Ciencias sociais, ciencias naturais e as humanidades

A ciência política é uma ciência, como a física, ou parte das humanidades, como a literatura? Sendo uma ou outra coisa, de que forma ela participa, ou deveria participar, das políticas nacionais de desenvolvimento científico, tecnológico e inovação? Como ela deve ser avaliada por uma instituição como a CAPES?
Este foi, ou deveria ter sido, o tema da mesa redonda em que participei no 6º  Encontro de Associação Brasileira de Ciência Política, realizado em Campinas em 1º  de agosto, sob o o título de “As Ciências Sociais e o Desenvolvimento Científico”.  Creio que todos os participantes da mesa – Wrana Panizzi, vice-presidente do CNPq,  Carlos Henrique Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, Ruben Oliven, presidente da ANPOCS, e Leôncio Martins Rodrigues, coordenador da mesa – concordaram em que  o mundo da ciência está muito mudado e diversificado, que as diversas áreas do conhecimento têm importantes responsabilidades de produzir resultados,  e que não é possível avaliar as ciências sociais (nem nas naturais) conforme os padrões clássicos da ciência acadêmica convencional.

No entanto, como acontece nestas ocasiões, a reunião terminou quando a discussão deveria estar começando. Parte de minha apresentação foi baseada nos resultados do estudo que fizemos em 2006-2007 sobre “Universidades e desenvolvimento na América Latina: experiências exitosas de centros de pesquisa”, cuja versão digital em português está disponível na Biblioteca Virtual de Ciências Humanas ; e parte nas notas que preparei a partir de uma reunião promovida pela CAPES sobre “avaliação de Competência Científica” realizado em 2007, aonde trato de discutir um pouco mais em detalhe esta questão das ciências sociais e das humanidades (o texto está disponível aqui).

Uma das minhas conclusões, na qual venho insistindo, é que o modelo de avaliação acadêmica adotado no Brasil 30 ou mais anos atrás, que teve importantes resultados, já não dá conta de lidar com a diversidade e pluralidade das atividades de pesquisa que vem se desenvolvendo no país e no resto do mundo, e já está a hora de buscar novos caminhos.

Direcionamento automático para o novo site

Estou inagurando um novo formato para meu site e blog, com acesso aos texos, mensagens e comentários. Espero que funcione bem, e por favor enviem sugestões e digam se há problema.

O redirecionamento deve ser autommático. Se não for,  site agora é https://www.schwartzman.org.br/sitesimon (clique aqui)

Quem recebe as mensagens por correio continuará recebendo normalmente, e existe um lugar em cima do lado direito para novas inscrições ou para retirar o nome.

Reynaldo Fernandes: Minas e o IDEB

No dia 28 de junho publiquei uma nota da Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais, Professora Vanessa Guimarães, com o título de Minas, IDEB e Prova Brasil, com uma série de críticas e questionamentos a respeito do IDEB e sua aplicação em Minas Gerais. Agora publico a resposta do Professor Reynaldo Fernandes, Presidente do INEP, cujo texto integral está disponível aqui. .

O que fica claro é que houve um total desencontro de informações entre o Ministério e a Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, que é responsável direta por uma das maiores redes escolares do país. Ora, além dos aspectos técnicos, uma avaliação nacional como a Prova Brasil, que serve de base para o IDEB, deve ter legitimidade para ser aceita e utilizada, e isto só se consegue com um trabalho permanente e paciente de diálogo, comunicação e construção de consenso. Acredito que esta troca de mensagens possa ajudar a esclarecer as dúvidas, e contribuir para que este diálogo se fortaleça.

Trilhas para o Rio

Trihas para o Rio, de André Urani, é não somente um livro muito interessante e bem escrito, mas uma raridade, e exemplo do que ele diz. Existem muitas coisas escritas sobre praia, bossa nova, música popular, carnaval, mulheres, televisão e futebol, que formam a imagem do Rio romântico e boêmio, assim como sobre a corrupção, a violência e a desorganização urbana que é a outra cara, cada vez mais assustadora, de nosso paraíso tropical. O que quase não existe são análises que buscam explicar como chegamos até aqui, pelas vias do populismo, do deterioro urbano e da perda de vocação e rumos da cidade.

Uma das explicações que André apresenta é que o carioca sempre pensou e se preocupou com o Brasil e o mundo, e deixou de olhar e dar atenção ao lugar em que vive. O Rio não está sozinho nisto, outras cidades no Brasil e no mundo também passaram por crises de desorganização e perda de rumo. Muitas, no entanto, estão encontrando novos caminhos, a partir de um processo de “reinvenção” cujo principal ingrediente é a participação de sua população, naquilo que ela tem de melhor, na busca destas nova trilhas.

O lançamento do livro será no dia 16 de julho na Livraria Travessa do Leblon, Av. Afrânio de Melo Franco 290, 2 andar, Rio de Janeiro (naturalmente).

Ruth Cardoso

Não me lembro de uma comoção nacional tão grande quanto a havida com a morte inesperada de Ruth Cardoso. Para os que a conhecíamos mais de perto, no pequeno mundo das ciências sociais, não poderia ser diferente, pela sua vida profissional e, sobretudo, pela pessoa simples, afetiva e comprometida que sempre foi. Também eram inevitáveis as manifestações oficiais de luto devidas à ex “primeira dama”, os elogios formais e a cobertura de imprensa dos funerais e das homenagens, que ela, provavelmente, teria preferido que não houvessem. Mas foi muito mais que isto.

Ruth sempre teve luz própria, sobretudo a partir do Programa Comunidade Solidária, mas é impossível separar o sentimentos e as manifestações de pesar por sua perda dos sentimentos e manifestações de apoio e solidariedade a Fernando Henrique Cardoso. E no entanto, Fernando Henrique, como todo político, provoca controvérsias, enquanto que Ruth parece ter sido sempre, ainda em vida e sobretudo agora, uma unanimidade nacional.

Sempre desconfiei de nossas unanimidades, que geralmente encobrem, sob o manto da suposta glória de poucos, as mazelas e os problemas dos demais. Com Ruth Cardoso foi diferente, e fico tentando entender por quê. Talvez tenha sido pelo fato de que ela personificasse, pelo estilo e pela conduta, um ideal de honestidade, autenticidade e despojamento na vida pública e intelectual que parece estar desaparecendo rapidamente no país. Se isto é verdade, o luto coletivo pela perda de Ruth Cardoso pode ser entendido como um luto por todos nós, pelos valores e pela ética que estamos perdendo, e que ela encarnava.

Minas, IDEB e a Prova Brasil

Vanessa Guimarães, Secretária de Estado de Educação de Minas Gerais, e João Filocre, Secretário Adjunto, enviam uma nota técnica detalhada em que mostram os avanços da educação de Minas Gerais nos anos recentes, medidos pelo sistema de avaliação do Estado, e questionam os resultados do IDEB, que consideram duvidosos. O texto completo, de 11 páginas, pode ser visto clicando aqui. Ao final da nota, a Secretaria solicita explicações:

1. É responsabilidade do MEC, do INEP e das instituições contratadas para realizar a Prova Brasil e o SAEB explicar as discrepâncias existentes e sobre a aparente ausência de relação causal entre ação efetiva no sistema e os resultados obtidos.

2. É responsabilidade do MEC informar, também, sobre a qualidade e consistência dos dados que vêm utilizando, sobre a margem de erro das suas avaliações e sobre as mudanças que vêm introduzindo no SAEB, bem como a repercussão dessas mudanças na confiabilidade dos resultados.

3. É dever do MEC informar os gestores dos sistemas estaduais e municipais de ensino sobre possíveis problemas e inconsistências antes de tornar público resultados que acabam por ser republicados pelos erros identificados.

4. É dever do MEC fornecer aos gestores dos sistemas estaduais e municipais de ensino a base de microdados para que se possa fazer uma avaliação mais segura sobre o comportamento dos sistemas educacionais nas avaliações que promove.

João Batista Araujo e Oliveira: Ainda o IDEB

Como são raras oportunidades para um debate sério, cumpre aprofundar e avançar a partir das observações sempre pertinentes da Secretária Maria Helena Guimarães, motivados pela divulgação dos resultados do IDEB. Em sua nota, a Secretária chama a atenção para escolas e municípios que vêm melhorando e indica algumas das constantes que caracterizam as escolas desses municípios. Gostaria de aprofundar dois aspectos:

Primeiro, o que Secretarias de Educação podem fazer para que as escolas melhores? Em setembro de 2008 o Instituto Alfa e Beto promoveu um encontro sobre Reformas Educativas: o que diz a evidência internacional (para mais informações consulte o site www.alfaebeto.com.br). A experiência internacional mostra que os fatores que tornam as escolas bem sucedidas são os mesmos que tornam os países bem sucedidos: em outras palavras, nesses países, os governos ajustam suas políticas e práticas de ensino para que todas as escolas tenham condição de dar certo. No Brasil, na maioria das vezes, as escolas que dão certo são exceção, o que sugere que as regras que as Secretarias criam precisam mudar. A grande diferença de dados entre municípios de uma mesma rede, ou entre escolas de um mesmo município, são testemunhos da falta de políticas consistentes das Secretarias – e que são a condição necessária, embora não suficiente – para que as escolas possam ter sucesso.

O segundo aspecto refere-se à importância de praticar educação com base em evidências. Para isso é essencial, como diz a Secretária Maria Helena, promover pesquisas. Mas mais importante do que isso, é importante usar as evidências já disponíveis, e usar pesquisas para avaliar se estamos atingindo os objetivos ou para descobrir novas formas de conseguir melhores resultados. No Brasil insistimos em reinventar a roda como se os fatores necessários para melhorar a educação fossem desconhecidos. Freqüentemente , como bem aponta a Secretária, basta organizar algumas rotinas básicas para ver resultados. Mas freqüentemente é preciso ir além do óbvio e do trivial, consultar as evidências e implementar reformas. No Brasil, por exemplo, os governos e universidades resistem às evidências sobre a importância de usar métodos adequados para alfabetizar as crianças. Ou seja: selecionamos as “evidências” de que gostamos e desprezamos as que não convém.

Que lições as Secretarias de Educação precisam tirar do IDEB? No Brasil, desde o Colégio Pedro II, sabemos como fazer UMA escola de elite – seja ela localizada na capital ou na favela mais complicada. A educação não pode depender apenas dos bons ofícios de um diretor – da mesma forma que uma empresa de aviação não pode depender de pilotos corajosos. O que ainda não aprendemos a fazer é montar uma rede de escolas que funciona como sistema a nível estadual ou municipal. Premiar e promover escolas de bom desempenho é fundamental. Mas a função principal das Secretarias de Educação é criar as condições para que todas as escolas possam oferecer ensino de qualidade. E, para isso, é necessário fazer uma revolução profunda na substância e na forma de agir de nossas Secretarias de Educação. E superar a duplicidade de redes públicas de ensino num mesmo município.

Maria Helena Guimarães de Castro: as surpresas do IDEB

Maria Helena Guimarães de Castro, Secretária de Educação do Estado de São Paulo, envia o seguinte comentário sobre o IDEB:

Concordo com os argumentos do João Batista, mas há algumas surpresas no IDEB, especialmente em pequenos municípios do Sul e Sudeste, que merecem nossa atenção para os fatores intra-escolares. É o caso dos municípios paulistas que se destacaram entre os 20 melhores do país, ou das escolas municipais também de pequenas cidades do interior de SP. Em comum, essas escolas apenas conseguiram organizar as rotinas básicas que fazem uma enorme diferença para a melhor aprendizagem dos seus alunos. Entre os fatores mais importantes, destacam-se:

1. diretores comprometidos e estáveis
2. participação dos pais
3. uso de materiais didáticos estruturados
4. supervisão e monitoramento permanente.

Creio que precisamos ir além dos estudos econométricos e começar a mostrar às escolas o que funciona. As evidências apontadas nos estudos econométricos corretamente indicam o peso dos condicionantes extra-escolares como fatores explicativos do desempenho escolar. Parece-me, no entanto, fundamental mostrar o que faz diferença no modo de funcionamento das escolas para estimulá-las a melhorar e indicar as boas práticas que estão ao alcance de todos. Obviamente, é muito mais simples ter escolas organizadas em cidades pequenas, o grande problema são as regiões metropolitanas. Mas, mesmo nas regiões metropolitanas, há exemplos muito interessantes que podem ser replicados. É o caso de Francisco Morato na Grande São Paulo, municipio dormitório, muito pobre, que vem dando saltos significativos nos indicadores sociais e educacionais com uma receita relativamente simples: os agentes sociais da prefeitura visitam as casas dos alunos que faltam ou tem dificuldade de aprendizagem. Caíram as taxas de repetência, melhoraram os índices de aprendizagem e os pais fiscalizam os professores que faltam.

Parece simplismo da minha parte, mas não é. Estou preocupada em valorizar as boas escolas públicas e mostrar que é possível melhorar mesmo que a região seja pobre, etc. Senão, vamos ficar com o mesmo discurso dos sindicatos: a escola não melhora porque os salários são baixos, a carreira é péssima, as turmas são grandes, os pais desempregados, etc. Pode ser uma batalha perdida, mas continuo tentando.

Sinto falta de estudos que aprofundem os fatores internos à escola para subsidiar políticas. É muito pequena ou nula nossa margem de atuação para melhorar os condicionantes externos. Mas há fatores que importam e que podem ser objeto de intervenção dos gestores públicos de educação. Creio que devemos prestar mais atenção nisso até para convencer os diretores de escola de que é possível melhorar. O SARESP de SP mostrou, por exemplo, que escolas com menos de mil alunos tendem a apresentar melhor desempenho, até em áreas ultra vulneráveis da GSP; mostrou também que escolas exclusivas de 1a. a 4a. séries são melhores do que as grandes escolas de educação básica com mais de 1.500 alunos. O tamanho da turma parece não fazer diferença, mas o tamanho da escola faz, como já apontam as reformas do Blair em 99 e as do prefeito de NY. Mostrou que nossas 500 escolas de tempo integral são tão medíocres quanto as demais. Enfim, estamos analisando os resultados e há coisas interessantes para orientar nossas ações.

O novo relatório do crescimento

The Growth Report, documento escrito por uma comissão de notáveis liderada pelo Prêmio Nobel de economia Michael Spence, da qual faz parte Edmar Bacha, está sendo considerado por muitos como o novo “consenso de Washington”, que deixa para trás as receitas simplistas de “estabilidade econômica, menos estado e mais mercado” dos anos 80, e apresenta um quadro muito mais rico e complexo dos fatores que permitem ou não o desenvolvimento econômico dos países.

O desenvolvimento que interessa não é somente o de curto prazo, que pode ocorrer por uma alta súbita dos preços das commodities, como vem ocorrendo ultimamente, mas a capacidade dos países em manter este desenvolvimento através do tempo e transformar a riqueza em benefício para toda a população. Cauteloso, o relatório começa dizendo que não existem receitas prontas, que cada país deve buscar seu próprio caminho, mas nem por isto deixa de apontar os fatores que diferenciam os países que conseguem daqueles que não conseguem se desenvolver.

O primeiro destes fatores é a abertura, não somente aos mercados, mas às idéias, tecnologias e recursos disponíveis globalmente. Estratégias de crescimento para dentro, voltadas para o mercado interno, podem ser menos arriscadas, mas não conseguem ir muito longe. O segundo fator são os investimentos: nenhum país consegue crescer sem altas taxas de poupança, da ordem de 20 a 25%. Estes recursos podem ser obtidos, em parte, no mercado internacional, mas o mais importante é a poupança domestica que os países são capazes de fazer.

Para que estas e outras políticas possam ser implementadas, a principal condição é a capacidade de liderança política e a eficácia dos governos, assim como sua legitimidade – a capacidade de convencer as pessoas de que o investimento no futuro vale a pena. Não é que as economias não possam crescer sem mercados, instituições e políticas adequadas, mas é um crescimento muito mais incerto, e existe sempre o perigo da “doença holandesa” – o crescimento concentrado que mata tudo o que existe em volta. Os governos devem fazer muitas coisas importantes – manter a economia em equilíbrio, desde logo, mas também cuidar da educação, da pobreza, do meio ambiente e da infra-estrutura de comunicação e transportes.

Os governos devem trabalhar, também, pela institucionalização e fortalecimento dos mercados, fazendo as reformas institucionais que sejam necessárias. A economia não pode se desenvolver plenamente sem mercados, mas existe uma grande diferença entre mercados “maduros”, bem institucionalizados, com regras claras sobre os direitos de propriedade, garantias dos contratos e competitividade, e os mercados selvagens que caracterizam muitas das economias dos países em desenvolvimento. Para fazer tudo isto, os governos precisam ser honestos, tecnicamente competentes e capazes de desenvolver políticas de longo prazo, de forma pragmática, que possam ir além dos ciclos eleitorais.

O relatório não chega a condenar a implantação de políticas industriais, que favorecem alguns setores da economia considerados mais dinâmicos, mas não deixa de dizer que atividades empresariais que dependem de subsídios permanentes e preços distorcidos não merecem existir. A função do governo não é proteger empresas, mas pessoas. O relatório reconhece que o desenvolvimento econômico pode gerar desigualdades, e recomenda políticas para corrigir as distorções nos extremos da distribuição de renda, sem com isto restringir a flexibilidade dos mercados.

Finalmente, o relatório reconhece a importância da questão climática, e de toda a questão dos limites ao desenvolvimento, e aí também é cauteloso. Não é verdade que o crescimento da indústria na China vai impedir o desenvolvimento em outras partes: com mais riqueza, haverá lugar para todos. E o limite para o desenvolvimento econômico e a redução da pobreza vai depender não somente dos limites da natureza, que são reais, mas de nossa capacidade para lidar com eles.

Não há propriamente novidade nestas idéias, me parece , mas, ao serem apresentadas de forma clara e coerente, por uma comissão internacional de credenciais inquestionáveis, elas podem se transformar em divisor de águas entre o que faz sentido e as ortodoxias e heterodoxias que ainda circulam tanto.

IDEB: celebrar o quê?

Que significam, de fato, os números do Indice de Denvolvimento da Educação Básica, difundidos recentemente pelo Ministério da Educação? Este texto de João Batista Araujo e Oliveira e Carlos Henrique Ferreira de Araujo, ex-diretor do INEP, ajuda a entender:

É compreensível a euforia das autoridades em querer celebrar os resultados do IDEB – o indicador de desenvolvimento da educação básica. A divulgação, em tom cuidadoso, foi logo seguida de euforia, ampliada pela mídia. Apenas alguns jornalistas e um único articulista, Naércio Menezes Filho, sugeriram cautela. Mesmo porque os dados divulgados não revelam informações importantes, pois o IDEB mistura resultados de Português com os de Matemática e com taxas de aprovação. Pode ser prático ter um único índice, mas é importante ter clareza sobre o que ele revela e o que esconde.

O que nos diz o IDEB 2007? O que mudou em relação ao IDEB de 2005? Basicamente mudaram duas coisas. Primeiro, a média nacional da 4ª. série do Ensino Fundamental passou de 3.8 para 4.2. Numa escala de zero a dez, trata-se de mudança de cerca de quatro por cento. Em 11 estados, dos quais 10 estão situados no Nordeste ou Centro-Oeste, a mudança variou de 5 a 8 pontos percentuais. Todos esses estados estavam abaixo de 4 pontos no IDEB anterior, e apenas 3 deles conseguiram superar a marca de 4 pontos com os novos avanços. Segundo, os dados divulgados até o momento sugerem que metade ou mais dos avanços se deve a mudanças nas taxas de aprovação e a um pequeno avanço nos resultados da prova de matemática. As demais alterações nos indicadores são desprezíveis, tanto do ponto de vista estatístico quanto educacional.

Podemos dizer que a melhoria é significativa? Certamente o é para os estados no Nordeste, não para a maioria do país. Mas cabe observar que melhorar de 3 para 3.5 ou 3.8 é muito mais fácil do que melhorar de 8 para 8.2 ou de 9.5 para 9.6. Houve avanços, sim, mas justamente onde é mais fácil. Não é possível nem razoável dizer que essas mudanças possam ser atribuídas a melhorias na qualidade do ensino ou da introdução de políticas educacionais específicas – exceto, talvez, no caso da promoção de alunos, que é uma medida administrativa. Os dados não mostram o resultado de determinadas redes estaduais ou municipais de ensino que teriam introduzido mudanças significativas nas suas políticas ou práticas, mas do agregado das redes em cada estado. Os dados, em comparação com séries históricas, também não permitem afirmar que houve uma reversão de tendências – mesmo porque tendências são reflexo de mudanças em vários momentos, e não apenas um ou dois.

Portanto, estamos diante de um fenômeno que não comporta explicações simples ou simplistas, muito menos explicações oportunistas, que colocam em jogo a validade, utilidade e credibilidade das avaliações. Houve melhoras, houve avanço nos índices. Isso é inegável. Mas esses avanços não podem ser atribuídos às políticas educacionais em curso. As celebrações de sucesso poderiam sugerir que bastaria continuar a fazendo o que o país vem fazendo para que a educação chegue aos níveis dos países desenvolvidos. Isso equivale a dizer que basta fazer muito, nada ou qualquer coisa, pois é exatamente isso que vem ocorrendo no país .

Manifestações de autoridades também insinuam que resultados de políticas educativas aparecem em prazos muito curtos – e independentemente de mudanças estruturais. Ora, a explicação mais plausível é que as mudanças ocorridas nos indicadores – e que se concentraram em alguns estados e apenas na 4ª. série – se devem ao efeito de mudanças em variáveis extra-escolares, notadamente o aumento da renda e da média de escolaridade dos pais, o que se verificou sobretudo nas regiões mais pobres e que incide sobre os alunos mais jovens. Ou seja: é a economia que está contribuindo para melhorar os resultados da educação – e não vice-versa – como seria de se esperar.

O que é necessário fazer para que as escolas façam diferença na economia e na vida das pessoas, sobretudo as de nível sócio-econômico mais modesto? Seria preciso fazer uma profunda reforma educativa, cujos contornos são bem conhecidos e que podem ser aprendidos da experiência dos países onde a educação dá certo. A receita é bem conhecida, e vem sendo divulgada há pelo menos três décadas nos estudos sobre reformas eficazes. O tema foi objeto de um seminário internacional promovido pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, em agosto de 2007 e também divulgado recentemente em relatório da empresa de consultoria McKinsey. Nada a ver com as propostas em curso no país.

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