A Revolução Soviética na UFRJ

Em uma carta ao Ministro da Educação, transcrita abaixo, 25 professores eméritos da Universidade Federal do Rio de Janeiro protestam contra o fato de o comando de greve, que vem paralisando a universidade há vários meses, ter agora assumindo as funções de responsabilidade acadêmica da instituição. Dizem eles: “nossa preocupação vai além da quase completa paralisação das aulas e atividades administrativas numa greve que já dura 3 meses. Greves por longos períodos já ocorreram no passado, mas o que presenciamos agora é de gravidade sem precedentes: a transformação de instâncias sindicais em canais de tramitação dos procedimentos acadêmicos, e de decisão sobre questões da alçada do Conselho Universitário e do próprio Reitor”.

Não chega a ser sem precedentes. Em 1917, Lênin lançou a diretriz de “todo poder aos Soviets”, que eram as organizações de trabalhadores que apoiaram a revolução de outubro e que, depois, foram violentamente reprimidas pelo governo implantado em seu nome. Fora isto, de fato, o direito de greve, dentro de seus limites, tem sido reconhecido em todas as partes, mas jamais confundido com a entrega da autoridade das organizações aos sindicatos, nem no setor privado, nem no setor público. Até agora.

Tão ou mais preocupante é que este protesto tenha partido de professores eméritos, e não dos professores ativos.  Será que, para eles, está tudo bem, como esteve bem a “consulta” que substituiu o processo legal de escolha dos candidatos a reitor, e que levou à indicação e posterior nomeação do reitor atual?

 

CARTA ABERTA DE PROFESSORES EMÉRITOS DA Universidade Federal do Rio de Janeiro
Exmo. Sr Ministro da Educação
Professor Renato Janine Ribeiro
Esplanada dos Ministérios, Bl. L -8º Andar – Gabinete 70047-900 -Brasília – DF

(e-mail: gabinetedoministro@mec.gov.br)

Rio de Janeiro, 20 de agosto de 2015

Senhor Ministro,

Na qualidade de Professores Eméritos da UFRJ trazemos à sua atenção nossa profunda preocupação com episódios recentes que vêm ameaçando a nossa Universidade enquanto instituição de ensino, pesquisa e extensão de qualidade. Nossa preocupação vai além da quase completa paralisação das aulas e atividades administrativas numa greve que já dura 3 meses. Greves por longos períodos já ocorreram no passado, mas o que presenciamos agora é de gravidade sem precedentes: a transformação de instâncias sindicais em canais de tramitação dos procedimentos acadêmicos, e de decisão sobre questões da alçada do Conselho Universitário e do próprio Reitor.

Relatamos a seguir apenas dois exemplos de episódios recentes de nosso conhecimento:

1) Foi negado o pedido de afastamento do país de docente visando participar de evento científico representando a UFRJ. O processo seguiu as etapas iniciais de avaliação; porém, antes de ser encaminhado à Reitoria, duas entidades ligadas ao SINTUFRJ (Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFRJ), “Comando Local deGreve” e “Comissão de Ética” sentiram-se no direito de analisar e negar o afastamento por não considerá-lo uma atividade essencial. Solicitações análogas de outros docentes tiveram o mesmo desfecho. Na prática isto representa uma usurpação, aparentemente consentida, da autoridade da Reitoria, à revelia de qualquer norma ou regulamento da Universidade.

2) Em reunião do Conselho Universitário de 13/08/2015, o professor Afrânio Kritski, diretor da Faculdade de Medicina e com aprovação da respectiva Congregação, solicitou posicionamento do Conselho Universitário, órgão colegiado máximo da UFRJ, sobre o reinício das aulas na sua Unidade, conforme desejam seus professores. Em resposta, o Pró-Reitor de Graduação, professor Eduardo Serra, informou que o Conselho de Ensino de Graduação deliberou que excepcionalidade deste tipo deveria ser encaminhada ao CLG (Comando Local de Greve), procedimento acatado pelo Reitor, não incluindo o assunto na pauta do Consuni. Entendemos que a avaliação de questões acadêmicas por instâncias de caráter sindical, como o “Comando Local de Greve” e a “Comissão de Ética”, invertem a prática universal em instituições de ensino e pesquisa do julgamento pelos pares, inviabilizam a convivência universitária sadia e prejudicam gravemente a reputação da nossa Universidade.

A UFRJ segue uma rota perigosa, que em breve poderá tornar-se irreversível. Certos de sua compreensão sobre a gravidade da situação institucional vigente, contamos com sua ação pronta e enérgica no sentido de apurar as responsabilidades por episódios como os descritos e regularizar os procedimentos acadêmicos da UFRJ.

Saudações Universitárias,

Antonio Carlos Secchin, Faculdade de Letras

Antonio Flávio Barbosa Moreira, Faculdade de Educação

Fernando Cardim de Carvalho, Instituto de Economia

Fernando Garcia de Mello,, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho

Heloísa Buarque de Hollanda, Faculdade de Educação

I-Shih Liu,, Instituto de Matemática

José Murilo de Carvalho, Instituto de História

Luiz Felipe Canto, Instituto de Física

Marcello André Barcinski, Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho

Martin Schmal, COPPE

Nelson Velho de Castro Faria,, Instituto de Física

Radovan Borojevic, Instituto de Ciências Biomédicas

Willy Alvarenga Lacerda, COPPE

Antonio Dias Leite, Instituto de Economia

Erasmo Ferreira, Instituto de Física

Fernando de Souza Barros, Instituto de Física

Gilberto Barbosa Dumont, Instituto de Química

Herch Moysés Nussenzveig, Instituto de Física

João Saboia, Instituto de Economia

Luiz Bevilacqua, COPPE

Luiz Pereira Calôba, COPPE

Mario Luiz Possas, Instituto de Economia

Muniz Sodré, Escola de Comunicação

Nicim Zagury, Instituto de Física

Takeshi Kodama, Instituto de Física

 

Author: Simon Schwartzman

Simon Schwartzman é sociólogo, falso mineiro e brasileiro. Vive no Rio de Janeiro

2 thoughts on “A Revolução Soviética na UFRJ”

  1. Essa situação é seriísima. Obviamente não se trata de greve protegida por lei se são os gestores a impedir o trabalho dos funcionários deles dependentes.

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