Junto com o Instituto Unibanco, o IES organizou um seminário em São Paulo, no dia 20 de outubro, sobre “Educação Brasileira: Diagnósticos e Alternativas”, aonde o interesse era ver o que as pesquisas nos dizem sobre os problemas centrais e as alternativas de política para Educação brasileira. Sem surpresa, os apresentadores concentraram sua atenção na má qualidade da educação básica, que amplia os problemas de iniqüidade do país, e na dificuldade que temos tido em avançar em relação a isto: fazer com que os professores saibam alfabetizar, tornar as escolas, e seus diretores, mais conscientes e mais responsáveis pelo seu desempenho, e fazer com que os recursos para a educação fundamental aumentem e sobretudo não se dispersem.
Uma das participantes foi Alvana Bof, da UNESCO, que falou sobre a educação de jovens e adultos (EJA), e abriu espaço para discutir um pouco as questões do ensino médio, que acabam sempre espremidas entre os problemas do ensino fundamental e as grandes mobilizações ao redor do ensino superior. Ela mostrou como existe um grande número de jovens e adultos que, ou abandonaram a escola antes de completar o ensino médio, ou continuam cursando escolas médias noturnas, apesar de já estarem acima da idade correspondente, entre 15 e 17 anos. Os programas de EJA buscam recuperar este tempo perdido, proporcionando de forma compacta e flexível, e com o uso de novas tecnologias de educação semi-presencial, a formação básica correspondente ao segundo grau, em um prazo muito mais curto. Por que tantos jovens adultos persistem nos cursos regulares, quando existe esta alternativa? A explicação, segundo Alvana, seria que estes programas têm baixo prestígio e reconhecimento social, apesar de que, segundo Cláudio de Moura Castro, os candidatos ao vestibular das Faculdades Pitágoras originários da EJA não sejam piores dos que se originam dos cursos médios regulares.
Uma outra explicação, certamente, é que os cursos de EJA não preparam os estudantes para os vestibulares mais competitivos. Os vestibulares, ao exigirem conhecimentos enciclopédicos dos estudantes, têm sido apontados como um dos principais responsáveis pela má qualidade dos nossos cursos de ensino médio, aonde nada se aprofunda e tudo se decora. Porque, então, não transformar o sistema flexível do EJA na modalidade predominante de formação para o nível médio, com um bom padrão de avaliação ao final (que chegou a ser tentado pelo Ministério da Educação no governo passado através de um projeto denominado “ENCEJA”, não implementado), e deixando que os candidatos aos vestibulares mais competitivos se preparem por conta própria através de “cursinhos” especializados? Maria Helena Guimarães Castro reagiu horrorizada à minha idéia, dizendo que eu estava propondo voltar atrás na conquista que teria sido a ampliação do número de anos de educação obrigatória no país (que já é de onze anos, e que agora o governo está querendo ampliar para doze ou treze, com o início da educação fundamental obrigatória aos seis anos, e a ampliação do ensino médio de três para quatro anos). Eu penso, realmente, que não tem sentido forçar o aumento da duração do ensino formal de má qualidade, e que seria possível pensar em um sistema de educação média muito mais diversificado e flexível do que se tem hoje, sem cair na antiga falácia de forçar os jovens menos qualificados a seguir cursos profissionalizantes que acabam se transformando, na maioria dos casos, em cursos de segunda ou terceira classe.
Tive a oportunidade de retomar o assunto alguns dias depois no Fórum Mundial de Educação realizado pela OECD em Santiago do Chile, aonde me pediram para comentar a apresentação de Andréas Schleicher sobre os resultados do PISA. O PISA é o exame comparado sobre as competências dos jovens de 15 anos em vários paises do mundo, do qual o Brasil participou duas vezes, em 2000 e 2003, sempre ficando bem na lanterninha. Segundo Schleicher, o Brasil melhorou algo entre 2000 e 2003, embora nada que o retirasse do péssimo nível em que está: 25% dos jovens brasileiros da amostra pesquisada em 2003 estão abaixo do mínimo da escala de desempenho em matemática de 5 pontos do PISA, e mais da metade ficou abaixo do nível 2. Estes péssimos resultados refletem a má qualidade do ensino no Brasil como um todo, e o fato de que 25% dos jovens de 15 anos, que entraram na amostra de 2003, ainda não têm a escolaridade média que lhes corresponderia. No entanto, o nível é ruim mesmo entre os alunos das melhores escolas: entre os 10% melhores alunos brasileiros, 70% ficaram abaixo da pontuação média geral do PISA. Ou seja: não só o Brasil fracassa na média, o que seria de se esperar, mas também fracassa na ponta, mostrando que não existe, no país, um padrão aceitável de qualidade da educação média que possa ser adotado como referência para o conjunto.
Nos meus comentários, retomei alguns pontos da discussão do seminário IETS -Instituto Unibanco, enfatizando o papel deletério dos vestibulares, e chamando a atenção para a potencialidade de reforçar a adoção de padrões de desempenho para o nível médio como o ENEM, e criar formas mais flexíveis e socialmente prestigiadas de obtenção das qualificações do nível formal de educação média. Livre da pressão dos vestibulares e da massa de estudantes mais velhos que precisam a qualquer custo de seus títulos, para não ficar excluídos definitivamente do mercado de trabalho, o ensino médio regular poderia ir evoluindo como nos paises mais desenvolvidos, com mais ênfase em formação em habilidades centrais (língua nacional, língua estrangeira, raciocínio matemático, raciocínio científico e indutivo) e menos no acúmulo de informações irrelevantes, e com um currículo mais moderno e voltado para o mundo real em que os estudantes vivem.