Publicado na Folha de São Paulo, 13 de outubro de 2014.
A campanha de Marina trouxe à luz questões centrais, que o candidato da oposição tem a tarefa de incorporar e levar adiante.
A primeira é a grave questão ambiental e climática, inseparável do problema da energia, que está longe de ser, simplesmente, um amor romântico pelo verde das florestas.
Estamos vivendo uma seca sem precedentes, com os paulistas ameaçados de ficar sem água, o petróleo substituindo as hidroelétricas e a poluição do ar das cidades se agravando, enquanto o governo desorganiza a economia do setor de energia, passando a conta para a população, incentiva a produção de automóveis que não cabem mais nas ruas, subsidia a gasolina, leva à falência a indústria do álcool e perde o controle do desmatamento.
A questão ambiental já consta do programa de governo de Aécio Neves, mas não teve ainda destaque na campanha. É de se esperar que, com a contribuição de Marina e sua equipe, ela adquira a prioridade que precisa ter.
A segunda é a crise do sistema político-partidário, que Marina prometeu superar ao dizer que faria um governo com “os bons” de todos os partidos, e ao insistir na necessidade de fortalecer a participação da sociedade na vida política do país.
Muitos consideraram a primeira proposta ingênua. Como governar sem fazer concessões aos bandidos de sempre? Sobre isto, é importante lembrar que grande parte da degradação da política brasileira dos últimos anos foi resultado da opção do PT de declarar o PSDB como seu principal inimigo e buscar aliados entre as oligarquias mais retrógadas do país, compradas por debaixo do pano. Com isto o governo perdeu não somente a possibilidade de ter o apoio do PSDB para políticas econômicas e sociais apropriadas, que não seria negado, como alienou muitos que apoiaram o PT em seu início, acreditando que ele seria, de fato, o partido da ética e dos valores sociais. Existe muito espaço e possibilidades de uma real aliança dos “bons”, que cabe agora a Aécio Neves articular.
O tema da participação da cidadania é mais difícil, mas estava presente nos protestos de junho de 2013, que Marina procurou encarnar. A ideia de que a democracia requer não somente partidos, mas formas ativas de participação, é antiga e está presente na Constituição de 1988. Ela se perverte, no entanto, quando organizações da sociedade civil se transformam em ONGs profissionais financiadas com dinheiro público, ou quando o direito de organização sindical é substituído por sindicatos financiados com o imposto sindical. O primeiro Lula, ainda dos anos da ditadura, surgiu como oposição ao peleguismo sindical, mas se transformou, depois, em seu principal defensor. É um tema que precisa ser reaberto.
Já é hora, também, de questionar os mandatos de quatro anos, as reeleições, o financiamento das campanhas e os partidos de aluguel, como parte de uma reforma mais ampla do sistema eleitoral, para que os governantes tenham tempo de governar e a sociedade se sinta representada por eles.