A ESCOLA VISTA POR DENTRO, João Batista Araújo e Oliveira e Simon Schwartzman, Belo Horizonte, Alfa Educativa, 2002.

Simon Schwartzman, "A culpa do fracasso escolar", não publicado

A revista Educação & Sociedade, em seu número 78, de abril de 2002, publica um surpreendente editorial contra  matéria publicada na Folha de São Paulo em 30 de março a respeito do livro  A Escola Vista por Dentro  (Belo Horizonte, Editora Alfa Educativa, 2002), de autoria de João Batista  Araújo e Oliveira e Simon Schwartzman. Surpreende que o artigo critique o livro e os autores a partir de uma notícia de jornal, e não da leitura do próprio livro, que seria o mínimo de se esperar de uma revista que pretende defender a importância da pesquisa educacional séria e responsável. Depois, porque o autor do editorial entendeu  o oposto do que está escrito no livro e na própria matéria da Folha.  O livro não diz que o estudante é o principal responsável pelo fracasso escolar. O que o livro diz é exatamente o contrário: as escolas e os professores devem assumir sua parte da responsabilidade pela educação, e não podem se eximir desta responsabilidade dizendo que o problema é dos estudantes ou de suas famílias.

Poderíamos esperar menos discordância se o editorialista tivesse se dado ao trabalho de ler o livro. Se ele tivesse feito isto, talvez encontrasse outros pontos de convergência, como a crítica que também fazemos aos “pacotes pedagógicos” e às sucessivas reformas educacionais vindas de cima para baixo que atropelam constantemente as instituições escolares, sem impactos conhecidos, e muitas vezes prejudicando em seu funcionamento.

Onde talvez a discordância não possa ser contornada é em relação à postura do editorialista  de eximir os professores, educadores e administradores escolares da responsabilidade que lhes toca pela educação, colocando toda a culpa no “isso que aí está”, na expressão de Florestan Fernandes citada no fim do editorial. Para o editorialista, não existiriam problemas técnicos e pedagógicos na educação brasileira, somente problemas políticos, associados a interesses econômicos e relações de poder “instaladas em todas as práticas e processos”, que impediriam que a educação se desenvolva. Já os autores do livro pensam que, em todos os países e sociedades, existem relações de poder, dominação e interesses econômicos, mas que a existência destas relações de poder e dominação não pode servir de pretexto para que os profissionais e intelectuais da educação não assumam sua parcela de responsabilidade no cumprimento de sua função primordial de ensinar as crianças e jovens a ler e a entender o mundo. 

Alguns países e sociedades conseguem resultados educacionais muito melhores do que os nossos, partindo muitas vezes de condições piores, e precisamos  entender melhor porque isto ocorre. As condições econômicas, sociais e culturais dos estudantes e suas famílias condicionam muito fortemente sua capacidade de aprender, mas, quando a escola está comprometida com a educação e os professores sabem o que fazer, o efeito pode ser muito significativo, e contribuir para mudar a situação das pessoas.  Nossa pesquisa mostra que, no Brasil, muitos professores não aprendem a alfabetizar nos cursos de pedagogia, e acham que não podem fazer nada, por causa de tudo “isso que está aí”.  Nós  pensamos, ao contrário, que uma orientação mais voltada para a boa pedagogia, e menos para grandes teorias críticas e pseudo-filosóficas, poderia contribuir bastante para começar a mudar a realidade, sem precisar aguardar o momento mágico da revolução libertadora, cuja espera parece que tudo justifica. <