Robert Verhine: Educação à Distância na pós-graduação

Considero extremamente pertinente a análise de Simon em sua postagem de 13 de junho de 2025 sobre as novas regulamentações relativas à educação a distância (EaD) no ensino superior. Com o intuito de complementar sua perspectiva, apresento, a seguir, algumas informações específicas sobre a utilização da EaD na pós-graduação stricto sensu. Fui coordenador de dois Grupos de Trabalho instituídos pela CAPES, em 2019 e 2022, com a finalidade de propor políticas e critérios de avaliação para essa modalidade. Além disso, possuo publicações sobre o tema, referenciadas ao final deste texto.

É importante observar que programas de mestrado e doutorado a distância, reconhecidos por sua qualidade e efetividade, estão presentes em diversas regiões do mundo, com destaque para os contextos europeu e norte-americano. Nos Estados Unidos, por exemplo, o mestrado a distância é amplamente difundido, e o doutorado nessa modalidade também apresenta significativa abrangência, sendo ofertado por diversas instituições de prestígio. Tais programas concentram-se, majoritariamente, em áreas de natureza profissional, com destaque particular para o campo da Educação, no qual são oferecidos tanto doutorados acadêmicos (Ph.D.) quanto profissionais (Ed.D.), inclusive por universidades de renome internacional.

Dados do Departamento de Educação dos Estados Unidos (U.S. Department of Education, 2020), referentes ao ano letivo de 2018/2019 — portanto, anteriores à pandemia de COVID-19 —, indicam que 15% dos estudantes de graduação estavam matriculados exclusivamente em cursos online, percentual que alcançava 33% na pós-graduação.

Esse cenário contrasta fortemente com a realidade brasileira. No Brasil, mais da metade dos estudantes de graduação encontra-se matriculada em cursos na modalidade a distância. No entanto, na pós-graduação stricto sensu, não há um único estudante legalmente vinculado a programas inteiramente ofertados por meio dessa modalidade. Essa discrepância revela-se insustentável, sobretudo considerando-se que a oferta de programas de pós-graduação no país ainda é limitada, altamente concentrada nas grandes áreas urbanas e nas regiões mais desenvolvidas economicamente.

A explicação para tal situação requer uma breve retomada histórica. No Brasil, a possibilidade de oferta de programas de pós-graduação a distância está prevista na Lei nº 9.394/1996, cujo Art. 80 estabelece que “o poder público incentivará o desenvolvimento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos os níveis e modalidades de ensino e de educação continuada”. Entretanto, foi apenas em 11 de dezembro de 2017, por meio da Resolução nº 07 do Conselho Nacional de Educação (CNE), que se autorizou formalmente o funcionamento de cursos de pós-graduação a distância, delegando à CAPES a responsabilidade por sua implementação e avaliação. Em resposta, a CAPES publicou a Portaria nº 90, de 24 de abril de 2019, regulamentando a oferta de tais cursos.

Ainda em 2019, a CAPES abriu prazo para submissão de propostas de novos cursos na modalidade EaD. As quinze propostas recebidas foram analisadas por comissões especialmente designadas para esse fim, mas nenhuma foi aprovada, possivelmente em razão da ausência de diretrizes claras por parte da CAPES quanto à concepção esperada para a pós-graduação a distância.

Dessa forma, ao final de 2021, a CAPES reabriu o período para apresentação de propostas, com análise prevista para o primeiro semestre de 2023. Nessa nova etapa, houve maior clareza nas orientações quanto aos critérios de aprovação. Novamente, quinze propostas foram submetidas, sendo que, em dezembro de 2023, o primeiro programa na modalidade EaD foi finalmente aprovado.

Contudo, em 2024, a CAPES alterou sua política para a modalidade, reclassificando a proposta aprovada como programa semipresencial e manifestando a intenção de não receber novas propostas em EaD. O relatório final do Grupo de Trabalho de 2022, que buscou orientar a formulação de tais propostas, jamais foi divulgado, embora formalmente aprovado pelo CTC.  

Como alguém que participou ativamente desse processo, entendo que a atual postura da CAPES decorre, em grande parte, dos problemas amplamente reconhecidos — e bem pontuados por Simon — relacionados à oferta de EaD na graduação. Entretanto, considero equivocada a política da CAPES em relação à EaD na pós-graduação. A situação problemática da EaD na graduação não deve ser interpretada como um obstáculo à sua implementação na pós-graduação, dado que o perfil do estudante desse nível de ensino tende a refletir maior autonomia acadêmica e, consequentemente, maior propensão ao êxito em contextos de aprendizagem remota. Ademais, a qualidade da EaD na pós-graduação pode ser mais efetivamente assegurada, na medida em que essa etapa do ensino é submetida a um rigoroso e consolidado sistema nacional de avaliação — algo que a distingue substancialmente da realidade da graduação.

Considerando o potencial da Educação a Distância (EaD) para ampliar a capilaridade da oferta de cursos de pós-graduação, bem como a ênfase atribuída pelo novo Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG 2025-2029) à ampliação e diversificação da oferta e à redução das assimetrias regionais e interinstitucionais no sistema nacional de pós-graduação, torna-se evidente a necessidade de reavaliar a atual política da CAPES em relação à EaD na pós-graduação stricto sensu.

Referâncias:

VERHINE, R. E.; DANTAS, L. V. Programas de pós-graduação a distância: perspectivas da experiência internacional. Educação & Sociedade, v. 45, p. 1-18, 2024.

VERHINE, R.E.; SIQUEIRA, V.B. Pós-graduação e educação a distância. Jornal de Políticas Educacionais, v. 18, p. 1-19, 2024.

Author: Robert Verhine

Professor Titular aposentado da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia.

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