Reforma da educação: aonde começar?

Todos concordam que a reforma da educação é importante, mas, na hora de dizer o que deve ser feito, e por onde começar, ninguém se entende, ou se apresentam propostas que não levam a nada, ou até pioram as coisas.

João Batista Araujo e Oliveira, que tem trabalhado sobre o tema por muitos anos, no Brasil e no exterior, tem respostas muito especificas sobre o que deve e o que não deve ser feito, a partir de uma visão global e um diagnóstico bastante claro e objetivo da situação da educação brasileira nos seus diferentes níveis.

Recomendo a todos a leitura do livro, e a ajuda para divulgá-lo entre as pessoas que ocupam cargos de decisão ou formadores de opinião.

O livro pode ser aquirido da Editora Alfa e Beto, 31-3262-3229, por email ou no site do Programa Alfa e Beto.

José Roberto Militão: Estatuto da Raca e Cotas

José Roberto Militão, que se identifica como advogado e militante do movimento negro contra o racismo, envia como colaboração o texto “Projetos de Lei do Estatuto de Igualdade Racial e Lei de ‘Cotas Raciais’: A reflexão que vale a pena ser feita”, que pode ser baixado clicando no título.

Na sua mensagem, diz Militão: “Sei que vc. tinha ‘banido’ o tema cotas raciais do blog, porém, pondero pela avaliação da possibilidade de circulação na lista do blog, do artigo, tendo em vista que a palavra de ordem do movimento negro neste 20 de novembro voltou a ser os projetos de leis no parlamento. Bem, se o tema não morreu, vc. deve ser convocado para continuar atuando e intermediando os bons debates”.

É verdade que, tempos atrás, eu decidi parar de publicar notas sobre o tema, porque achei que a discussão estava esgotada em termos de idéias e os argumentos estavam se repetindo, embora a disputa política e ideológica certamente continue. É com prazer, no entanto, que abro esta exceção.

Guerreiro Ramos e a consciência negra

Em 1954, Alberto Guerreiro Ramos publicava “O Problema do Negro na Sociologia Brasileira“, uma crítica brilhante e que se tornou clássica do que até então os sociólogos e antropólogos chamavam de “problema do negro” no Brasil. Em 1981, editei um volume com uma seleção de artigos dos Cadernos de Nosso Tempo que incluia este texto, difícil de encontrar, mas que agora está disponível na Internet. Dia 20 de novembro é o Dia da Consciência Negra no Brasil, e este era, justamente, o tema central do artigo de Guerreiro Ramos.

Cronologia da Ciência Brasileira, 1500-1945

Esta cronologia foi preparada por meu colega Tjerk Guus Franken, como parte do projeto que desenvolvemos na FINEP nos anos 70 sobre a Formação da Comunidade Científica no Brasil. Ela foi publicada na primeira edição, de 1979, mas acabou não saindo na versão revisada em inglês, que é de 1991, nem na nova versão brasileira de 2001, que é baseada na versão inglesa.

Agora, para quem estiver interessada ou interessado, a cronologia está disponível na Internet. O texto completo do livro já estava disponível antes  aqui

O aumento do trabalho infantil e a educação

Ontem eu publiquei uma nota comparando os dados da PNAD / IBGE de 2004 e 2005, tratando de entender o aumento do trabalho infantil ocorrido neste período, e sua possível relação com a redução da matrícula escolar, que vem aparecendo no censo escolar do Ministério da Educação. Ao contrário do que eu havia dito naquela nota, que por isto foi retirada, os dados na PNAD não acusam a redução da matrícula escolar, e sim um pequeno aumento, além de uma redução pequena, mas salutar, na proporção de jovens de 15 a 17 anos que ainda estão no primeiro grau. Minha hipótese, de que o aumento do trabalho infant poderia se dever a uma piora da situação escolar, não pode ser verificada com estes dados. Quando entender melhor o que está passado, digo.

O manifesto dos reitores: me dá um dinheiro aí!

Vale a pena ler o documento divulgado pela Associação Nacional dos Dirigentes das Institutições Federais de Ensino Superior – ANDIFES – entitulado “A ANDIFES e as eleições 2006 – aos candidatos à Presidência da República.”. É fácil de entender: segundo os reitores, existe uma grande ameaça, a expansão desordenada do ensino superior privado. O ensino superior público federal, que é ótimo, só não é melhor porque o governo ainda não lhe dá todo o dinheiro que gostaria de receber, e a autonomia para gastá-lo. As coisas têm melhorado um pouco nos últimos anos, mas poderiam melhorar ainda mais, com mais dinheiro, não só para as universidades, mas também para a pesquisa. Ah, claro, as universidades federais também têm responsabilidade com a educação básica, e para isto o governo precisa universalizar o acesso e pagar mais aos professores. Falta de dinheiro? Tudo se resolve aumentando os gastos públicos da educação para 7% do PIB, sem contingenciamento (hoje deve estar alí pelos 5%). Para isto, só falta vontade política!

Quem lê, até esquece que, ao lado de boas instituições e programas federais, têm muitos outros péssimos, que são igualmente subvencionados e não precisam mostrar resultados; que boa parte do mérito do ensino superior público brasileiro, sobretudo na pós graduação e na pesquisa, está nas universidades paulistas, muito mais que nas federais; que o crescimento recente das instituições federais tem sido e continua sendo tão ou mais desordenado do que o do setor privado, sem nenhum critério aparente de prioridades e necessidades; que parte da responsabilidade pela má qualidade da educação básica no país é das universidades federais, que não formam professores com a qualidade e competência que eles deveriam ter; e que o ensino superior público continua proporcionando um subsídio injusto para os estudantes de classe média e alta que se beneficiam dele à custa dos impostos de todos. Será que lembrar estas coisas é só intriga de quem é a favor do ensino particular como mercadoria?

Precisa dizer de novo? Então, vamos lá. O problema não é de universidades públicas ou privadas, mas de ensino superior de boa ou má qualidade. O país precisa apoiar o ensino superior, usando bem seus recursos, estabelecendo prioridades com clareza, e fazendo com que as instituições beneficiadas assumam a responsabilidade pela qualidade de seus produtos. O subsídio aos estudantes de nível superior não pode ser indiscriminado, mas precisa estar associado a critérios claros de necessidade individual e prioridade social. O setor privado, que já atende a 75% dos alunos, não pode ser demonizado, e precisa de um sistema adequado de regulação, tanto quanto o setor público. É importante aumentar os gastos com a educação, inclusive para o ensino superior, mas, sem políticas adequadas de qualidade e prioridade, este aumento de gastos pode significar, simplesmente, mais poder para os senhores reitores.

Quem será o candidato preferido dos reitores? Um aumento da verba de custeio para quem acertar!

Tréplica de Claudio Considera: a miséria brasileira, a miséria do debate e as damn lies

Recebi de Cláudio Considera, que é professor de economia da Universidade Federal Fluminense, a seguinte nota:

Recentemente (22 e 23 de setembro) o pesquisador, da FGV/CPS, Marcelo Néri e sua equipe divulgaram na mídia novos resultados da queda da miséria. Em carta a Merval Pereira no dia 27 de setembro e em artigo n’ O Globo (6 outubro), disponível neste blogo fiz uma crítica a metodologia do trabalho de Neri que torturando as estatísticas “demonstra” que a redução de miseráveis no governo Lula foi percentualmente maior do que nos primeiros 3 anos do governo FHC. Néri replica meus argumentos em artigo no mesmo jornal (7 de outubro). Neste texto eu treplico apenas para o público especializado deste blog. Vou fazer isto para cada ponto feito por Néri.

1. Diferentemente do que parece, pela defesa de Néri, não fiz no meu artigo qualquer alusão a falta de honestidade da instituição FGV, do CPS ou mesmo do autor do artigo que reputo ser um dos mais brilhantes pesquisadores nessa área. Portanto, são completamente despropositados os quatro parágrafos dos 6 que compõe sua réplica. Tenho total respeito pela FGV, onde tenho vários colegas e amigos.

2. No meu texto chamo de ERRO o tratamento metodológico que Néri dá aos dados para chegar à conclusão de que a redução da miséria no governo Lula foi maior do que no governo FHC.

3. O texto que ele menciona estar no site da FGV/CPS que ele atribui a mim a autoria é na verdade uma co-autoria com ele (porque omitir isso?), ao tempo em que era pesquisador do IPEA. Não o renego e dele tenho o maior orgulho. Mas, o erro metodológico, que ele menciona também estar lá presente, encontra-se na seção 2.5 que ele escreveu; nas duas sessões (2.2 e 2.3) de minha autoria eu me refiro a pontos de percentagem. Mas, se assino o artigo tenho responsabilidade por isso e sou obrigado a reconhecer meu erro lá, embora nosso texto tivesse como principal objetivo dizer que a inflação era um imposto terrível sobre os mais pobres e não comparar governos. Mas, essa dam lie do Néri me deixou preocupado; esse não é o caráter do Marcelo que conhecia.

4. A seguir Marcelo Néri dá vez à soberba do argumento da autoridade. Diz ele que se fosse eu um especialista ou pelo menos um interessado em questões sociais saberia que as metas do milênio da ONU falam em reduzir a miséria à metade até 2015; ou seja, em linha com a metodologia que eu estaria criticando. Sugere, de forma desrespeitosa, que eu escreva ao Kofi Annan reclamando.

Não sou mesmo um especialista no tema, mas sou sim um interessado, pelo que demonstram meus escritos. Mas o que escrevi no jornal não exige qualquer especialização no assunto, mas apenas saber ler, escrever e conhecer as quatro operações básicas da aritmética, embora eu tenha usado apenas as de subtrair e dividir. Portanto, não se deixem enganar pelo o que Néri diz e desdiz ao mesmo tempo: a despeito de ter sido seu co-autor em 1996 e 1998 de dois artigos acadêmicos, cujo mérito, na sua maior parte, é de Néri mesmo, sou apenas um interessado no assunto.

Quanto a escrever ao Kofi Annan, eu só o faria se ele tivesse estabelecido que os países deveriam reduzir a miséria em 50% do seu percentual de miséria, como faz o Marcelo. Mas, nesse caso, seria melhor enviar a Madame Natasha, personagem do Elio Gaspari, professora de piano e português que simplifica qualquer bobagem empolada que se fale.

5. A seguir ele menciona que eu citei uma inexistente linha oficial de pobreza. Enganei-me. De fato, essa linha não existe embora se tenha tentado criá-la, o que Simon Schwartzman em seu artigo no blog, condena. Entendi que Sonia Rocha estivesse fazendo seus cálculos com uma linha dessa, mas ela tem suas próprias linhas de pobreza e miséria. Mas, isso é irrelevante para minha crítica. Eu só faço uso dos números de Sônia Rocha porque, diferentemente do que afirma Marcelo Néri não há em seu artigo ou no site da FGV/CPS qualquer número absoluto de miseráveis. Se houvesse, ficaria claro que qualquer que seja a linha de miséria o número absoluto de redução de miséria durante o período 1994-1997 (3 primeiros anos de FHC) seria de mais de 3 vezes à redução da miséria durante o período 2002-2005 (3 primeiros anos de Lula).

6. A seguir ele fala da minha obsessão em comparar FHC e Lula. Essa obsessão de comparar períodos administrativos (como ele se refere aos períodos de governo FHC e Lula) foi dele; eu apenas busquei colocar a comparação nos eixos. Em primeiro lugar, eu não comparei nove anos (1993/2002) de FHC com 3 de Lula. Ele mesmo cita o número de 1993/94 (que ele com razão diz ser de Itamar) como sendo de FHC e, eu mantive esse dado, pois a PNAD não está disponível para 1994 Julguei, inclusive, que ele se baseava em seus próprios resultados, que estão em nosso trabalho de 1996, em que a PME, que embora metropolitana pode ser usada como uma boa proxy da evolução da evolução dos resultados da PNAD. Ou seja, pela PME seria razoável supor que a miséria em 1993 e 1994 tenha se mantido inalterada, pois, se por um lado a aceleração inflacionária da primeira metade de 1994 teria aumentando a miséria, a abrupta queda da inflação na segunda metade deve tê-la reduzido (resultado claro pela PME). Portanto, começar o período FHC com o percentual de 1993 equivale a começá-lo em 1994.
Em segundo lugar, ele inicia a comparação de Lula em 2003 como se a miséria que ele herdou de FHC fosse aquela que ele aumentou durante o ano de 2003. Aí corrijo e inicio a contagem de Lula contra o que ele herdou de FHC ao terminar o governo em 2002.

Em terceiro lugar, é estranho que Marcelo Néri, una o gráfico da miséria em pontos inexistentes. Isso transmite uma noção errada da evolução parecendo, por exemplo, que em 1994 a miséria tenha caído. Aí sou obrigado a confessar que para perceber tal erro utilizei-me do meu curso de estatística descritiva na graduação de economia.

7. A seguir menciona que em outros trabalhos ele teria mostrado bons resultados do governo tucano de Aécio. Deveria ter feito o mesmo no artigo que comentei, e não ter torturado as estatísticas para elas falarem o contrário.

8. Na sua última frase se redime. A tempo!

Em tempo, para os que ainda possam ter dúvida, embora seja público e notório: sou tucano, com muita honra, filiado ao PSDB desde 1998. E, não aspiro a qualquer cargo de qualquer governo. Já dei minha cota de sacrifício. Aspiro sim que tenhamos um governo decente e eficiente.

Lies, damn lies, and statistics

Como ex-presidente do IBGE, não posso subscrever a esta famosa frase que atribuem a Disraeli, e as vezes também a Winston Churchill: “existem três tipos de mentira: mentira, mentiras malditas, e estatísticas!” Também atribuem a Disraeli outra frase: “a única estatística na qual você pode acreditar é a aquela que você mesmo falsificou! ”

Não é verdade. Na área das estatísticas da pobreza, o IBGE vem coordenando desde 1997 um grupo de trabalho das Nações Unidas sobre o tema, e já existe um forte consenso internacional a respeito das diferentes maneiras de medir e avaliar as condições de pobreza de um país, uma região ou um grupo social. Basta percorrer um pouco esta literatura para vermos que não existe uma maneira única e simples de medir a pobreza, mas um leque de alternativas, cada qual com suas qualidades e suas limitações: pobreza absoluta, pobreza relativa, medidas relacionadas à renda, medidas relacinadas ao consumo de alimentos, às condições de saúde…

Isto não significa que não possam haver diferentes maneiras de usar e interpretar os indicadores disponíveis, como revela o debate entre Claudio Considera e Marcelo Neri relatado aqui, mesmo quando todos utilizam a mesma informação, no caso os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE (PNAD). É por isto mesmo, também, que eu não penso que seja uma boa idéia definir uma linha de pobreza oficial para o país. Isto significaria adotar, arbitrariamente, uma das diferentes medidas disponíveis, e usá-la para avaliar políticas e criar direitos para determinadas pessoas e regiões, ao invés de tratar de forma diferenciada as diferentes situações de pobreza que existem no país, na área rural, nas cidades, entre os jovens, os velhos, a população indígena, etc.

Quanto à polêmica em si, minha única observação é que não gosto do uso de percentagens sobre percentagens como medida de evolução ou mudança. Veja por exemplo o que acontecia com a frequência à escola para alunos do quinto mais pobre da população, entre 8 e 13 anos de idade, em relação aos que recebiam ou não a bolsa escola em 2003, conforme a PNAD 2003. Para os que não recebiam a bolsa, a percentagem de ausentes à escola era de 2,7%. Para os que recebiam a bolsa, a percentagem de ausentes era 0,7%. Dividindo um pelo outro, poderíamos concluir que o programa de bolsa escola tinha um fortíssimo impacto neste grupo, já que diminuia a ausência escolar em quase quatro vezes. Olhando pelas diferenças de percentagem, no entanto, a conclusão é oposta: para este grupo, a diferença é de 99.3 para 97.3, ou seja, um aumento de 2% somente, o que significa que o impacto do programa era praticamente nenhum (a análise completa está disponível aqui).

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