidas: (a) revisão da política de concessão das gratificações de Apoio à Atividade de Ensino e Atividade Técnico-Administrativa; (b) revisão do reposicionamento e dos níveis salariais das funções DAS e DAI; (c) regularização da situação do pessoal integrante das Tabelas Especiais; (d) elaboração de Tabela Especial para o pessoal especializado, lotado nos Centros de Processamento de Dados.

c) Autonomia, bolsas de estudo e hospital universitário:

(I) Retirada do Congresso Nacional, para reexame, do projeto de lei que dispõe sobre a autonomia administrativa e financeira das Universidades Federais.

(ii) Garantia efetiva de recursos à CAPES para evitar atrasos no recebimento de bolsas ao pessoal inscrito nos programas de pós-graduação, como vem acontecendo com freqüência

(iii) Início imediato, pela Ministério da Educação, de programa específico visando à recuperação e manutenção dos campi universitários.

(iv) Elaboração e implantação, com a maior brevidade, de um programa de apoio financeiro e administrativo aos hospitais universitários, de modo a garantir-lhes funcionamento regular para os fins do ensino e dos serviços prestados à comunidade.

 

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