Inflação de Diplomas

(Publicado em O Estado de São Paulo, 12 de abril de 2024)

Se há uma quase unanimidade no Brasil é que o país precisa de mais educação, e isto tem justificado um investimento cada vez maior no setor. Entre 2012 e 2023, a proporção de pessoas entre 18  e 40 anos com ensino médio completo ou mais passou de  53% para 71%, e com educação superior, de 11 para 19%. A estimativa é que, em 2018, o dado mais recente que consegui, o país tenha gasto 6.6% do PIB com os alunos da rede pública, dos quais 1.4% no ensino superior. E isto sem contar os gastos com aposentadorias e pensões de professores, bolsas de estudo, além do crédito educativo e Prouni, que beneficiam o ensino privado. É muito ou pouco? Afinal, ainda temos muita gente que não completou o ensino médio, e a educação superior deveria ser para todos. Vamos investir mais? Que tal gastar 10% do PIB, como aprovado, mas nunca cumprido, pelo Plano Nacional de Educação de 2014? Tirando de onde?

Antes de fazer isto, seria interessante refletir sobre um trabalho recente de pesquisadores do IPEA sobre a relação entre a educação e o mercado de trabalho no Brasil[1]. O que eles fizeram foi, com base na Classificação Brasileira de Ocupações, verificar qual o nível educacional requerido para cada uma delas – fundamental, média, superior – e depois, com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE, verificar a proporção de pessoas que estão trabalhando em atividades abaixo, equivalente ou superior à sua formação, entre 2012 e 2022.

Os resultados são impressionantes. Nestes dez anos, a proporção de pessoas sobre-educadas, ou seja, com mais educação do que o requerido pelas ocupações que desempenham, passou de 26% para 37% do total, enquanto a de sub-educados, ou seja, pessoas trabalhando em atividades que requerem mais educação do que as que têm, caiu de 32 para 20%. É um caso claro de inflação educacional, em que se emitem cada vez mais títulos que o mercado de trabalho não tem como absorver. A maior parte dos sobre-ocupados são de nível médio, cerca 50%, mas a proporção entre os de nível superior também é alta,  pouco mais de 30%. Os dados mostram ainda que a grande maioria das ocupações existentes não requer muita educação.  Este quadro praticamente não se alterou nos últimos dez anos, exceto na indústria de transformação de alta tecnologia, em que há uma polarização, com mais trabalhadores de formação superior e de educação fundamental, e menos de educação média. Mas é um setor pequeno, com menos de 5% dos empregos.

Os autores não especulam muito sobre as razões deste quadro, exceto para dizer que ele deve ter sido afetado pelas crises no mercado de trabalho que vêm ocorrendo no Brasil desde 2015. Mas uma lição que podemos tirar é que não basta dar mais educação para que as pessoas se tornem mais produtivas.  Outra possível conclusão seria que se trata de um problema dos conteúdos da educação. Para obter um emprego compatível, não basta ter um diploma de nível médio ou superior, é necessário que este diploma esteja associado às competências que o mercado de trabalho requer. Mas, mesmo que esta associação exista, o mercado de trabalho tem uma lógica que depende de muitos fatores, dentre os quais a disponibilidade de recursos humanos qualificados é somente um – uma condição necessária, mas não suficiente.

A conclusão mais geral é que não faz sentido continuar aumentando os investimentos em educação de forma indiscriminada, isto só produz inflação de diplomas.  Além da grande frustração dos que não conseguem trabalhos condizentes com sua formação, existem os milhões que gastam tempo e dinheiro aprendendo coisas que nunca usam e  logo esquecem, os que abandonam seus cursos antes de terminar, e os que desistem e  saem cedo do mercado de trabalho, sobretudo mulheres.

 Claro que a educação tem outros objetivos além de preparar as pessoas para o trabalho –  formar pessoas mais cultas, mais solidárias, melhores cidadãos, com capacidade de aprender e lidar com uma sociedade em constante transformação. Mas, se as pessoas que se formam, sobretudo em nível superior, não conseguem trabalho compatível com seu nível de formação, e isso vem aumentando, algo está errado.  

Existe uma prioridade clara, que requer investimentos, que é a educação fundamental de qualidade, até os 15 anos de idade. É neste nível também que a questão das desigualdades deve ser enfrentada – não há política de ação afirmativa nem incentivo financeiro que consiga compensar as desigualdades de formação inicial. A partir daí, é necessário abrir espaço para caminhos alternativos, inovações e flexibilidade. A reforma do ensino médio, felizmente salva pelo Congresso em suas ideias centrais, pode contribuir para isto, se bem conduzida. E, no ensino superior e pós-graduação, é importante ser seletivo no uso de recursos públicos,  deixando de subsidiar sem maiores critérios as ilusões do diploma salvador, como se ele pudesse compensar pelas disfunções econômicas e institucionais que mantêm o país no atraso, e os jovens sem poder fazer uso de seu potencial.

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[1]Carvalho, Sandro Sacchet, e Maurício Cortez Reis. “Evolução da sobre-educação no mercado de trabalho no Brasil entre 2012 e 2022: primeiros resultados.” Boletim Mercado de Trabalho: Conjuntura e Análise. (IPEA), 2023.

Um novo ENEM? Ou um novo sistema de seleção para a educação superior?

Renato Pedrosa, IEA/USP e Fapesp

No final da tarde de 31/08/2023, uma mesa da Reunião Anual da Associação Brasileira de Avaliação Educacional (ABAVE) discutiu a necessidade de se reformar o ENEM, em vista das mudanças recentes ocorridas no Ensino Médio. Coordenada pelo ex-presidente do INEP, Reynaldo Fernandes, que liderava o INEP quando o ENEM foi reestruturado em 2009 e passou a ser o instrumento central do sistema de acesso às instituições federais de ensino superior, foi composta por Manuel Palácios, atual presidente do INEP, pelo presidente do CONSED e secretário da educação do Espírito Santo, Vítor de Angelo, e por Ricardo Enriques, presidente da Fundação Unibanco e especialista em educação.

Após uma boa introdução ao tema por Fernandes, Palácios comentou que o ENEM está congelado em seu formato e metodologia desde 2009 e que mereceria ser revisado, mencionando as mudanças por que passou o EM recentemente; Angelo mencionou a urgência da reforma do exame, já que os estudantes do ensino médio estão recebendo uma formação distinta daquela que existia quando o exame foi formulado, incluindo agora os chamados itinerários formativos opcionais; e Enriques, questionou se manter o modelo atual ou uma alteração descuidada poderiam levar o exame a ter impactos na equidade do acesso ao ensino superior.

Em entrevista no início de agosto[1], o ministro Camilo Santana afirmou que o ENEM não seria alterado até que as propostas para o Novo Ensino Médio sejam discutidas e aprovadas (ou não). O ministro, pensamos, está correto, e por mais de uma razão. Entre elas, porque a lógica por trás do pedido de urgência por mudança não se justifica, mas há outras, discutidas a seguir.

O que falta ao debate é explicitar claramente qual é o objetivo do exame; isso posto, muito do debate em curso deixa de ser relevante. O ENEM não é avaliação do ensino médio, nem de escolas nem de sistemas ou subsistemas; é, exclusivamente, avaliação individual de estudantes para fins de seleção ao ensino superior. O INEP reconheceu isso quando, em 2017, deixou de divulgar médias das notas do ENEM das escolas, que a imprensa utilizava para criar rankings[2]. Especialistas foram ouvidos pelo INEP, que tomou a decisão correta.

Para avaliar o ensino médio, existe o SAEB de 3º ano desse ciclo. Em que esse exame difere do ENEM? Isso precisa ser explicitado e explicado, pois já começaram as sugestões de mudar o ENEM e deixar de realizar o SAEB. O INEP, em sua justificativa para suspender a divulgação das notas das escolas, diz:

“Para o Inep, o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) tem instrumentos mais adequados para a avaliação da qualidade da educação ofertada nos sistemas de educação e nas escolas brasileiras. Para fortalecer esse entendimento, desde 2017 o Saeb ampliou a aplicação da prova para o ensino médio da rede pública, tornando-a censitária.”

Os detalhes da justificativa não cabem nessa nota, mas incluem: cada aplicação do SAEB conta um conjunto de itens muito maior do que o ENEM, cobrindo toda a matriz de avaliação da formação, tanto em termos de proficiências como de nível de dificuldade. Estudantes não fazem todos uma prova única, mas uma amostra das questões, e os resultados são consolidados e fornecem os escores por escola/sistema. Análise estatística a posteriori pode eliminar respostas de estudantes consideradas inválidas, algo impossível de se fazer em um exame do tipo ENEM. Itens são pré-testados, o que geraria problemas de segurança em prova competitiva como o ENEM (já aconteceu). Esse processo melhora a qualidade da avaliação em vários aspectos. Um deles é que o SAEB tem uma escala de proficiência estabelecida por critério, ou seja, sabe-se onde estaria uma escola ou um sistema em termos de proficiência da formação, por exemplo, se o nível dos estudantes é mesmo de 3º ano ou de anos anteriores. Nada disso é feito ou é possível de se fazer no modelo do ENEM, que avalia desempenho individual e não proficiência de grupos de estudantes[3].

Voltando ao ENEM: o modelo atual está defasado e precisa ser reformulado? Talvez, mas não há nenhum estudo que aponte de forma clara que o exame é deficiente para seu objetivo central, novamente, de selecionar estudantes para o ES. Pode ser que seja, ou pode ser que não seja. Voltemos ao argumento que vem sendo levantado para justificar a necessidade e a urgência da reforma: o ENEM atual não avalia a formação em itinerários opcionais possibilitados pelo chamado Novo EM. De fato, mas, cabe a pergunta: é possível se avaliar tais formações, que podem ser muitas, inclusive de caráter aplicado e profissionalizante, em provas escritas? E a questão da formação técnica, adotada como alternativa na reforma, não deveria então também ser avaliada no ENEM, para não deixar os que nela seguiram em condição desigual quanto ao acesso ao ES? Lembremos que os IFETs e CEFETs utilizam o ENEM para o acesso, também. E, por que não pensar em incluir outros aspectos da formação, que vão além daqueles de caráter diretamente ligados aos conteúdos, como capacidade de trabalhar em grupo, capacidade de se expressar oralmente, etc, etc, etc?

Alguns dirão que isso seria totalmente fora do alcance de uma prova escrita. De fato, e é por essa razão que muitos países utilizam, além de exames ao final do ciclo, as avaliações desenvolvidas ao longo do EM, de todos os tipos. Por exemplo, nos Estados Unidos, as notas do EM sempre foram consideradas e, recentemente, exames do tipo ENEM (SAT) vêm sendo abandonados pelas universidades em seus processos seletivos, inclusive por algumas das mais seletivas[4]. Na Alemanha, todas as notas dos últimos dois anos do EM, inclusive de educação física, contam para o processo seletivo, juntamente com exames ao final, realizados pelas escolas, incluindo provas orais e escritas. Ou seja, se o argumento for, de fato, que o atual ENEM não avalia toda ou a maior parte da formação proporcionada pelo EM, o veredito é que nenhuma bateria de exames escritos, aplicada ao final ou após a conclusão do EM, cumprirá essa missão. Ou seja, precisamos reformar o sistema de seleção e não apenas prova usada para esse fim.

Um sistema que incluísse as avaliações desenvolvidas ao longo do EM teria uma grande vantagem sobre o modelo atual: o treinamento para o ENEM, seja qual for seu modelo, deixaria de ser o único objetivo de muitas escolas, valorizando-se não só o processo de aprendizagem como modelos variados de avaliação, ou seja, os muitos anos de trabalho de estudantes e professores. Aos que dizem que isso é impossível, estudos mostram que as notas obtidas na escola são melhores preditores, em geral, das chances de estudantes concluírem seus cursos superiores, do que exames do tipo ENEM[5].

Concluindo: o ministro tem razão, esperemos a finalização dos debates sobre o EM e, até lá, quem sabe, façamos um bom estudo sobre se o atual ENEM cumpre seu papel de selecionar estudantes para o ES, os dados estão na mão do INEP, ou seja, do MEC. E, seja qual for o veredito, não seria interessante pensar em novos modelos de seleção para o ES, que fossem além de uma bateria de provas do estilo ENEM, atual ou reformado, como fazem muitos países?

Notas


[1] https://educacao.uol.com.br/noticias/2023/08/02/ministro-educacao-camilo-santana-uol-entrevista.htm

[2] http://portal.mec.gov.br/component/tags/tag/enem-por-escola

[3] Sobre essa diferença, ver OECD (2018). PISA 2018 Technical Report, Chapter 15. OECD site. https://www.oecd.org/pisa/data/pisa2018technicalreport/

[4] https://www.nytimes.com/2021/05/15/us/SAT-scores-uc-university-of-california.htm

[5] Chapter 6: Test Scores and High School Grades as Predictors, em Bowen, W.G., M.M. Chingos e M. McPherson (2011). Crossing the Finish Line. Princeton Un. Press, Princeton, NJ, EUA.

Meia Volta, Volver!

(publicado em O Estado de São Paulo, 11 de agosto de 2023)

O Ministério da Educação acaba de divulgar os resultados da consulta pública sobre a reforma do ensino médio, e a proposta principal é voltar à década de 60, em que os poucos que chegavam a este nível optavam pelo curso científico, para fazer depois engenharia ou medicina, ou clássico, para os que queriam fazer direito ou literatura. Agora se fala em percursos de “linguagens, matemática e ciências da natureza” e “linguagens, matemáticas e ciências humanas e sociais”, o que é mais um menos a mesma coisa, fora a matemática. Além destes se admite agora um terceiro percurso, “formação técnica e profissional”.

A ideia central da reforma era que hoje, com a universalização do acesso, o ensino médio não poderia continuar sendo somente um filtro para os poucos que fossem para as universidades, mas um sistema amplo e diferenciado para jovens que poderiam seguir diferentes trilhas de formação. O dilema era entre oferecer quase o mesmo para todos, como no currículo tradicional, eliminando os que ficassem para trás, ou oferecer alternativas que que dessem a todos oportunidades de estudar e se desenvolver, ainda que por caminhos distintos. Por trás deste dilema havia, e ainda há, a realidade de que a maioria dos estudantes brasileiros chega ao ensino médio com formação precária, mais velhos e precisando trabalhar. Submeter todos ao mesmo regime e a um exame nacional comum, como o ENEM, significa reforçar a discriminação em nome da igualdade.

A reforma de 2017 procurou avançar, mas com muitos defeitos e resistências. Na proposta inicial, em vez de quatro diárias horas de aula, haveria pelo menos cinco, perfazendo três mil horas de curso em três anos. No lugar de um currículo único recheado de matérias fragmentadas, 800 horas seriam dedicas o desenvolvimento de competências gerais, sobretudo de linguagens e matemática, dadas de forma integrada, e as demais ao aprofundamento dos conteúdos em diferentes trajetórias. Quando a lei foi aprovada, esta parte comum passou a ser de 1800 horas, e agora pretende-se que passe para 2.100 ou 2.400 horas, ficando somente 600 a 900 horas para os percursos diferenciados, invertendo a ideia inicial. Seriam mais horas, naturalmente, nas escolas de tempo integral, em que o tempo se dividiria meio a meio entre a formação geral e os percursos.

Um dos erros da lei da reforma de 2017 foi que ela destinava recursos para o ensino de tempo integral, mas ignorava totalmente a questão do ensino noturno. Agora, o tempo integral continua sendo apresentado como a grande panaceia para a educação brasileira. Os dados do Censo Escolar de 2020 mostram que naquele ano havia 9.5 milhões de estudantes no ensino médio, dos quais 2.7 milhões em cursos noturnos. Existem duas razões para tantos alunos estudando à noite. A primeira é que muitas vezes não existem escolas separadas para o ensino médio, os cursos são dados à noite nas instalações do ensino fundamental. A segunda é que muitos estudantes são mais velhos, precisam trabalhar, e não podem passar o dia na escola. Quatro horas de aula por dia, em cursos noturnos, é insuficiente, mas 8 horas diárias, em que o estudante chega cedo e volta para casa no fim do dia de barriga cheia e banho tomado, pode ser o ideal para crianças em determinadas áreas, mas não necessariamente para jovens adultos.  Para o ensino médio regular, regimes de 5 ou 6 horas diárias, se bem empregadas, são mais do que suficientes. E o ensino técnico deve ser dado, de preferência, no regime de aprendizagem, em que o trabalho, a renda e a qualificação profissional andem juntos. O tempo integral não é o caminho para o ensino técnico, como se pode ver nos poucos estudantes que conseguem ser admitidos nos Institutos federais e aproveitam para se preparar para tirar boas notas no ENEM. 

O outro erro da reforma de 2017 foi a grande confusão criada pela adoção de uma classificação esdrúxula das áreas de conhecimento que ignorava a prática quase universal de distinguir quatro grandes áreas de formação – ciências físicas e engenharia (STEM), ciências biológicas e de saúde, ciências e profissões sociais, e letras, artes e humanidades. Uma maneira simples de implementar o novo currículo seria oferecer em todas as escolas estas quatro áreas, permitindo que os alunos escolhessem uma como “major” e seguissem as demais de forma complementar. Mas a proposta que vem da consulta, e que o MEC está endossando, é ampliar ainda mais a parte de formação comum, com um pot-pourri de matérias tradicionais como geografia, química e filosofia, mas excluindo temas essenciais como estatística, economia e direito, e voltar à divisão arcaica entre “ciências” e “humanidades” dos anos 60.

Finalmente, o ENEM. Em última análise, o que determina o que as escolas vão ensinar e os alunos estudar é o que é exigido na avaliação. Sistemas diferenciados requerem múltiplas provas e certificações que os alunos podem escolher. Manter um exame final único, como o ENEM, é garantir que todos os esforços de oferecer alternativas cairão no vazio.

Freio de Arrumação no Ensino Médio

(Publicado em O Estado de São Paulo, 14 de abril de 2023)

Finalmente, o Ministério da Educação viu que a reforma do ensino médio não andava bem, e deu uma parada. Agora se discute se ela deveria ser anulada ou se dá para consertar, mas pouco se fala sobre porque foi feita, e os problemas que tentou resolver.

(Já escrevi inúmeras vezes sobre os temas da reforma do ensino médio, dos itinerários, dos parâmetros curriculares, da necessidade de reformar o ENEM, do ensino profissional, etc., participando de um debate que já deveria ter amadurecido. Volto ao assunto agora porque ele voltou à agenda, e na esperança de que, de tento repetir, alguém preste atenção….. para ver os artigos anteriores publicdos aqui, basta clicar em “ensino médio” no alto à esquerda do blog).

O ensino médio tem que atender a uma população de quase 10 milhões de pessoas em condições, interesses e projetos de vida muito diferentes, e não é possível que todos sigam o currículo tradicional que vem dos tempos de Gustavo Capanema 80 anos atrás. Era um currículo destinado aos filhos das elites que se preparavam para as profissões universitárias, quando a grande maioria mal completava um curso primário de quatro anos.

Aos poucos, o acesso à educação primária aumentou, até quase se universalizar na década de 1990, tendo como foco a capacitação inicial em leitura, escrita e aritmética. O ensino superior também se expandiu. Falava-se em “universidade para todos”, para o qual o ensino médio seria a porta de entrada. O antigo ginásio, para crianças entre 11 e 14 anos, se incorporou ao primário, ficando como o patinho feio da educação brasileira, espremido entre os que se preocupam com a alfabetização, em uma ponta, e com o ensino médio e o acesso ao ensino superior na outra.

Mas a educação brasileira cresceu de forma muito desigual. Uma pequena minoria consegue completar razoavelmente bem o ensino médio unificado, em escolas particulares ou em poucas escolas públicas seletivas, e entra nas carreiras universitárias mais valorizadas. A grande maioria mal cumpre as obrigações mínimas dos currículos obrigatórios e, ou fica com um diploma de nível médio sem qualificação profissional, ou tenta uma carreira superior de fácil acesso, mas com grandes chances de ficar pelo caminho e não se profissionalizar.

Em todos os países existem desigualdades na educação, porque as pessoas vêm de ambientes diferentes e têm interesses e capacidades distintas. As escolas podem pouco para compensar as diferenças que os estudantes trazem, e as melhores politicas educacionais são aqueles que buscam compensar estas diferenças o mais cedo possível. Não é à toa que o exame de Pisa, adotado em quase todo o mundo para aferir a qualidade da educação, é aplicado a jovens de 15 anos, quando devem estar completando a educação fundamental, e já deveriam ter os conhecimentos fundamentais de leitura, raciocínio matemático e formação geral nas ciências naturais, sociais e humanidades.  Muitas das críticas que têm sido feitas à reforma do ensino médio de 2017 é que ela deixaria de dar a educação geral que seria necessária para todos. Mas é no ensino fundamental, até aos 15 anos, e não no médio, que esta formação geral precisa ser dada.

Aos 16 ou 17 anos de idade, que é quando a maioria dos jovens brasileiros entra no ensino médio, as cartas já estão dadas. Pretender que todos vão seguir o mesmo caminho e se tornar universitários é condenar a grande maioria à frustração. Dividir desde cedo entre os que seguirão os cursos universitários e os destinados aos cursos técnico-profissionais, como tem sido feito na maioria dos países na Europa e Ásia, pode ser mais eficaz, mas mantém a sociedade divida em classes, e com os menos qualificados sujeitos às incertezas de um mercado de trabalho em permanente sobressalto.

O caminho é oferecer um leque de escolhas, reconhecendo que existem diferenças, mas sem colocar a população em camisas de força. Para os que pretendem entrar desde logo em carreiras universitárias, é preciso permitir que se direcionem desde logo para suas áreas de preferência. É possível desenhar os currículos de muitas maneiras, mas, basicamente, são quatro opções: a formação nas áreas técnicas de matemática e engenharia: nas ciências biológicas e da saúde: nas profissões sociais como administração ou direito: ou nas artes e humanidades, escolhendo uma como principal e outras como secundarias. 

Para os que precisam trabalhar mais cedo, não têm interesse ou condições de seguir desde logo a trilha universitária, deve ser possível oferecer uma formação mais prática e valorizada no mercado de trabalho.  Um bom curso profissional de nível médio ou pós-secundário pode ser tão ou mais interessante do que muitos diplomas universitários. As redes públicas estaduais não sabem fazer isto, é preciso trazer a ajuda do Sistema S e de algumas poucas escolas técnicas estaduais, e fortalecer o sistema de aprendizagem em parecerias com o setor produtivo.  E é preciso abrir mais espaços na educação superior, pela ampliação da formação mais prática e aplicada também neste nível.

Não há como amarrar tudo isto em currículos fixos, mas é possível direcionar as mudanças através de um conjunto de exames e certificações que substituam o atual Enem, nas quatro áreas principais de formação e nas principais áreas de qualificaçõ profissional, como tecnologia da informação, profissões de saúde, eletrônica, etc., deixando as redes escolares buscarem seus próprios caminhos.

O Apagão do Ensino Médio

(publicado em O Estado de São Paulo, 11 de março de 2022)

Levantamento recente da Secretaria de Educação de São Paulo mostra o impacto da pandemia no ensino médio do Estado, que já não vinha bem. Em Língua Portuguesa, em 2019, os alunos que terminavam o ensino médio já estavam, em média, 3,83 anos atrasados em termos do que haviam aprendido, ou seja, sabiam menos do que o esperado no 9.º ano do ensino fundamental. Em 2021, este atraso havia aumentado para 4,24 anos. Em Matemática, o atraso, que era de 5,14 anos, aumentou para 6,53 anos, ou seja, tinham o nível próximo ao esperado no 5.º ano. É provável que, no resto do País, o impacto tenha sido maior (o impacto mais dramático, no entanto, foi entre os alunos da 5a série, como se pode ver no gráfico, com dados extraídos da publicação da Secretaria de Educação).

É assim que estes estudantes estão entrando, em 2022, no novo ensino médio, estabelecido em 2017. Pela lei, os estudantes que entram no ensino médio como um caminho para o ensino superior deveriam escolher as áreas de estudo de sua preferência; para a maioria, sobretudo da rede pública, que não irá além do nível médio, seria possível obter uma qualificação profissional valorizada no mercado de trabalho. E, para todos, haveria mais espaço para fortalecer as competências básicas gerais, como os conhecimentos essenciais de linguagem e raciocínio matemático. A intenção foi boa, mas a lei ficou confusa, e caberia ao Ministério da Educação liderar a transição para o novo sistema, resolvendo as ambiguidades e apoiando as redes neste processo. O ministério se omitiu, e cada Estado está tratando de fazer as mudanças como pode. 

A omissão do governo federal tem que ver com a incompetência e hostilidade do governo Bolsonaro em relação aos temas de ciência, cultura e educação, mas também com uma forte resistência do establishment educacional aos dois objetivos da reforma. Esta resistência se deu e ainda se dá em dois níveis, o das ideologias e concepções e o das dificuldades práticas que a reforma acarreta, que me parece o mais importante. 

A oposição à diferenciação de trajetórias se manifesta muitas vezes na forma de defesa do direito à educação, que seria afetado se o estudante tivesse um currículo mais direcionado. Ela veio, também, associada ao temor de que a flexibilização dos currículos afetaria a rotina e o emprego de professores de filosofia, sociologia, educação física, religião e tantos outros que têm asseguradas suas horas de ensino nos currículos tradicionais. O resultado foi aumentar, na lei, o tamanho e os conteúdos da parte de formação comum do ensino médio, e adotar, para os diferentes itinerários de formação, uma classificação formal e arbitrária de áreas de conhecimento (linguagem, Matemática, ciências da natureza, ciências sociais), ao invés de temas mais próximos das áreas de formação profissional (tecnologia e engenharia, ciências da saúde, profissões sociais, humanidades), como se dá no resto do mundo. 

Nem tudo estava perdido, porque é o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) que define o que fazem, na prática, as escolas do ensino médio. Pensando nisso, o Conselho Nacional de Educação (CNE) desenvolveu uma proposta para um novo Enem, que consistiria em duas partes, a primeira de competências gerais, semelhante ao Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), e a segunda com opções nas quatro áreas de formação profissional. 

Mas o Ministério da Educação, com o apoio de associações como o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), acabou adotando um projeto diferente. São, também, duas partes, a primeira juntando todo o conteúdo da parte geral e a segunda com quatro módulos diferentes à escolha dos alunos, combinando as diferentes áreas formais de conhecimento. É uma proposta confusa, carregada de linguagem pretensiosa (“intervenção social”, “articulação de competências”, “interdisciplinaridade”, etc.), tecnicamente duvidosa e que mal esconde a resistência à inovação. 

O principal argumento ideológico contra a reforma do ensino técnico é de que ele estaria subordinando a educação ao mercado de trabalho (horror!), abandonando o suposto ideal gramsciano de “politecnia”. Esta reforma deveria ter sido acompanhada de uma política efetiva de fortalecimento dos vínculos entre as redes estaduais e os sistemas de formação profissional existentes, como os do sistema S e o sistema Paula Souza, em São Paulo, e da implantação progressiva de um sistema nacional de certificações de competências profissionais, em parceria com o setor produtivo, que pudesse dar rumos e valorizar as carreiras vocacionais. 

Além disso, deveria haver um esforço de ampliação e qualificação de um sistema moderno de aprendizagem profissional e do ensino superior de curta duração, que dariam continuidade à formação técnica de nível médio. Ao invés disso, o que se viu foi uma preocupação em manter o ensino técnico integrado ao currículo tradicional, como uma formação elitista só possível para os poucos institutos tecnológicos federais que, na prática, selecionam e preparam seus estudantes para as carreiras universitárias. 

É este o apagão do ensino médio brasileiro em 2022: uma reforma confusa, sem ter quem a lidere e com alunos prejudicados por dois anos de escolas fechadas. Seria um bom tema para as campanhas eleitorais, se os políticos realmente se interessassem por educação. 

É quase fim do ano: onde estão os nossos jovens?

(Publicado em O Estado de São Paulo, 12/11/2021)

Este deveria ser o ano em que as escolas concluiriam os preparativos para dar início, em 2022, ao novo ensino médio. É também o segundo ano da pandemia, em que elas ficaram fechadas ou oferecendo ensino à distância de qualidade e eficácia desconhecidas. Muitos jovens abandonaram os cursos, e muitos mais ficaram mas aprenderam pouco ou nada. Os candidatos ao ENEM, que em 2016 eram mais de 8 milhões, caíram para a metade em 2021. Este número já vinha caindo, com a percepção crescente de que o roteiro tradicional do ensino médio único aos cursos universitários tradicionais, que já era inacessível para a maioria da população, se tornou mais difícil ainda.

O lei do novo ensino médio foi uma tentativa de tornar o ensino médio  mais significativo, abrindo a possibilidade de diferentes itinerários formativos, e criando uma ampla oferta de ensino técnico-profissional para os que buscassem uma qualificação mais prática e mais acessível. Agora, além de ter que introduzir o novo currículo, as escolas terão que lidar com milhões de estudantes que ficaram fora da escola ou aprenderam ainda menos do que antes. O que farão? Como estão se preparando para recuperar os anos perdidos? Como será, na prática, este novo ensino médio tão anunciado?

O Ministério da Educação deveria estar liderando esta transição, mas, de onde menos se espera, daí é que não vem nada mesmo.  As secretarias estaduais têm tomado a iniciativa, preparando os currículos para os diferentes itinerários e organizando a oferta de ensino técnico-profissional. Algumas já publicaram suas conclusões, que, embora diferentes entre si, parecem ter algumas coisas em comum. Todas supõem que o regime de 3 mil horas, ou 5 horas diárias, estará implantado, e várias anunciam que darão prioridade às escolas de tempo integral, de 8 horas. Todas anunciam novos conteúdos e atividades como projeto de vida, empreendedorismo, sustentabilidade, vida futura, cultura digital. Nada contra, deste que não seja à custa da iniciação apropriada nas disciplinas acadêmicas centrais para os diferentes  itinerários. Para estes itinerários, poucas conseguem se desvencilhar da estranha classificação das áreas de conhecimento inventada pelo MEC e avançar em opções focadas nos temas de tecnologia e engenharia, profissões sociais, ciências da vida e humanidades, como no resto do mundo. E, para o ensino técnico, alguns estados planejam dar prioridade a algumas áreas  – eletrotécnica, agronegócio, administração, etc. – e abrir espaço tanto para cursos técnicos mais longos quanto curtos, na antiga modalidade de formação inicial continuada (FIC); mas poucas dizem como vão fazer isso.

Na pressa, é compreensível que os currículos sejam tratados com prioridade, mas chama atenção a ausência de informações sobre como as redes pretendem lidar com a enorme diversificação de seus estudantes, como esperam preparar seus professores lidar com o novo formato, e como  vão tentar compensar o impacto da epidemia na formação dos estudantes que vão receber. Fala-se muito em educação profissional integrada e estudo em tempo integral, mas  não se considera que 20% dos alunos de ensino médio regular nas redes públicas estudam à noite, que um terço tenha 18 anos ou mais (dados do Censo Escolar), e que 30% trabalham (dados da Pnad Continua). Sem falar nos cerca de 1,2 milhões que estão hoje matriculados nos cursos médios de educação de jovens e adultos (EJA), reconhecidamente precários. Estes estudantes mais velhos, que estudam à noite, trabalham e estão nos cursos de EJA, deveriam ser os principais beneficiários de cursos técnicos mais práticos, em tempo parcial e com uso apropriado de tecnologias de ensino híbridas, em carreiras com boas perspectivas de emprego mais imediato, e não me parece que estejam sendo devidamente considerados.

Organizar itinerários de formação é menos uma questão de currículo do que da existência de professores que tenham uma concepção clara da formação que se deseja proporcionar e possam liderar este trabalho. Nossos professores, no melhor dos casos, podem ensinar bem as respectivas matérias, mas seria preciso um trabalho intenso e coordenado de identificação e capacitação de coordenadores de área com esta visão mais ampla. Para o ensino técnico, é preciso professores com um perfil muito diferente dos que se formam pelas licenciaturas tradicionais, que possam combinar experiência de trabalho com capacidade de ensino, assim como de convênios de cooperação entre as redes escolares e instituições especializadas, com destaque para as dos sistemas nacionais de aprendizagem.

É bom que cada estado esteja buscando seu caminho, mas, sem a âncora  de um sistema adequado de avaliação e certificação de competências, que substitua o atual ENEM, cada um continuará atirando para um lado, sem saber bem os alvos a que devem mirar. A lei do novo ensino médio desorganizou um sistema que estava ruim, mas ainda não se sabe se isto resultará em um outro melhor.

ENEM: avaliação ou seleção?

(Publicado em O Estado de São Paulo, 9 de julho de 2021)

Em 2022 entra em vigor o novo ensino médio, com a possibilidade de os estudantes optarem por diversas áreas de formação e também por cursos técnico-profissionais, o que significa que o Exame Nacional do Ensino Médio deverá também mudar. Em sua origem, o ENEM tinha por objetivo ser uma avaliação, referência de qualidade para as escolas de ensino médio. Mas em 2009 ele se transformou em um exame nacional de seleção para as universidades federais, o que fez com que todas as escolas se organizassem para preparar seus alunos para a prova. Atualmente, as redes escolares públicas e privadas estão se organizando para dar início ao novo ensino médio, e uma das dificuldades é não saber que tipo de avaliação os estudantes terão pela frente.

O Ministério e o Conselho Nacional de Educação estão trabalhando sobre o tema e é provável que cheguem a alguma conclusão nos próximos meses, o que influenciará o destino de milhões de jovens nos próximos anos. É a oportunidade para avaliar a experiência até aqui à luz das experiências de outros países e entender melhor para que serve este exame e quais seriam as alternativas.

O que deve ser o ENEM? Uma avaliação dos alunos que terminam o ensino médio, ou um grande exame vestibular para as universidades? Qual a diferença e qual a importância disso? Muitos países, sobretudo na Europa, têm sistemas nacionais de avaliação dos alunos ao término do ensino médio, como os Baccalauréats franceses, o Abitur alemão, os A-Levels ingleses e os exames nacionais do ensino secundário em Portugal. Mas poucos têm um grande exame vestibular nacional como a China, a Turquia, o Chile e o Brasil. 

São coisas muito diferentes. As avaliações nacionais marcam o término do ensino médio, especificando que tipo de formação os alunos tiveram e que resultados alcançaram, enquanto que os exames são provas de ingresso ao ensino superior para pessoas já formadas. Nas primeiras, há um leque de opções que os alunos fazem conforme seus interesses e as áreas de concentração, mais acadêmicas ou mais profissionais. Nos segundos é uma prova só. A outra diferença é que, nas primeiras, os resultados das provas influenciam o acesso dos estudantes ao ensino superior, mas as universidades mantêm sua autonomia para selecionar seus alunos entre os que se qualificam, combinando com outros critérios. A terceira diferença é que, além das provas que habilitam para o ensino universitário, há outras que habilitam para atividades profissionais e cursos técnicos pós-secundários. Nos Estados Unidos não existe nem uma coisa nem outra. Algumas instituições privadas oferecem testes padronizados para pessoas que querem se candidatar ao ensino superior, como o Scholastic Assessment Test, American College Test e o Graduate Record Examination, que as universidades e escolas superiores podem usar ou não, com maior ou menor peso. 

Quando o ENEM se transformou em um vestibular nacional, a ideia foi que ele ajudaria a democratizar o ensino superior, fazendo com que os estudantes, com uma só prova em sua cidade de residência, pudessem se candidatar a qualquer universidade federal do país. Mas a prova única acabou criando uma grande discriminação a favor dos filhos de famílias mais educadas e que estudaram em escolas privadas, que conseguem as notas mais altas e entram nas universidades e carreiras mais prestigiadas. São menos de 300 mil vagas para 6 milhões de candidatos a cada ano, com problemas operacionais que se repetem. Nem o sistema de cotas consegue tornar o sistema mais igualitário, porque todos necessitam médias altas para conseguir uma vaga.

Com a diversificação do ensino médio, a prova única do ENEM não pode continuar existindo. Mas o Brasil não tem ainda condições de criar um sistema de provas nacionais qualitativas como as dos países europeus, que decidem quem se forma, e com que nota ou conceito. Faz mais sentido um sistema como o norte-americano, em que as escolas continuam dando os diplomas, mas os estudantes podem se apresentar, voluntariamente, para avaliações que produzem certificados de competência que podem ser utilizados pelas universidades para selecionar seus alunos e também para o exercício de profissões técnicas. Uma destas avaliações deve ser de tipo mais geral, para todos, de competência no uso da linguagem, raciocínio matemático e conceitos básicos de ciências sociais e naturais, semelhante ao exame de PISA, ou o GRE geral americano. Outras serão mais específicas, alinhadas com as grandes áreas profissionais de nível superior, como ciência e tecnologia, ciências da saúde, ciências sociais e letras e humanidades. E outras mais específicas ainda, de certificação de competência técnica em áreas como serviços de saúde, processos industriais, informação e comunicação e gestão de negócios. Estes exames não precisam ocorrer no mesmo dia, nem precisam ser feitos todos pelo MEC.  

É este o caminho que deveria ser seguido, saindo da camisa de força do atual ENEM.

Os itinerários do novo ensino médio

(Publicado no jornal O Estado de São Paulo, 11 de junho de 2021)

Em 2022, finalmente, o ensino médio brasileiro deverá começar a adotar o novo formato estabelecido pela reforma de 2017. A ideia continua importante. Ao invés de um currículo tradicional, rígido e amarrado às provas do ENEM, criar alternativas diferentes de formação conforme os interesses e as condições dos milhões de jovens que chegam ao ensino médio. Ao invés de dificultar a formação profissional, torná-la mais acessível, como uma das alternativas de formação neste nível. É assim em todo o mundo. 

Mas como fazer isto? Na falta de uma orientação clara por parte do governo federal, as secretarias de educação, escolas e redes de ensino estão procurando alternativas, no meio ao emaranhado de leis, bases curriculares, resoluções, diretrizes e o novo palavreado introduzido pelo MEC e o Conselho Nacional de Educação nos últimos anos – itinerários formativos, formação integrada, projetos de vida, diversificação, competências, mediação sociocultural, empreendedorismo… 

Parte da confusão tem a ver com uma estranha classificação das áreas de conhecimento adotada pelo MEC, tirada não se sabe de onde, que acabou entrando na base nacional curricular e na lei como definidora dos diferentes itinerários de formação. Estas áreas seriam “linguagens” (uma salada que inclui inglês, educação física, dança, língua portuguesa e tecnologias de informação), “ciências da natureza”, “ciências humanas” e “matemática”, cada uma (menos as ciências humanas) com “suas tecnologias”. A interpretação literal da legislação indica que estas áreas deveriam ser também os “itinerários formativos” a serem oferecidos, sobrando ainda um “5º itinerário”, que seria o da educação técnica ou profissional.

Basta olhar o que fazem outros países para ver que isto não faz sentido. Em Portugal e na França, por exemplo, existem pelo menos três modalidades diferentes de ensino médio, cada uma oferecendo diferentes opções. A primeira é o que se chama de “propedêutica”, de preparação para os cursos universitários. A segunda é a formação tecnológica, voltada para atividades profissionais mais complexas no mundo dos serviços, da indústria e das novas tecnologias. E a terceira é a formação denominada “vocacional”, mais simples e diretamente orientada para o mercado de trabalho.

Na França, a primeira modalidade, que culmina nas provas do “baccalauréat générale”, inclui três opções: ciências naturais; ciências econômicas e sociais; e literatura. Em Portugal, as opções são ciência e tecnologia; ciências socioeconômicas’; línguas e humanidades; e artes. O que estas áreas têm em comum é que elas são internamente coerentes, e preparam os alunos para os tipos de formação universitária e vida profissional que pretendem seguir. Ninguém se forma em “linguagens e suas tecnologias”; a matemática nunca vem sozinha, mas sempre junto com a tecnologia ou as ciências naturais e sociais; e existe uma clara separação entre as ciências sociais e as humanidades. Uma leitura mais atenta da lei brasileira mostra que, felizmente, as escolas não são obrigadas a se organizar conforme as “áreas” do MEC, e podem criar itinerários integrados semelhantes aos que existem no resto do mundo. É o que deve ser feito.

Das outras duas modalidades, o que no Brasil se chama de “educação técnica”, com quase duzentas opções diferentes listadas em um catálogo feito pelo MEC, é mais parecido com os cursos vocacionais europeus do que com os cursos de conteúdo tecnológico, que ficaram esquecidos (embora o termo “tecnológico” seja utilizado entre nós para denominar os cursos superiores curtos, qualquer que sejam seus conteúdos).  Em outros países, e que dá robustez à formação tecnológica, oferecida desde o ensino médio, é que ela é mais prática e aplicada do que a formação acadêmica, se desenvolve em parceria com o setor produtivo, e dá acesso a cursos superiores de curta duração, para quem quiser continuar se aperfeiçoando, em áreas como ciência e tecnologia da saúde e bem-estar social, agronomia, design e artes plásticas, atividades industriais, alimentação e gestão e outras. Os cursos vocacionais são mais simples, voltados sobretudo a atividades de serviço e manutenção, e destinados a pessoas que necessitam trabalhar de forma mais imediata e não têm condições de seguir cursos mais complexos.

A outra característica importante do ensino diversificado no resto do mundo é que não se trata, simplesmente, de diferentes arranjos curriculares, mas de escolas públicas e privadas que se especializam em determinadas áreas e tipos de formação. Algo disto já existe no Brasil, com algumas redes de escolas técnicas como as do Sistema Paula Souza e do Sesi-Senai, ou a escola ORT no Rio de Janeiro.  A decisão sobre que itinerários formativos oferecer é também uma decisão sobre como as escolas do ensino médio deverão se reorganizar, identificando as características e necessidades de seus alunos, buscando parcerias e se capacitando para melhor atendê-los. É só um primeiro passo.

Quebrando o gargalo do ENEM

(versão revista de texto publicado em O Estado de São Paulo, 11 de dezembro de 2020)

Dizem que a vida vai voltar ao normal. E em 2021 o Ministério da Educação pretende começar a implantar o novo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), com duas modificações importantes. A primeira, desde já, é o “Enem seriado”, em que os alunos do ensino médio serão avaliados a partir do primeiro ano, com uma nova versão da Prova Brasil. A segunda, a partir de 2024 ou 2025, é a adaptação do Enem à reforma do ensino médio, que prevê que os estudantes possam escolher seus itinerários de formação. Como a maioria dos candidatos ao Enem não vem diretamente do ensino regular, a prova geral vai continuar existindo, ao lado do sistema seriado, divida em duas partes: uma comum, para todos os estudantes, e outra diferenciada, para os diferentes itinerários (no sistema seriado, a previsão é que a avaliação dos itinerários opcionais seja feita no terceiro ano)

Imagino que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) tenha estimado o custo desse novo formato, a maneira como os resultados das avaliações seriadas vão ser utilizados para melhorar a qualidade do ensino e como compatibilizar os dois sistemas para que um não se torne mais valorizado do que o outro. Digo “imagino” porque não encontrei nenhum documento oficial que explique mais em detalhe as razões e os custos dessa mudança.

Tomara que o Ministério da Educação (MEC) saiba o que está fazendo, mas há pelo menos três coisas importantes que precisariam ser discutidas antes de embarcar nesse caminho sem volta. A primeira é se precisamos realmente continuar tendo um vestibular nacional unificado como o Enem. Quando o exame foi criado, em 1998, o objetivo era ter um marco de referência de qualidade para o ensino médio brasileiro, como a Prova Brasil. Em 2009 ele se transformou em vestibular nacional e as universidades renunciaram à sua autonomia e responsabilidade por selecionar seus estudantes. A justificativa foi que assim os estudantes não precisariam mais se inscrever em diferentes concursos e poderiam se candidatar a vagas em qualquer parte do país.

Mas o Enem transformou o ensino médio num grande cursinho de preparação para a prova, com resultados totalmente previsíveis – as vagas mais disputadas são quase todas ocupadas por filhos de pais de nível universitário que estudaram em escolas privadas e em algumas poucas escolas federais. O Brasil não é o único país que tem um exame desse tipo e em todo mundo se discute, hoje, se esses exames realmente medem o que pretendem – ou seja, a capacidade de o aluno adquirir uma boa formação e se transformar em bom profissional e cidadão – e se não existem formas melhores de tornar o acesso ao ensino superior melhor e mais equitativo.

No Brasil cerca de metade dos alunos que entram no Sistema de Seleção Unificada (Sisu), o mecanismo de escolha de cursos do Enem, são cotistas, mas as notas de corte para os cursos são semelhantes para cotistas e não cotistas, o que significa que elas não beneficiam quem realmente precisaria. A tendência, ao menos nos Estados Unidos, é reduzir o peso dos resultados em provas padronizadas como o ACT e fazer uma seleção mais rica e complexa dos estudantes, tomando em conta capacidade de liderança, motivação, experiência escolar, vínculo com suas comunidades de origem, etc. Essa seleção precisa ser feita pelas universidades, até para fortalecer seus vínculos com a população das regiões onde estão.

A segunda questão é se a prova comum e os itinerários formativos que o novo Enem pretende implementar estão alinhados com as intenções da reforma do ensino médio iniciada em 2017. Se a prova comum for um resumo de tudo o que estava no currículo tradicional, do português à física, passando pela filosofia e sociologia, o Enem continuará mantendo o ensino médio brasileiro na camisa de força do currículo único. E se as provas específicas, dos itinerários formativos, continuarem submetidas à esdrúxula classificação de áreas de conhecimento adotada pelo MEC, vão retirar a força da principal inovação do novo ensino médio, que são os itinerários. A sugestão é tornar a prova geral mais leve, semelhante ao Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), de competências em leitura, matemática e raciocínio científico, e alinhar os itinerários com as áreas de formação mais próximas ao mundo da educação superior e do trabalho, adotadas de forma semelhante em outros países: ciências exatas, matemática e tecnologia (STEM); ciências biológicas e da saúde: ciências e profissões sociais; e humanidades, letras e artes.

A reforma do ensino médio abriu também a possibilidade de um “quinto itinerário”, de capacitação técnica para quem precisa entrar logo no mercado de trabalho, e é necessário associar ao Enem sistemas adequados de certificação pelo menos para as áreas de formação técnica de maior demanda – enfermagem, administração, informática, agropecuária, segurança no trabalho.

A terceira questão é se não seria o caso de criar uma avaliação individualizada ao final do ensino fundamental, aos 15 anos, como faz a Inglaterra com o exame GCSE. O chamado “fundamental II” é o patinho feio da educação brasileira, é aí que os eventuais resultados de melhora dos resultados do antigo primário se perdem. Um exame desse tipo ajudaria a estabelecer um padrão de qualidade para esse nível e orientar os estudantes para que encontrem seus caminhos nos anos seguintes.

Investir e exigir mais da educação fundamental e abrir o leque de alternativas no ensino médio, quebrando o gargalo do Enem, esse parece ser o caminho que precisamos.

O ENEM de hoje e do futuro

1 – A reforma do ensino médio e o novo ENEM

Com cerca de 5 milhões de participantes arregimentados em todo o país em uma prova única, mobilizando as forças armadas e milhares de funcionários e pessoal contratado, a um custo direto estimado de 500 milhões de reais, mais os indiretos, o Exame Nacional do Ensino Médio se transformou em um grande evento sujeito a problemas reiterados de tentativas de fraude, incompreensões e questionamentos de seus conteúdos. Hoje mesmo a presidente do INEP, Maria Inês Fini, publica no jornal O Estado de São Paulo uma vigorosa defesa do exame, e anuncia as mudanças que estão por vir.  De  fato, nas novas diretrizes curriculares para o ensino médio aprovadas recentemente pelo Conselho Nacional de Educação consta a indicação de que o ENEM deverá ser modificado, com uma parte geral, correspondente à parte comum da Base Nacional Curricular do Ensino Médio, e outra com várias opções à escolha do participante, conforme seu “itinerário formativo” e a área de curso superior que pretende seguir.  

É compreensível o interesse da atual gestão do Ministério em completar este processo de reforma do ensino médio antes do fim do ano, mas talvez seja mais prudente tomar mais tempo para amadurecer a questão da reforma do ENEM que deverá ser implementada pelo próximo governo, sobretudo porque a proposta da Base Nacional Curricular Comum para o ensino médio ainda está por ser aprovada, e nada se sabe sobre os “referenciais para a elaboração dos itinerários formativos” que segundo o CNE, deveriam ser definidos pelo MEC em 90 dias.

A ideia de diversificar o ENEM, permitindo que os alunos possam escolher a área de conhecimento em que serão avaliados, é importante e compatível com o que acontece em outras partes do mundo, em que ninguém é obrigado a se preparar exaustivamente para o exame de conteúdos que não são de seu interesse prioritário.  Mas a Base Nacional Curricular Comum, como está sendo proposta, acabou ficando como uma versão reduzida do antigo currículo do ensino médio, com todo seu conteúdo de linguagem, matemática, ciências naturais e ciências sociais. Se o que está sendo proposto é fazer uma versão compacta, em um dia, do ENEM atual que dura dois dias, com o que o MEC considera serem as  “cinco áreas do conhecimento”,  e depois uma prova especializada no itinerário formativo, então o estudante continuará sendo obrigado a  se preparar para uma prova de tudo, e além disso fazer uma segunda prova especializada. Ou seja, pode ficar pior do que agora.

2 – Para que serve o ENEM?

A discussão sobre o que fazer com o ENEM não pode ser separada da pergunta mais geral de para que ele serve. A ideia inicial era que o exame poderia servir como referência de qualidade para as escolas do ensino médio, mas, hoje, ele funciona como um grande vestibular unificado para as universidades federais, e seus resultados são também em parte utilizados por algumas redes estaduais e instituições privadas (as universidades paulistas, no entanto, mantêm seus próprios sistemas de seleção); além disto, o ENEM funciona como um filtro para escolher alunos candidatos aos subsídios do Prouni. 

Acontece que estes objetivos requerem exames muito diferentes. A função de avaliar o ensino médio deixou de existir, tendo sido substituída pela a prova do SAEB, de avaliação do ensino básico, agora aplicada a todas as escolas ao final do ensino médio. O SAEB avalia competências em linguagem e matemática, e pode ser ampliado para incluir ciências, ficando semelhante ao exame internacional da OECD, o PISA (com a grande diferença de que o PISA avalia os estudantes no início do ensino médio, aos 15 anos). Por outro lado, os exames vestibulares são, além de um teste de competências específicas dos alunos conforme as carreiras que pretendem estudar, também uma maneira de selecionar um pequeno número de candidatos dentre muitos outros que poderiam igualmente se qualificar, mas para os quais não há vagas. 

Uma das virtudes do ENEM seria que ele teria democratizado o acesso ao ensino superior público, porque os estudantes poderiam fazer uma só prova e ir para qualquer instituição no país, conforme seus resultados. Na prática, os resultados do ENEM, e consequentemente do SISU, que é o sistema de distribuição de vagas nas universidades públicas, dependem fortemente da educação da família do estudante e do tipo de escola que ele frequentou.  A nota de corte para os cursos mais disputados pode ser próxima de 700 pontos, o que significa, como mostra o gráfico abaixo, que alunos de escolas estaduais e municipais com pais sem educação superior não têm praticamente nenhuma chance de ser admitidos.  Além disso, como as universidades federais quase não dispõem de alojamentos e bolsas de manutenção para estudantes de outras regiões, é muito difícil que os alunos aprovados decidam sair de suas cidades, exceto em carreiras altamente disputadas, como medicina, em que candidatos de estados mais desenvolvidos tendem a deslocar os estudantes locais de universidades em outras regiões. 

Na prática, o ENEM, no seu atual formato, serviu sobretudo  para as universidades federais  transferirem ao Ministério da Educação a responsabilidade por selecionar seus estudantes. Ao invés de democratizar o acesso, o ENEM acaba impondo a todos os candidatos do país um padrão único de qualidade que tem mais a ver com a condição social dos estudantes e suas escolas do que com sua potencialidade individual, e impede que universidades locais adotem critérios próprios e eventualmente mais flexíveis para a seleção de seus alunos. Não parece justo colocar todos os estudantes de um país sob uma mesma régua, fortemente dependente de sua condição social, para definir seu acesso ao ensino superior, e isto tem sido questionado em países que, como China, Turquia e Chile, adotam procedimentos semelhantes (veja a respeito o meu artigo publicado em colaboração com Marcelo Knobel). O sistema de cotas seria uma maneira de reduzir um pouco a estratificação criada pelo ENEM, mas, na prática, as notas de corte para os candidatos cotistas não são muito diferentes das dos alunos do sistema de ampla concorrência. Por exemplo, a nota de corte no curso de direito da UFRJ para 2018 foi de 790 pontos para 90 vagas para ampla concorrência, e 723 pontos para 20 vagas para cotistas. 

3. Alternativas

A proposta do INEP, adotada pelo Conselho Nacional de Educação, de transformar o atual ENEM único em um ENEM múltiplo, como dito antes, pode torná-lo mais difícil e complicado do que o atual.  

A alternativa é não tentar avaliar toda a base nacional curricular comum em uma prova, mas somente as competências mais gerais de leitura, raciocínio numérico e entendimento de conceitos científicos mais gerais, que pode ser a mesma para todos os estudantes que terminam o ensino médio, independentemente de seu itinerário formativo. É assim que funciona o Scholastic Aptitude Test (SAT) amplamente usado nos Estados Unidos. É um teste desenvolvido e administrado por uma fundação de direito privado, financiado pelas taxas cobradas pelos participantes, e aplicado de forma eletrônica e descentralizada várias vezes por ano. Um exame como este daria um padrão geral de referência do estudante, que poderia ser usado pelas universidades de forma complementar a seus processos próprios de seleção, e também de forma complementar para propósitos como a seleção para o Prouni ou crédito educativo. Embora trabalhosa, a metodologia para a elaboração e aplicação de um teste como este de forma eletrônica e descentralizada é conhecida, e evitaria os problemas que se repetem anualmente com a “operação de guerra” que é o ENEM.

A segunda prova, referida aos itinerários formativos, depende ainda de o Ministério da Educação conseguir superar o erro que foi fazer uso de sua questionável classificação das “áreas de conhecimento” em linguagens, matemática, ciências naturais e ciências sociais para definir os possíveis itinerários de formação do ensino médio. Faz mais sentido pensar em áreas mais próximas do mundo cultural e profissional, como STEM (matemáticas, engenharia, ciência e tecnologia), ciências da saúde, letras e artes, ciências sociais e econômicas. Estas provas poderiam ser desenvolvidas em parceria com as universidades que se interessassem, e aplicadas também de forma eletrônica e descentralizada aos alunos que optarem por carreiras nestes diferentes campos. Para os estudantes que optarem por itinerários de tipo técnico, mais vocacionais, é possível ir desenvolvendo aos poucos sistemas de certificação de competências pelas áreas profissionais respectivas, que sejam reconhecidos e valorizados pelo mercado de trabalho.

Este novo ENEM, se bem implementado, reduziria o peso do antigo currículo tradicional em benefício da avaliação de competências mais gerais, por um lado, e mais específicas para as áreas opcionais, de outro, e devolveria às universidades a responsabilidade por selecionar seus alunos, da qual elas nunca deveriam ter abdicado. Sua implantação inicial pode ser custosa, pela incorporação de novas tecnologias de avaliação decentralizada e on-line, mas, uma vez feita, acaba o pesadelo anual para os estudantes e os enormes custos e problemas da operação logística que ocorrem a cada ano. Vale a pena pensar com calma, antes de adotar a solução aparentemente simples indicada pelo Conselho Nacional de Educação

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