Naercio Menezes Filho: Mais Gastos com Educação?

Reproduzo abaixo a lúcida análise de Naercio Menezes Filho sobre a meta do Plano Nacional de Educação de gastar 10% do PIB no setor, publicada no Valor Econoômico de 25/07/2012  O autor é  Professor titular – Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper e  Professor associado da FEA-USP.

 Mais gastos com educação?

A Câmara dos Deputados aprovou recentemente o novo Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece, entre outras metas, que os gastos com Educação deverão atingir 10% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2020. O plano vai agora para o Senado e, depois, para a presidência da República. Devemos ficar felizes ou tristes? Será que o problema da Educação no Brasil é mesmo a falta de recursos?

Em primeiro lugar, deve ficar claro que o PNE é somente uma carta de intenções. Nada garante que as metas serão efetivamente atingidas. Basta verificar o que aconteceu com as metas do PNE anterior (aprovado em 2000). O plano previa, por exemplo, que 50% das crianças de 0 a 3 anos de idade seriam atendidas em Creches em 2010. Os últimos dados disponíveis mostram que apenas 19% das crianças brasileiras nessa idade estão em Creches. Mas, nada irá acontecer com os municípios que não cumpriram a meta. O mesmo aconteceu com praticamente todas as outras metas do plano anterior.

Vale notar também que, apesar de ser apenas uma carta de intenções, algumas das metas do plano anterior, aprovado pelo Congresso, foram vetadas pelo então presidente, Fernando Henrique Cardoso. Entre elas estava justamente o aumento progressivo dos gastos com Educação para 7% do PIB em 2010. O argumento utilizado foi o de que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) impedia que fossem colocados em lei programas que implicassem novas despesas sem as respectivas indicações das receitas. Como a LRF continua em vigor, espera-se que o Senado ou a presidente Dilma também retirem essa meta do plano.

Uma das saídas seria redistribuir recursos do Ensino superior para o Ensino básico, em especial o infantil

Além disso, pelo menos três fatores não foram levados em conta pelos formuladores das metas do PNE: a virada demográfica, a distribuição de recursos entre os níveis de Ensino e a relação entre gastos e qualidade da Educação. Com relação ao primeiro ponto, sabe-se que a taxa de fecundidade está declinando rapidamente no Brasil, tendo passado de seis filhos por mulher em 1970 para apenas 1,8 em 2010, abaixo da taxa de reposição da nossa população. Isso significa que o número de crianças em idade Escolar irá diminuir continuamente nas próximas décadas. As projeções do IBGE indicam, por exemplo, que o número de brasileiros de 5 a 19 anos de idade passará de 50 milhões em 2010 para 38 milhões em 2030, ou seja, uma redução de 25% em apenas 20 anos.

Quais serão os efeitos dessa virada demográfica para os gastos com Educação? Atualmente o gasto direto com Educação equivale a 5,1% do PIB, ou seja, R$ 187 bilhões, em valores de 2010. Desse total, 85% são gastos com Educação básica, o que significa que cada Aluno do Ensino básico recebe um investimento médio de R$ 4 mil, equivalente a 20% do nosso PIB per capita. Países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) gastam em média 26% do seu PIB per capita com Educação básica; a Coreia, 30%; o Chile, 18%; e o México, 15%.

Simulações indicam que com a virada demográfica, se o PIB crescer a uma média de 3% ao ano, o gasto por Aluno aumentaria para R$ 6 mil em 2020 e R$ 10 mil em 2030, mesmo que os gastos não se alterem com relação ao PIB. Assim, o gasto por Aluno da Educação básica passaria para 24% do PIB per capita em 2020 e 29% em 2030, atingindo o nível da Coreia do Sul.

Se, além da virada demográfica, os gastos com Educação aumentassem para 8% do PIB, as despesas por Aluno aumentariam para R$ 9 mil já em 2020, atingindo 33% do PIB per capita daquele ano, maiores do que em todos os países da OCDE. Nesse caso, os gastos com Educação básica passariam de R$ 390 bilhões, já em 2020. Não se sabe de onde viriam os recursos para esse aumento de gastos, uma vez que a carga tributária no país já atingiu o limite do suportável. Imagine o que aconteceria caso a meta de 10% do PIB fosse de fato atingida!

O segundo ponto importante diz respeito à distribuição dos recursos educacionais. Hoje em dia, o Ensino superior apropria 15% dos gastos públicos com Educação, mas tem apenas 3% do total de Alunos. Assim, enquanto o Ensino fundamental gasta 20% do PIB per capita por Aluno, o Ensino superior gasta 100%. Poderíamos argumentar que os gastos com Educação superior incluem os gastos com pesquisas, mas em nenhum país do mundo essa discrepância de gastos entre o Ensino básico e o superior é tão grande. Na média da OCDE, o gasto por Aluno no Ensino superior é somente duas vezes maior do que no Ensino básico, na Coreia é pouco mais de uma vez e meia e nos EUA, maior gerador de pesquisas no planeta, chega a três vezes. Sem contar que muitos dos Alunos que hoje frequentam o Ensino superior público teriam condições de pagar mensalidades, o que não ocorre no Ensino básico.

Por fim, vale a pena ressaltar que aumento de gastos não significam aumento da qualidade da Educação. Várias pesquisas, inclusive da OCDE, mostram esse fato de forma inequívoca. Sem melhorar a formação dos Professores, a seleção dos diretores e sem demitir os piores Professores ainda em estado probatório, nada vai mudar, mesmo que gastássemos os 10% do PIB com Educação. Haveria somente uma maior transferência de recursos da sociedade para os Professores, sem melhoria do aprendizado dos Alunos. Assim, a melhor estratégia para a Educação brasileira seria manter os gastos como proporção do PIB e aproveitar o crescimento do PIB e a virada demográfica dos próximos anos para manter apenas os melhores Professores no sistema educacional e redistribuir recursos do Ensino superior para o Ensino básico, especialmente o Ensino infantil, que é a base de tudo.

 

André Urani

Perdemos André Urani em plena juventude, depois de enfrentar bravamente uma doença implacável. Deixa com os amigos a lembrança do otimismo, da inteligência, da afetividade e do amor pelo Rio. E tristeza.

Entre mil atividades, André foi o criador e presença permanente no IETS,  e parte das coisas que fazia e das quais participava pode ser vista aqui.

 

Brésil(s). Sciences humaines et sociales

Comparto com todos a publicação de Brésil(s). Sciences humaines et sociales,  a única revista francesa e em francês sobre o Brasil. Editada pelo Centre de Recherches sur le Brésil Contemporain (CRBC-EHESS), ela é publicada pelas Éditions de la Maison des Sciences de l’Homme e toma o lugar dos Cahiers du Brésil Contemporain.

O sumário do primeiro número é:

Ouverture
Peter Fry, “Race”, savonnettes et crèmes de beauté
Walnice Nogueira Galvão, Sauvetages d’archives : le cas Edgard Leuenroth
Carlos Fico, Les régimes autoritaires au Brésil durant l’ère républicaine

Cahiers du Brésil Contemporain
Michel Agier, Le sexe de la pauvreté : hommes, femmes et familles dans une “avenida” à Salvador de Bahia
Christine Douxami, Abdias Nascimento et Solano Trindade : deux conceptions pionnières du théâtre noir brésilien
Rogério Dezem, Nuances de “jaune” : éléments formateurs de l’imaginaire brésilien sur les Japonais

Hommages
Ignacy Sachs, Ressources, emploi et financement du développement : produire sans détruire. Le cas du Brésil
Marion Aubrée, L’œuvre en français de M. I. Pereira de Queiroz
Anita Clémens Saboia, Du poète au romancier : Blaise Cendrars et le Brésil

Informações e assinaturas: Dominique Duchanel, tél.(33) (1) 49 54 22 19 e-mail : bresils-revue@ehess.fr

Novas Metas para um novo Brasil

Com este título, a revista Veja de 15 de julho de 2011 publica uma matéria de 4 páginas sobre o livro A Nova Agenda Social, cujo lançamento está previsto para esta quinta feira dia 16 no Instituto Casa das Garças no Rio de Janeiro, e no dia 5 de julho la Livraria da Vila em São Paulo.

A matéria da Veja está disponível aqui, e convite com os endereços do lançamento, para quem ainda não viu, pode ser aberto aqui.

Convite para o lançamento do livro: “Rio – a hora da virada”

SUMARIO

PREFÁCIO: Eduardo Paes

PARTE I: A RECUPERAÇÃO DO RIO

1 – Rio: a hora da virada André Urani e Fabio Giambiagi
2 – Finanças públicas do Estado do Rio de Janeiro: modernização, eficiência e preparação para o desenvolvimento sustentável Renato Vilela e Paulo Tafner
3 – Finanças do município do Rio de Janeiro: o desafio de preparar a cidade para um salto dos investimentos e para o crescimento sustentável Eduarda Cunha de La Rocque e Alessandra Augusta L. G. S. Souza
4 – Os recursos do petróleo e as perspectivas para os investimentos no estado do Rio de Janeiro Julio Cesar Carmo Bueno e Luiz Octavio Bicudo Casarin
5 – Os grandes eventos de 2011 a 2016 e seus legados para a cidade Felipe Góes
6 – A evolução do ambiente de negócios no Rio de Janeiro José Luiz Alquéres
7 – Segurança pública no Rio de Janeiro: o caminho das pedras e dos espinhos Sérgio Guimarães Ferreira
8 – Rio Como Vamos – uma experiência de cultura cidadã Rosiska Darcy de Oliveira e Thereza Lobo

PARTE II: REPENSANDO O RIO DE JANEIRO

9 – Rio, capital da energia Eloi Fernández y Fernández e Alfredo Renault
10 – Sustentabilidade é competitividade: para o Rio e para o Brasil Sérgio Besserman Vianna, Rodrigo Rosa e Clarissa Lins
11 – Rio de Janeiro: logística e geração de vantagens competitivas Paulo Fernando Fleury, Maria Fernanda Hijar e Alexandre Lobo de Paula Barros
12 – O desenvolvimento de uma economia criativa Ana Carla Fonseca Reis
13 – A marca Rio: uma promessa ainda por ser entregue Ana Couto e Bruno Israel
14 – Uma Rio-Disney: pensando no pós-2016 Lucas Ferraz e Fabio Giambiagi

PARTE III: DESAFIOS A ENFRENTAR

15 – Pobreza no Rio de Janeiro: tendências recentes e desafios para o futuro Ricardo Paes de Barros e Valéria Pero
16 – A saúde no Rio de Janeiro: o velho compromisso pendente Flavia Poppe de Muñoz
17 – Melhorar a qualidade da educação no Rio de Janeiro: um longo caminho Simon Schwartzman
18 – UPPs Sociais: ações sociais para consolidar a pacificação Ricardo Henriques e Silvia Ramos
19 – Municípios do estado do Rio de Janeiro: prosperidade em perspectiva ou riscos à frente? Paula Alexandra Nazareth

Estudos no exterior: jantar completo ou sauduíches?

O blog “Inside Higher Education / The World View” publlica uma nota minha sobre o acordo assinado entre os presidentes dos Estados Unidos e Brasil para aumentar o número de estudantes brasileiros fazendo pós graduação no exterior, disponível aqui. Estas bolsas serão destinadas para pós-doutorado ou programas “sanduíche”, na suposição de que o Brasil já tem doutorados suficientes no país, e a pergunta é se não seria importante continuar insistindo na importancia do jantar completo na formação de alto nível.

Como usar o facebook

Existem muitas maneiras de usar o Facebook, e resolvi usá-lo somente para manter contato com pessoas com as quais tenho relacionamento pessoal; isto porque estava crescendo demais, já não conseguia acompanhar, e tenho outro recurso de comunicação: este blog, que é enviado por email a quem se inscreve, é divulgado pelo twitter (@sschwartzman) e está aberto a comentários.

Isto explica porque estou deixando de aceitar vários pedidos de novos amigos que me chegam no FB, e vou ir reduzindo o numero das pessoas que acompanho.  Para os demais, e também para estes, nos vemos no site!

Ministério da Cultura para que?

Duas nomeações na área da cultura – a do palhaço Tiririca para a Comissão de Educação e Cultura da Camara de Deputados e a do sociólogo Emir Sader para a direçao da Casa Ruy Barbosa no Rio de Janeiro,que petence ao Minstério da Cultura – permitem perguntar para que serve mesmo este Ministério, e se já não estaria na hora de acabar com ele.

O Ministério da Cultura no Brasil foi desmembrado do Ministério da Educacão em 1985 pelo governo Sarney, e tem sua origem nos projetos do Ministério da Educação no Estado Novo que incluiam, de um lado, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico, que cuidaria da preservação do patrimônio arquitetônico e cultural do país, e, por outro, as idéias de Mario de Andrade sobre uma redescoberta da verdadeira cultura nacional, levando à frente o projeto modernista dos anos 20. A estes dois componentes – o patrimonial e o ideológico – foi acrescentada, mais adiante, a função de financiar e manter as atividades de “alta cultura” que o mercado por si só não conseguiria financiar, como a música clássica, o cinema e o teatro “de qualidade”, etc.

O Ministério foi extinto por Fernando Collor em 1990, mas ressucitado logo depois por Itamar Franco. Foi sempre um Ministério menor, apesar de alguns titulares ilustres, como Celso Furtado no governo Sarney e Francisco Weffort no governo Fernando Henrique Cardoso (de cujas políticas culturais eu não saberia dizer nada, talvez por ignorância minha, mas que acredito que concentraram sua atenção no lado patrimonial do Ministério, mais o apoio à “alta cultura” dependente do Estado). O Ministério adquiriu nova preeminência com a nomeação de Gilberto Gil que, entre 2003 e 2008, de alguma forma, tentou retomar a proposta de Mário de Andrade de fazer surgir e consolidar a cultura popular. Com seus recursos limitados, de financiador de música, teatro e cinema erudito, o Ministério se transforma em financiador e mobilizador de manifestaçoes artísticas populares, criando uma nova clientela de organizaçoes sociais que se estruturam para captar e distribuir seus recursos.

É esta nova orientação que explica a indicação de Tirica, com o Deputado Lincoln Portela, presidente do PR que o indicou, dizendo que “educação é uma coisa, cultura é outra”, e afirmando que a experiência prática de Tirica no mundo circense poderia ser usada para fortalecer este lado da cultura nacional. Pode ser.

No caso da indicação de Emir Sader, que pretenderia, pelas declarações recentes a jornais, transformar a Casa Ruy Barbosa em um centro de grandes debates intelectuais, a idéia não causaria espécie – debates intelectuais são sempre benvindos. Por outra parte, a lista peculiar de intelectuais que ele pretende trazer para os debates (em seu blog ele cita nominalmente “de Marilena Chauí a José Murilo de Carvalho, de José Miguel Wisnik a Caetano Veloso, de Tania Bacelar a Bresser Pereira, de Carlos Nelson Coutinho a Maria Rita Kehl, de José Luis Fiori a Chico de Oliveira”), e mais sua trajetória de defesa incondicional de lideres como Hugo Chavez e Evo Morales, faz que os resultados destes debates já estejam de alguma forma pre-definidos (sem com isto querer dizer que todos os citados pensem como ele).

Não acredito que este projeto vá muito longe, e nem que consiga afetar o próprio Ministério da Cultura.  Mas não custa lembrar que, fora do Brasil, existem dois exemplos importantes de criar um Ministério da Cultura e colocá-lo a serviço de grandes projetos ideológicos de governo. O mais conhecido foi o Ministério de “Ilustração Pública e Propaganda” de Joseph Goebbels, nos anos 30, a serviço do Nazismo, e o outro o Ministério da Cultura francês de André Malraux, a serviço das idéias de “grandeur” de Charles de Gaulle. No Brasil tivemos, no Estado Novo, o famigerado Departamento de Imprensa e Propaganda, diretamente inspirado em Goebbels, que durou tanto quanto a ditadura de Vargas, e não precisamos nem queremos mais isto; e como não temos “grandeur”, e tampoco intelectuais orgânicos do porte de Malraux, o exemplo francês também não nos serve.

Nosso patrimônio histórico, artístico e cultural precisa ser cuidado, deve existir e espaço para financiar projetos culturais de qualidade, e temas transversais, como o da propriedade intelectual,  precisam ser discutidos e resolvidos. Nada disto justifica, no entanto, um Ministério da Cultura com as pretensões que alguns pretendem que ele tenha. Uma simples secretaria, como tentado por Collor, daria conta do recado.

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